tag:blogger.com,1999:blog-31162800982216682642024-03-14T05:56:19.692+00:00MUSING ON CULTUREMaria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.comBlogger332125tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-30320866093207116342024-01-03T13:15:00.000+00:002024-01-03T13:15:06.850+00:00Cultura prescrita<p></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiBgbyBrmnGQSci6OlB9H83txNWcAKb7LauOZcxbVsK0Fo4nxe_BGa2oMuUVrML6tY6UX0wATibEGaQcnsV9SoeZ4gFcoTLng18CXlwHhPsFiY951SJGiHFB2lpu9vmmaM0YD04rm_j_OVl71P0QCWWs9nLCtTJ-vxsKAEbBKOrx1kAqm2Pxg5RCvwl0Rw3/s500/Les%20Kurbas%20Theatre_Lviv_adriano%20miranda_500px.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiBgbyBrmnGQSci6OlB9H83txNWcAKb7LauOZcxbVsK0Fo4nxe_BGa2oMuUVrML6tY6UX0wATibEGaQcnsV9SoeZ4gFcoTLng18CXlwHhPsFiY951SJGiHFB2lpu9vmmaM0YD04rm_j_OVl71P0QCWWs9nLCtTJ-vxsKAEbBKOrx1kAqm2Pxg5RCvwl0Rw3/s16000/Les%20Kurbas%20Theatre_Lviv_adriano%20miranda_500px.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Les Kurbas Theatre, Lviv, Ukraine, 2022. Foto: Adriano Miranda</td></tr></tbody></table><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Assistir a representações de peças antigas nos
teatros gregos é uma experiência que me faz sempre pensar. Acho particularmente
comovente o fluxo de pessoas que se dirigem ao teatro para assistir pela
enésima vez às mesmas histórias que nos falam de amor, ódio, respeito,
arrogância, sede pelo poder, guerra, justiça, vingança. Histórias escritas há
muitos séculos sobre a natureza humana e tudo o que há de bom e de mau nela.
Então, quando olho ao meu redor para as pessoas que enchem o teatro e,
sobretudo, quando as vejo ir-se embora depois do espectáculo, muitas vezes me
pergunto “E então? E agora?". Até que ponto as pessoas utilizam o
“alimento” (<i>food for thought</i>) que lhes foi proporcionado para pensar
sobre a vida contemporânea, sobre si mesmas e sobre os outros, o seu lugar no
mundo e qual poderia ser a sua contribuição para um mundo melhor? Quando penso na
sociedade contemporânea grega (e noutras sociedades), a forma como cuidamos (ou
não cuidamos) uns dos outros, lembro-me que o poder não reside apenas na peça,
mas também, e talvez até mais, no indivíduo e no que essa pessoa fará (ou não)
com o que lhe foi dado.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Valorizo a cultura e as artes; valorizo a
criatividade e a forma como ela questiona as nossas certezas e alimenta a nossa
imaginação; gosto da forma como criamos comunidades baseadas em diferentes tipos
de participação cultural. O meu trabalho diário é contribuir para uma sociedade
onde, através da cultura e das artes, todos possam ter oportunidades de
participar e de crescer, de sonhar e de contribuir para um mundo melhor e mais
humano. Mas também sei que isso é o mais longe que posso ir. O resto cabe a cada
indivíduo. É por isso que, há anos, comecei a questionar as declarações feitas
por diferentes organizações culturais que contribuem para a coesão social, o
bem-estar individual e colectivo, o entendimento intercultural, a tolerância,
etc., etc., quando não vemos nenhum sinal de que algo do género esteja,
realmente, a acontecer numa escala maior – a começar pela forma como as
próprias organizações culturais são geridas por dentro. Algumas organizações
culturais (nem todas, talvez nem mesmo a maioria) disponibilizam as
“ferramentas”. Estou a falar daquelas organizações que estão conscientes da
diversidade humana e no serviço que prestam às comunidades, com base nos
princípios de acesso, inclusão e equidade. No entanto, elas fazem parte de uma
rede cultural, educacional e social mais ampla, cujo “sucesso” reside na
colaboração e nas interligações, e não apenas na Cultura.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A forma como a cultura e as artes têm sido
frequentemente retratadas como “remédios” que resolverão todos os males na
sociedade (injustiças, desigualdades, guerras e outros conflitos sociais)
deixa-me normalmente desconfortável, por duas razões principais: porque parece
ignorar a rede cultural, educativa e social mais ampla, que deve assumir-se
como tal e tornar-se funcional, servindo uma visão comum para uma sociedade
futura; e também porque atribui à cultura e às artes um propósito que não é o
deles, em primeiro lugar. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">No início de Novembro, participei numa
conferência em Portugal onde a nossa colega Mariana Mata Passos, da associação
cultural Pó de Vir a Ser, falou sobre um programa-piloto de “prescrição
cultural” na região do Alentejo Central. Na sua breve apresentação, a cultura e
as artes foram mencionadas associadas à “saúde mental”, ao “isolamento”, aos
“centros de saúde”, aos “médicos”, às “prescrições médicas”. Dado que o tempo
para debate foi bastante escasso, alguns de nós saímos da sala sentindo-nos
confusos e perturbados. Dias depois, deparei-me com um artigo num jornal grego
intitulado </span><a href="https://www.kathimerini.gr/society/562748434/sto-theatro-kai-sto-moyseio-me-syntagi-giatroy/"><span style="line-height: 107%;"><b>“No teatro e no museu com receita médica”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. O título soou o alarme para mim. O próprio artigo descrevia algo
semelhante à experiência portuguesa: um programa-piloto de prescrição cultural
e a ambição de que, até 2025, todos os psiquiatras privados possam prescrever
arte-terapias, com o objectivo de incluir a prescrição cultural no Sistema
Nacional de Saúde. O que pode ser prescrito são actividades artísticas com
duração de três meses ou a participação em espectáculos, filmes ou concertos
pelo menos três vezes por mês, que os beneficiários poderão depois discutir,
expressando os seus pensamentos e sentimentos. Tudo isso </span><a href="https://www.facebook.com/mariavlachou.pt/posts/pfbid035V6BB3hvjX7bLfpX2fUnygXMR9UjqpFkiRB6UV6P9ap4n6uhr2Lbru6jrHeokQFzl"><span style="line-height: 107%;"><b>fez-me comentar no Facebook</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, com alguma
ironia: “Se o paciente não melhorar, a culpa será do espectáculo ou será
aumentada a dose?”. Colegas mais próximas destas iniciativas ou envolvidas em actividades
similares ofereceram-se para falar sobre o assunto. Queria mesmo poder falar
mais e melhor. Mas antes, fiz um pouco de trabalho-de-casa.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">As minhas principais preocupações, como indicado
no meu comentário no Facebook, têm a ver com os critérios usados pelos médicos
para prescrever uma actividade ou um espectáculo específico e, principalmente,
como os resultados podem ser interpretados em relação à qualidade ou
“capacidade de cura” das actividades prescritas e, indo um pouco mais longe, o
impacto que isto poderá ter (é suposto ter?) na avaliação e talvez também no
financiamento da cultura e das artes.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYqJXpWZypJfgHxb43dyt9GI4e5F5yQvPwn3q_44Sv-tatJvKCOg8OCEHKBGvm9aOrJVboatDO9w9nrbRnOLoK5a1FcCkTTC8C9axSkhKQUq0Ha6SH30QGb7DXxq67l8CetrELEbmXPg98Mycg6HmK7J_Aetpwv4splHBR4LiRGPnXPuBQO03GQ7VNHCtT/s500/20230803_205419_500px.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYqJXpWZypJfgHxb43dyt9GI4e5F5yQvPwn3q_44Sv-tatJvKCOg8OCEHKBGvm9aOrJVboatDO9w9nrbRnOLoK5a1FcCkTTC8C9axSkhKQUq0Ha6SH30QGb7DXxq67l8CetrELEbmXPg98Mycg6HmK7J_Aetpwv4splHBR4LiRGPnXPuBQO03GQ7VNHCtT/s16000/20230803_205419_500px.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Teatro de Dodoni, Ioannina, Grécia, 2023. Foto: Maria Vlachou</td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O artigo no jornal grego mencionava que
“parâmetros como o grau de melhoria observado nos pacientes, que tipo de intervenção
(ou seja, assistir a uma apresentação de teatro ou participar num grupo de
terapia de prática teatral) se revelou mais eficaz, quantos pacientes
abandonaram, por que razões e quais as suas características serão avaliadas com
critérios científicos.” Considerando as minhas principais preocupações, tudo
ainda me parecia demasiado absurdo, mas, afinal, este era apenas um breve
artigo de jornal. </span><a href="https://www.prescricao-cultural.pt/wp-content/uploads/2022/12/FINAL-Manual-Prescricao-Cultural-Entregavel-3-1.pdf"><span style="line-height: 107%;"><b>Ao ler o documento que apresenta o projecto-piloto português</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, escrito por Mariana Mata Passos e Patrícia Deus Claudino da
associação cultural Pó de Vir a Ser, não encontrei referências específicas à
avaliação – nem tanto em relação à evolução dos pacientes, mas, principalmente,
quanto ao que um desenvolvimento positivo ou negativo para cada um deles nos
diria sobre o próprio “remédio”. Esta é a parte que me parece mais problemática
relativamente ao “uso” da cultura e das artes neste contexto.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Neste documento lê-se (p.11) que “A
investigação científica internacional sobre Prescrição Cultural ilustra a melhoria
na saúde mental e bem estar em diferentes parâmetros: aumento do nível de
energia; maior vitalidade, alegria e prazer na vida; melhoria no
estabelecimento de relações interpessoais e competências; melhor auto-estima; aumento
na motivação; melhor capacidade de compreensão das suas necessidades; melhor
capacidade de auto-cuidado; maior proximidade ao mercado de trabalho.” Para
além destes benefícios, outro documento, </span><a href="https://theeuropechallenge.eu/wp-content/uploads/2023/09/Athens-Comics-Library-Refugee-Week-Greece-Libraries-on-Prescription.pdf"><span style="line-height: 107%;"><b>Libraries on Prescription</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, escrito pelas
colegas gregas Lida Tsene e Dina Ntziora, também refere que (pp.4-5):<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Os programas de referência social e cultural
podem ajudar os indivíduos a construir ligações sociais e redes de apoio, que
são cruciais para o bem-estar mental.</span></span></li><li><span style="font-family: verdana;">De acordo com “Art, Culture and the Brain”
(2022), a participação em actividades culturais está associada ao bem-estar, a
um sentido de coesão e mobilização, enquanto a saúde mental das pessoas que
vivem em áreas em desenvolvimento pode melhorar através da exposição a actividades
criativas e artísticas.</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Além disso, de acordo com Katherine Cotter, investigadora
da Universidade da Pensilvânia, “museus e espaços de arte têm o potencial de
afectar positivamente as pessoas, reduzindo o stress, criando experiências
emocionais positivas e ajudando-as a se sentirem menos sozinhas e mais ligadas.”</span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Isto não é exactamente uma surpresa para os
profissionais da cultura e muitos de nós temos este tipo de evidência
empírica/pessoal. Também é útil ter dados científicos que apoiem esta evidência.
Mas será que podemos, realmente, dizer que se trata de uma espécie de
“receita”, de uma “regra”? Algo além e independente da vontade, capacidade,
agência e contexto de cada indivíduo? </span><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">Num artigo intitulado </span><a href="https://theconversation.com/could-visiting-a-museum-be-the-secret-to-a-healthy-life-216978"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><b>“Could visiting a museum be the secret to a
healthy life?”</b></span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"> </span><span style="line-height: 107%;">(Visitar um museu poderia ser o segredo para uma vida saudável?),
Emma Dupuy refere que Mikaela Law, investigadora em psicologia da Universidade
de Auckland, na Nova Zelândia, e os seus colegas fizeram a revisão da
literatura científica acerca de estudos sobre a resposta fisiológica às artes
visuais e o seu efeito no stress auto-relatado. “Alguns dos estudos mencionados
no seu trabalho mostram que o contacto com obras de arte pode diminuir a
pressão arterial, a frequência cardíaca e o cortisol secretado na saliva. Tais
mudanças reflectem uma redução no estado de cautela do corpo, também chamado
stress. Essa mudança parece ser percepcionada pelo indivíduo, reflectida na
redução do stress sentido após a exposição. Outros estudos, por outro lado, não
observaram efeitos.” Isso também não é uma surpresa, pois não?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Alexandra Wilson, </span><a href="https://thecritic.co.uk/art-does-not-exist-to-improve-society/"><span style="line-height: 107%;"><b>num artigo para o jornal The Critic</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> sobre </span><a href="https://www.bbc.com/news/entertainment-arts-67624384"><span style="line-height: 107%;"><b>a mudança forçada da English National Opera de Londres para
Manchester</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, criticou os comunicados de imprensa da
organização, que se centravam repetidamente e intensamente na contribuição que
esta mudança terá para o bem-estar e a saúde pública dos habitantes locais. Em
primeiro lugar, comentou a ironia de tal afirmação, considerando os danos que
já foram causados ao estado mental de músicos altamente qualificados, que temem
pela sua subsistência, como resultado desta mudança. “É claro que a música
clássica traz, sem dúvida, muitos benefícios para a saúde e a felicidade das
pessoas. Ao nível mais básico, assistir a uma bela apresentação levantará provavelmente
o ânimo da maioria do público”, mas Wilson chama a isso de “um sub-produto
feliz”. Ela cita também a académica Eliane Glaser, que no seu livro <i>Elitism:
A Progressive Defence</i> escreve que “Ao transformar a cultura, a educação e o
jornalismo em arenas de relações públicas para combater a desigualdade, a
política desistiu de tentar melhorar a sociedade de qualquer forma organizada.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">E esta é também a questão que eu quero levantar.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Como já afirmei, não duvido dos benefícios
físicos, emocionais e intelectuais que a cultura e as artes podem trazer para as
pessoas e também para as diversas comunidades que estas formam. Os
participantes nas </span><a href="https://theeuropechallenge.eu/wp-content/uploads/2023/09/Athens-Comics-Library-Refugee-Week-Greece-Libraries-on-Prescription.pdf"><span style="line-height: 107%;"><b>Libraries on Prescription</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> relataram que
o programa lhes ofereceu a oportunidade de encontrar uma forma criativa de se
expressarem, de socializarem e de promoverem o seu bem-estar e saúde mental;
enriquecer criativamente o seu dia; sentir-se parte de uma equipa e ter
oportunidade de trabalhar em grupo; aumentar a sua confiança e contribuir para a
sua auto-melhoria (pp.14-15). Como profissional da cultura, porém, o meu foco
principal não é usar a cultura e as artes para abordar (e provar ser capaz de
resolver) questões como “a recuperação e o bem-estar dos pacientes com doenças
crónicas (hipertensão, diabetes), condições neurológicas, distúrbios cognitivos
ou problemas de saúde mental” (conforme mencionado </span><a href="https://theconversation.com/could-visiting-a-museum-be-the-secret-to-a-healthy-life-216978"><span style="line-height: 107%;"><b>no artigo de Emma Dupuy</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> sobre a prescrição
de museus no Canadá). O meu foco principal não é lidar com as causas dos
problemas de saúde mental, </span><a href="https://www.prescricao-cultural.pt/wp-content/uploads/2022/12/FINAL-Manual-Prescricao-Cultural-Entregavel-3-1.pdf"><span style="line-height: 107%;"><b>referidas pelas nossas colegas portuguesas</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> como “determinantes sociais da saúde” (p.15: rendimento disponível
e proteção social; educação; desemprego e precariedade laboral; condições de
vida no trabalho; insegurança alimentar; habitação, comodidades básicas e meio
ambiente; desenvolvimento na primeira infância; inclusão social e não
discriminação; conflito estrutural; acesso a serviços de saúde acessíveis e de
qualidade decente); ou falhas no sistema de saúde, como “a sobreprescrição
farmacológica, a ausência de recursos humanos nos centros de saúde que permitam
dar uma resposta complementar terapêutica, ao nível da intervenção psicológica,
a hiperutilização dos serviços” (p.9).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como profissional da cultura, estou muito feliz
com todos os sub-produtos. Mas também estou muito consciente do meu lugar e da
minha contribuição para a rede cultural, educacional e social mais ampla dentro
da sociedade, da qual faço parte. E espero que cada profissional (médicos,
enfermeiros, terapeutas, assistentes sociais, professores, juízes, polícias,
etc.) faça a sua parte para cumprir os objectivos desta rede.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Uma vez que os governos e os profissionais de
diferentes sectores parecem reconhecer o contributo da cultura, acredito que
precisamos de ser claros sobre a natureza desse contributo e o papel específico
dos profissionais da cultura. Assim, as perguntas que estão na minha mente neste
momento são as seguintes:</span></span></p><p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="text-indent: -18pt;"><span style="font-family: verdana;">Deveriam
os profissionais da cultura investir tempo, esforço e dinheiro para liderar
programas-piloto que confirmarão as evidências científicas sobre “sub-produtos
felizes”?</span></span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
estamos preocupados com o facto de, ao focarmos os sub-produtos, sermos
solicitados a fornecer provas da nossa eficácia no tratamento de questões e
objectivos que são tudo menos culturais e artísticos?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Considerando
o aparente consenso sobre a contribuição da cultura, não deveríamos estar a
lutar contra o desinvestimento nas artes e nas humanidades, e o seu
desaparecimento sistémico dos currículos escolares e universitários?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Se a
cultura e as artes nos dão ferramentas para nos tornarmos mais criativos e
imaginativos, para alimentarmos o nosso espírito crítico, para imaginarmos um
mundo melhor e o nosso lugar nele, não deveríamos concentrar-nos no acesso e na
inclusão, a fim de garantir oportunidades de presença e participação a pessoas
muito diversas?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
deveríamos estar a trabalhar para tornar as organizações culturais mais
relevantes e acolhedoras para diferentes pessoas, com ou sem problemas de saúde
e outras questões?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
deveríamos concentrar-nos mais na capacitação dos profissionais da cultura, a
fim de compreendermos melhor conceitos como acesso, inclusão, equidade,
democracia cultural e como estes conceitos podem afectar a forma como fazemos o
nosso trabalho?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
deveríamos esforçar-nos para garantir que os profissionais da cultura
(incluindo artistas e mediadores) tenham condições adequadas para realizar o
seu trabalho?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
deveríamos preocupar-nos com a saúde mental dos próprios profissionais da
cultura?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Não
deveríamos todos nós (cidadãos, profissionais de diferentes sectores e
políticos) estar mais conscientes da necessidade de construir uma visão para o
futuro e de compreender melhor o papel e a contribuição de cada sector na rede
cultural, educacional e social mais ampla da qual fazemos parte?</span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Acredito que poder imaginar e construir um
mundo melhor deveria ser tarefa partilhada de todos os sectores que formam a
rede. Alcançar os nossos objetivos comuns será o resultado de colaboração,
reconhecendo a natureza específica da contribuição de cada um e da sua expertise.
A prescrição cultural, as suas razões e objectivos, suscitam-me sérias
preocupações. Agora que consegui expressá-las de forma mais organizada, estou
ansiosa para as discutir com as colegas envolvidas.<o:p></o:p></span></span></p><br /><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-6120889617399588262023-12-26T08:38:00.000+00:002023-12-26T08:38:07.810+00:00Desejamos o futuro (ainda)<p></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgq66X3nTMPLPthFTyM3Lb0kr-Tdn9Od0Mzd3qnz-clVKrT4edeot8Rn66NH6yUFg6Z5wo9UrYFzfGVYNa0Kealo5VE3EZGzU5X63O6McO1yHy3QVUpybD8orIATaFMuTohFh4jrg1tqGOTMlpMtxWtuWKC224pll1CD1NdmICSPOCdULPfYqAV0x1-ZIXg/s500/TNDMII_Desejamos%20o%20Futuro_500.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="357" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgq66X3nTMPLPthFTyM3Lb0kr-Tdn9Od0Mzd3qnz-clVKrT4edeot8Rn66NH6yUFg6Z5wo9UrYFzfGVYNa0Kealo5VE3EZGzU5X63O6McO1yHy3QVUpybD8orIATaFMuTohFh4jrg1tqGOTMlpMtxWtuWKC224pll1CD1NdmICSPOCdULPfYqAV0x1-ZIXg/s16000/TNDMII_Desejamos%20o%20Futuro_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Fachada do Teatro Nacional D. Maria II, Lisboa, 2020-2021</td></tr></tbody></table><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Dois recentes programas na RTP com foco na
cultura, assim como inúmeros encontros com profissionais da área ao longo do
ano e nos últimos anos, intensificam a preocupação em relação ao como este
sector é entendido e gerido, que visão projecta e como a pratica.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O programa de 23 de Novembro da “Sociedade
Civil” propôs reflectir sobre </span><a href="https://www.rtp.pt/play/p11183/e730199/sociedade-civil"><span style="line-height: 107%;"><b>“Cultura no Interior”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Convidou para
esta conversa o poeta, diplomata e ex-Ministro da Cultura Luís Filipe Castro
Mendes; o pianista e diplomata Adriano Jordão; e Tiago Nunes, Presidente da
associação CulturXis e director do Festival Internacional dos Açores. Ao longo
do programa ouvimos ainda Eduarda Freitas (da agência criativa Inquieta) e
Cláudio Henriques (do colectivo Cultura Alentejo).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O programa “É ou não é” de 12 de Dezembro
pretendeu questionar se </span><a href="https://www.rtp.pt/play/p11163/e734506/e-ou-nao-e-o-grande-debate"><span style="line-height: 107%;"><b>“É possível fazer mais pela cultura?”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. As pessoas convidadas foram o actual Ministro da Cultura, Pedro
Adão e Silva; o director artístico do Teatro Nacional D. Maria II, Pedro Penim;
a escritora Lídia Jorge; o músico e escritor Kalaf Epalanga; e o dono da
Everything is New, Álvaro Covões. A museóloga Simonetta Luz Afonso interveio à
distância.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Foi penoso para mim acompanhar ambas as
conversas. Senti que ficaram alheias ao que me parece ser uma realidade que
precisa urgentemente de ser cuidada. Menciono os nomes com respeito pelo
percurso profissional de cada uma das pessoas convidadas, mas também porque é
preciso questionar se a RTP, televisão pública, não poderia ter feito um
esforço maior em termos de trabalho de casa, de forma a promover estes debates
com agentes que pudessem mostrar a diversidade do sector e da actuação de
diferentes pessoas, em diferentes territórios deste país tão pequeno e tão
diverso. Ao mesmo tempo, podemos também questionar: e nós, profissionais do
sector, fazemos o nosso trabalho de casa?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="color: #050505;"><span style="font-family: verdana;">Há algumas confusões muito problemáticas, que
persistem no sector cultural e que a composição de certos painéis de discussão
ajuda a perpetuá-las:</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="color: #050505;"><span style="font-family: verdana;">cultura e artes</span></span></li><li><span style="color: #050505;"><span style="font-family: verdana;">democratização da cultura e cultura democrática</span></span></li><li><span style="color: #050505;"><span style="font-family: verdana;">programação e calendarização</span></span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Quando em 2022 foi apresentado o </span><a href="https://gulbenkian.pt/noticias/inquerito-as-praticas-culturais-dos-portugueses/"><span style="line-height: 107%;"><b>estudo da Fundação Gulbenkian sobre as práticas culturais dos
portugueses</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> - e perante as reacções e
interpretações do costume, que desvalorizam e culpam os portugueses, e evitam
questionar o próprio sector – escrevi com alguma ironia um texto intitulado </span><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2022/02/os-habitos-culturais-das-organizacoes.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Os hábitos culturais… das organizações culturais portuguesas</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Lembrei-me novamente desse texto ao acompanhar a conferência<span style="background: white; color: black;"> </span></span><a href="https://conferencia.pna.gov.pt/cisoc/"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>Impacto
social: as pessoas no centro das organizações culturais</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> (</span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=_L634LGr_E4&ab_channel=DGEstEMinist%C3%A9riodaEduca%C3%A7%C3%A3o"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">, </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=PCCFCQIctMg&ab_channel=DGEstEMinist%C3%A9riodaEduca%C3%A7%C3%A3o"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> e </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=nccTwTkYN1c&ab_channel=DGEstEMinist%C3%A9riodaEduca%C3%A7%C3%A3o"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">) </span><span style="line-height: 107%;">e a apresentação do ambicioso
projecto </span><a href="https://cisoc.pna.gov.pt/"><span style="line-height: 107%;"><b>CISOC
– Compromisso de Impacto Social das Organizações Culturais</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, uma iniciativa do Plano Nacional das Artes.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Na introdução da </span><a href="https://cisoc.pna.gov.pt/kit-cisoc/"><span style="line-height: 107%;"><b>publicação</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> do CISOC, o comissário do Plano Nacional das Artes, Paulo Pires do
Vale, afirma que “<span style="mso-font-kerning: 0pt;">As instituições culturais
não são neutras. Pela sua missão, por intervirem no espaço público, no modo
como se relacionam com as comunidades, nas decisões que tomam, como e o que
programam, na forma como trabalham a produção, a mediação e o acesso”.
Questiona ainda: “Como [é que as organizações culturais] ajudam a emancipar os
cidadãos e a que participem mais ativamente na vida coletiva? Como promovem a
saúde da democracia?”<o:p></o:p></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Não discordo nem da afirmação nem das questões colocadas. No entanto, a
minha tendência, mais uma vez, é convidar os profissionais do sector a uma
introspecção: Quais as organizações culturais portuguesas que têm uma missão
definida e publicamente conhecida? Quais as organizações culturais que
realmente intervêm no espaço público e que tipo de intervenção é essa? Como
podem esperar emancipar os cidadãos e encorajá-los a participar activamente na
vida colectiva, se essas mesmas organizações culturais não participam, não se
posicionam e continuam a actuar, em grande parte, para servir apenas os
interesses (intelectuais, científicos, artísticos e culturais) de quem as
dirige e quem nelas trabalha? O que significa programar? Porque é que grande
parte das pessoas que desempenha esta função em organizações culturais públicas
não consegue imaginar algo diferente do que “calendarizar um pouco de tudo”
(chamam-lhe “programação ecléctica”)? Qual a visão que o sector tem do papel da
cultura na construção de um futuro e de uma sociedade portuguesa melhor? Num
encontro em Abril na Biblioteca da Universidade de Coimbra, a propósito dos 50
anos do 25 de Abril, questionava </span><a href="https://musingonculturextra.blogspot.com/2023/04/liberdade-para-que-cultura-para-que.html"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>“Liberdade para quê? Cultura para quê?”</b></span></a>.<span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Na conferência acima referida houve alguns questionamentos muito
pertinentes, aos quais deveria ser dado espaço para serem melhor desenvolvidos:
como quando a gestora cultural Maria de Assis Swinnerton questionou até quando
ficaremos pelos diagnósticos, evitando passar para a acção; quando o sociólogo
Manuel Gama questionou a falta de planos estratégicos para a cultura na maioria
dos municípios (e, consequentemente, nas organizações culturais que estes
tutelam) e a existência de 94 indicadores quantitativos no CISOC e apenas 16
qualitativos. Na altura do debate, Marta Silva, do Largo Residências,
questionou até que ponto tinha sido levada em consideração a prática de muitos
anos de diferentes entidades que actuam no terceiro sector (</span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">terminologia sociológica
que se refere a todas as iniciativas privadas de utilidade pública com origem
na sociedade civil). E Ana Umbelino, vereadora da Cultura no município de
Torres Vedras, sugeriu pensarmos de que forma organizações de pequena escala,
longe do que entendemos ser as grandes “centralidades” e, muitas vezes, com
níveis de profissionalização incipientes, poderão apropriar-se de um
instrumento como o CISOC, aplica-lo ou reinventá-lo.</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="color: #050505; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Cultura e artes; democratização da cultura e cultura democrática; programação
e calendarização: será que entendemos a urgência de esclarecer, primeiro nós
próprios que trabalhamos no sector cultural, o significado destes conceitos e o
que os torna diferentes? Lídia Jorge - que vê à sua volta uma sociedade em que
“os pais vêem futebol e as mães lêem revistas de culinária” (!)] - dizia no
debate da RTP que há 20 anos que estamos a discutir as mesmas coisas. Podemos,
à vontade, passar mais 20 a fazê-lo, enquanto o país caminha para um extremo
que promete “segurança” e “justiça” aos negligenciados. É preciso quebrarmos
ciclos viciosos, pormo-nos em causa, construirmos uma nova visão em relação ao
que fazemos e porquê, posicionarmo-nos de outra forma perante a sociedade. É
preciso honestidade intelectual e coragem. Somos capazes de dar este passo em
frente?</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-77783795282924555452023-11-10T16:15:00.001+00:002023-11-10T23:23:06.707+00:00Zia and Manuela were present.<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqelJWzFZFaWj6Q_NbDfKKhy9acQ9dWA0Nlb7gUfhwkaTd4x8YFK1jlRlyjJlbBLgubFfPmuzl28cwFBsggKE1421tkn6hq_KZD-obFCQnzg3x9f-OKa9XvwZb2-RhMIxFCBX49i6rKwMQ4qDvrgTniDb4wYJl4YT04S5NaqBlG7vNFN3kELWC03yYOoGW/s500/RTCP_Zia_Manuela_500px.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="264" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqelJWzFZFaWj6Q_NbDfKKhy9acQ9dWA0Nlb7gUfhwkaTd4x8YFK1jlRlyjJlbBLgubFfPmuzl28cwFBsggKE1421tkn6hq_KZD-obFCQnzg3x9f-OKa9XvwZb2-RhMIxFCBX49i6rKwMQ4qDvrgTniDb4wYJl4YT04S5NaqBlG7vNFN3kELWC03yYOoGW/s16000/RTCP_Zia_Manuela_500px.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Conferência da RTCP em Portalegre, 7.11.2023</td></tr></tbody></table><p></p><p><span style="font-family: verdana;">Os encontros profissionais são, cada vez mais, um momento
precioso para quem consegue dar a si próprio ou consegue reclamar junto de
chefias o tempo para participar. Com cada vez mais profissionais da cultura a
falar abertamente de doença mental, de esgotamento, de depressão, de ritmos que
não fazem sentido, estes momentos de encontro - em que podemos estar juntos,
abraçar-nos, olharmo-nos nos olhos, sorrirmos, conversarmos – são mais que
necessários, são urgentes.<span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mas, mesmo reconhecendo a importância disto, vários entre
nós saímos da conferência da Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses (RTCP) em
Portalegre lamentando que os nossos encontros profissionais não possam ser algo
mais. Senti, e ouvi outros colegas a afirmar, que nos mantemos sempre na superfície;
juntamo-nos para ouvir a descrição de projectos; parece que começamos sempre do
início, do básico; não aprofundamos. Não basta descrever um projecto, como é
óbvio. Porque cada projecto traz problemas, dúvidas, surpresas, desafios
inesperados; exige de nós sensibilidade, abertura para aprender, capacidade de
adaptação, criatividade, honestidade. Algumas destas palavras foram ouvidas num
ou outro encontro a que assisti (não assisti a todos), mas não passámos disto,
da constatação. Não se disse algo mais.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Também é claro que nem tudo foi assim. E escrevo hoje para partilhar
aquilo que foi para mim o momento alto da conferência da RTCP: a presença em
palco da actriz e encenadora Zia Soares e da vereadora da cultura Manuela Ralha.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A Zia foi apresentada como a primeira directora artística
negra de uma companhia de teatro em Portugal. Pois, daquelas que ela própria fundou… (Praga e Teatro
Griot). Parece irónico fazer essa afirmação. Não perdeu a oportunidade de
lembrar (mais uma vez) que é convidada para estes encontros como um “token”. Quantas
vezes ainda terá de o dizer para começarmos a questionar-nos a nós próprios das
ausências na sala, no palco e na plateia? Para agirmos sobre elas? Também partilhou
connosco que o Teatro Griot, que conta com 14 anos de vida, deve ter sido
convidada para apresentar o seu trabalho em 2-3 teatros dos mais de noventa que
fazem parte da RTCP. Questionou quantos desses teatros terão uma pessoa negra
na liderança (ou na equipa?). E mais para o final da sessão, olhou para a sala
e perguntou: “Quais são as pessoas não negras nesta sala?”. Os presentes
sentiram-se confusos, indecisos. Devo ter visto uns 5 braços levantados. A
pergunta que nos é normalmente colocada é “Quantas pessoas negras na sala?”.
Habituámo-nos a ouvir a pergunta, ainda não estamos a agir sobre ela. Mas a Zia
trocou-nos as voltas: “Quais são as pessoas não negras nesta sala?”. Todas nós,
excepto a Zia, naquele lugar da “violência de ser o único”, de que fala a
artista Grada Kilomba. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">“Antes de falarmos em participação temos de falar em
acessibilidade.” Foi assim que Manuela Ralha iniciou a sua intervenção. De manhã,
quando entrei no auditório, encontrei-a na última fila. Não tinha opção, tinha
de lá ficar (talvez alguém esteja a pensar que deveríamos estar satisfeitos,
porque noutros teatros teria ficado atrás da última fila, o único espaço a que
teria acesso – não, não estamos satisfeitos, não devemos estar). Manuela
continuou: “Todos nós falamos em programar, em envolver, em participação, mas
esquecemos que há uma franja da população que começa logo a ser barrada na
entrada, que não consegue participar, não consegue assistir, não consegue sequer
ser público.” Falou daquilo que é hoje do conhecimento de todos, que, apesar da
acessibilidade ser um critério para a credenciação na RTCP, a maioria dos
teatros não o é. Um conhecimento sobre o qual, mais uma vez, não agimos.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estava “escondida”, “protegida”, no meio de muitas pessoas
naquele auditório. Mas as intervenções dessas duas mulheres fizeram-me sentir
penosamente consciente da minha presença. Porque, para que serve o conhecimento
se não se torna consciência? Para que serve o conhecimento se, regressando aos
nossos lugares de trabalho, reassumimos uma rotina que não questiona, não
incomoda, permite ignorar, permite fingir que não sabemos, escondidos e
protegidos como estamos no nosso dia-a-dia. Cheios de justificações.</span><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-33202523561102020112023-11-03T21:55:00.002+00:002023-11-03T21:55:16.843+00:00Aptos para a democracia: tão natural como a água?<p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjHbcaqs17OpYqwFQc5KmJfoJ8svW0YxJDA0io05Ez_pWl2_NYAYNDgMxQHBtmpUNBnLfzlRbfqBQjBF4vZIvUSvkAulMo6NU5p60OZAPPehqAOL_R0gMU8qbu4loW5zu1-Ec3xfKhbwI67DLQcCjtAry4tT42zAkg3c_6SqiIojFPwrzY_T9fo1xCtChT2/s500/20231023_093527_s.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="288" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjHbcaqs17OpYqwFQc5KmJfoJ8svW0YxJDA0io05Ez_pWl2_NYAYNDgMxQHBtmpUNBnLfzlRbfqBQjBF4vZIvUSvkAulMo6NU5p60OZAPPehqAOL_R0gMU8qbu4loW5zu1-Ec3xfKhbwI67DLQcCjtAry4tT42zAkg3c_6SqiIojFPwrzY_T9fo1xCtChT2/s16000/20231023_093527_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Photo: Maria Vlachou</span></td></tr></tbody></table></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Este ano, tive a oportunidade
de passar três dias no FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos.
Assisti, entre outras coisas, ao lançamento de </span><span style="background: white; color: #050505; line-height: 107%;">“Voltas e Reviravoltas - A Cidadania”, de Ana Maria Magalhães
e Isabel Alçada, com ilustrações de Mantraste. Este é o segundo de 12 livros da
colecção infantojuvenil <a name="_Hlk149938779"></a><a href="https://livraria.parlamento.pt/collections/missao-democracia"><span style="mso-bookmark: _Hlk149938779;"><b>“Missão: Democracia”</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149938779;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk149938779;"></span>,
uma </span><span style="color: #050505; line-height: 107%;">iniciativa da <span style="background: white;">Assembleia da
República</span>, com curadoria da Dora Batalim SottoMayor</span>.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="background: white; color: #050505; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Nesse evento, Isabel Alçada
disse que, para os jovens hoje, a democracia é tão natural como abrir a
torneira e sair água. Apontei esta afirmação no meu caderno. Criou um
desconforto em mim naquele momento e, posteriormente, voltei a ela em diversas ocasiões.
Porque, do ponto de vista empírico, não vejo nada disso à minha volta. Porque o
oposto da repressão política não é necessariamente uma democracia de qualidade,
uma democracia saudável, uma democracia tão natural como a água que sai da
torneira.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="background: white; color: #050505; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O que vejo, em primeiro
lugar, à minha volta é adultos. Adultos que se auto-censuram para não desagradarem
aos seus superiores ou pessoas do seu ciclo. Vejo adultos, que são os tais “superiores”
à espera de obediência e submissão, a combater activamente o espírito crítico. Adultos
que não se incomodam, não sentem que lhes diz respeito a discriminação vivida
diariamente por outras pessoas, porque não a sentem na própria pele. Adultos
que educam os mais novos recomendando auto-censura, submissão, indiferença e… “moderação”.
Foi esta a palavra que mais ouvi a propósito das jovens pessoas activistas pelo
clima. Duvido, por isso, que a democracia seja tão natural como abrir a torneira
e sair água. Duvido também que a maioria entre nós – adultos e,
consequentemente, não adultos também - tenha consciência das exigências que
traz para os cidadãos uma democracia de qualidade, uma democracia saudável.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="background: white; color: #050505; line-height: 107%;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmXkUiXu5QkmvMHD6bxRpmnFlbjLfEiMNPpXcduuqmzm2REXoi3U8stiIbpS7F2ISXfpbu6syW9Veo4QdsI_zF2qZBEqflyaM77poS-bfs2lBHZz2M7OrGb1xjxZbwyIFATp2IZnroJPC6NVc5J85kn4lvIJ35JVKmK-DmMV0PJb608QzSOeC7m2Uv6KSG/s500/394306579_862281328600440_3998334756746962479_n_s.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmXkUiXu5QkmvMHD6bxRpmnFlbjLfEiMNPpXcduuqmzm2REXoi3U8stiIbpS7F2ISXfpbu6syW9Veo4QdsI_zF2qZBEqflyaM77poS-bfs2lBHZz2M7OrGb1xjxZbwyIFATp2IZnroJPC6NVc5J85kn4lvIJ35JVKmK-DmMV0PJb608QzSOeC7m2Uv6KSG/s16000/394306579_862281328600440_3998334756746962479_n_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Photo: FOLIO</td></tr></tbody></table></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: #050505; line-height: 107%;">Isto é o que me diz o meu
conhecimento empírico. Mas existem dados mais científicos também. Li recentemente
um artigo intitulado <a name="_Hlk149939077"></a><a href="https://www.aljazeera.com/news/2023/11/2/democracy-in-trouble-stagnant-at-best-and-declining-in-many-places?traffic_source=rss"><span style="mso-bookmark: _Hlk149939077;"><b>“Democracy in trouble, stagnant at best, and
declining in many places”</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149939077;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk149939077;"></span> (Democracia em apuros, estagnada, na
melhor das hipóteses, e em declínio em muitos lugares). Apresentava o mais
recente relatório do <i>think tank</i> sueco <a name="_Hlk149939114"></a><a href="https://www.idea.int/gsod/2023/"><span style="mso-bookmark: _Hlk149939114;"><b>IDEA
- International Institute for Democracy and Electoral Assistance</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149939114;"></span></a></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149939114;"></span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">. IDEA baseia os
seus índices em mais de 100 variáveis relacionadas com questões políticas,
incluindo representação, direitos, Estado de direito e participação. O que nos
diz o relatório de 2023?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Que 85 dos 173 países
pesquisados “sofreram um declínio em pelo menos um indicador-chave do
desempenho democrático nos últimos cinco anos”.<br /><br /></span></span></li><li><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Que, pelo sexto ano
consecutivo, metade dos países do mundo retrocedeu em indicadores como
liberdade de expressão e participação política.<br /><br /></span></span></li><li><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Que a queda de seis anos é o
período mais longo de retrocesso democrático desde que os registos começaram em
1975.</span></span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estes resultados não são uma
surpresa. E, apesar de a Europa ter sido nomeada como a região com melhor
desempenho em termos democráticos, foram registados retrocessos tanto em
democracias mais jovens (p.e. a Hungria), como noutras, mais estabelecidas (p.e.
o Reino Unido).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">No final de Outubro, tive o
privilégio de assistir ao encontro em Lisboa do projecto europeu <a name="_Hlk149939357"></a><a href="https://publiclibraries2030.eu/lighthouse-libraries/building-bridges-eu-policy/"><span style="mso-bookmark: _Hlk149939357;"><b>Future of Europe for Public Libraries</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149939357;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk149939357;"></span>.
O seu objectivo é construir em toda a Europa uma rede de bibliotecas públicas, as
Lighthouse Libraries (Bibliotecas Faróis), para participarem nas políticas e
iniciativas da União Europeia sobre os temas digital, sustentabilidade e
democracia. No início do primeiro dia, ouvimos a directora da magnífica
biblioteca de Aarhus (Dinamarca), <em><span style="font-style: normal;">Marie Østergaard, falar sobre os programas públicos da sua
biblioteca, que olham para a participação pública como infraestrutura
democrática. O seu colega Asmund Bertelsen apresentou-nos o programa <a name="_Hlk149939476"></a><a href="https://cop-demos.jrc.ec.europa.eu/blog/public-libraries-2030-democracy-gym-public-library-getting-ready-engagement"><span style="mso-bookmark: _Hlk149939476;"><b>“Democracy Fitness”</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk149939476;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk149939476;"></span>,
que pretende exercitar os “músculos” da democracia: mobilização, compromisso,
escuta activa, empatia, desacordo, activismo, confiança verbal, curiosidade,
coragem, opinião. O programa reconhece que precisamos de treinar diariamente as
nossas capacidades para viver em democracia – lembrando Martha Nussbaum, que n</span></em>o
seu livro “Cultivando a humanidade” escreve que “a liberdade de pensamento e a
dignidade humana são capacidades a serem desenvolvidas, a fim de produzir
cidadãos livres, cidadãos que são livres não por causa da riqueza ou do
nascimento, mas porque podem chamar as suas mentes de suas próprias mentes.”
Portanto, a democracia não é tão natural, como gostaríamos, para a natureza humana.
É preciso treinar para saber defender e protegê-la.</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj9xb3uq6Mxat-9G-SIXzEUQMUhQ15zHHthhxQjynJ-RndQb77oOKNhYMUYqjhHN277RqnntEwFcF_EB7rzLs-r9On-m297URufAZI4xE2MjdOsd4z72g6X6T9FibtvbrI53oNMTRRuDHRv0_G9Nw7KaYNUzANPE6vr_iW8lepQdFF8IVRLyK7Ec-efYDQ_/s500/image1_s.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="354" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj9xb3uq6Mxat-9G-SIXzEUQMUhQ15zHHthhxQjynJ-RndQb77oOKNhYMUYqjhHN277RqnntEwFcF_EB7rzLs-r9On-m297URufAZI4xE2MjdOsd4z72g6X6T9FibtvbrI53oNMTRRuDHRv0_G9Nw7KaYNUzANPE6vr_iW8lepQdFF8IVRLyK7Ec-efYDQ_/s16000/image1_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Da apresentação de <em style="text-align: left;"><span style="font-style: normal;">Asmund Bertelsen.</span></em></span></td></tr></tbody></table></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Na sua apresentação, <em><span style="font-style: normal;">Marie Østergaard
explicou que dois dos objectivos principais dos programas públicos da
biblioteca de Aarhus é cultivar a confiança no sistema e a auto-confiança
democrática. Ou seja, querem que as pessoas mais jovens possam perceber que a
sua opinião conta e que valerá a pena participarem, envolverem-se. Algo que me fez
pensar também no que muitos jovens estarão a ver à sua volta. Não faltam os
adultos com opinião e com auto-confiança, mas, para que é que isto serve perante
a arrogância e a falta de sentido democrático de muitos políticos? Temos
políticos demasiado confortáveis no seu poder, habituados à subserviência (ou a
exigi-la), convictos que os cidadãos existem para os servir e não o contrário.
Não poucas vezes, esta realidade faz as pessoas questionar se vale a pena
votar, se vale a pena participar, se isto alguma vez vai mudar.</span></em></span><em><span style="background: white; font-style: normal; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></em></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><em><span style="background: white; color: black; font-style: normal; line-height: 107%;">Pensei novamente nestes questionamentos quando li o último
parágrafo no<b><a href="https://www.publico.pt/2023/11/03/opiniao/opiniao/quero-forcas-internacionais-gaza-ja-boicote-mundo-governo-israel-2068893" target="_blank"> artigo de hoje da Alexandra Lucas Coelho</a></b>, sobre a situação em
Israel e nos territórios palestinianos ocupados. É com esse seu parágrafo que
concluirei o meu texto:</span></em><em><span style="background: white; font-style: normal; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></em></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><em><span style="background: white; color: black; font-style: normal; line-height: 107%;">“</span></em><span style="line-height: 107%;">Israel tem de ser isolado como Estado de
apartheid, investigado por crimes de guerra, à luz do direito internacional e
humanitário. Sujeito a sanções económicas e políticas, além do boicote dos
cidadãos. Não ficarmos impotentes é também questionar quem governa: António
Costa, Marcelo Rebelo de Sousa, a Assembleia da República, a União Europeia. As
pessoas estão a protestar como podem. E quem as representa? Provem que a
democracia existe, que ainda vale a pena votar, que os direitos humanos são de
toda a gente. Estejam à altura da vida que chega de Gaza, e a cada minuto não
sabemos se continua.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estejamos à altura…<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mais leituras:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://musingonculturextra.blogspot.com/2023/04/liberdade-para-que-cultura-para-que.html"><b>Liberdade
para quê? Cultura para quê?</b></a><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><b><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Agradecimentos<o:p></o:p></span></span></b></p>
<p class="MsoNormal"><a name="_Hlk149938655"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Bibliotecas de Lisboa<o:p></o:p></span></span></a></p>
<p class="MsoNormal"><span style="mso-bookmark: _Hlk149938655;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">CRID –
Centro de Reabilitação e Integração de Deficientes, Instituto Politécnico de
Leiria<o:p></o:p></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="mso-bookmark: _Hlk149938655;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">DGLAB –
Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas<o:p></o:p></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="mso-bookmark: _Hlk149938655;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Município
de Óbidos</span></span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-18725771508204564002023-10-16T01:00:00.004+01:002023-10-16T07:29:40.297+01:00A política e a música clássica<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjde4LMg3JI5YiGw3lplP_YITNRIvZkXNy3g7bmsqdhj6VWTUC5xdZ6xd2AZsPpU_BimGDUYiGDChmQFODhJjSIF3AccLDg7Anp2AgYlepsX5FC8UTvR3_5Ek39gqU9yRnEs12dGBrM2LlYcFLlFCsjh-xgN44eZ3nNXjmOaafW6IZbAC8E9PvqSf-T4OMe/s500/YES-logo_500.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="252" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjde4LMg3JI5YiGw3lplP_YITNRIvZkXNy3g7bmsqdhj6VWTUC5xdZ6xd2AZsPpU_BimGDUYiGDChmQFODhJjSIF3AccLDg7Anp2AgYlepsX5FC8UTvR3_5Ek39gqU9yRnEs12dGBrM2LlYcFLlFCsjh-xgN44eZ3nNXjmOaafW6IZbAC8E9PvqSf-T4OMe/s16000/YES-logo_500.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">O logo da campanha pelo "Sim" no Voice Referendum.</td></tr></tbody></table><br /><p></p><p><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Ler que a Playlist da Oakland Symphony vai receber e
celebrar a Angela Davies deu-me alguma esperança esta manhã, no meio das
terríveis notícias que temos vindo a acompanhar na última semana.
"Ativista. Educadora. Consciência de uma geração. Ela vai partilhar a
música que inspirou a sua coragem e o seu compromisso”, </span><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><a href="https://www.oaklandsymphony.org/event/playlist-angela-y-davis/"><span lang="PT"><b>lê-se no website da orquestra</b></span></a></span><span style="line-height: 107%;">.
“Coragem” e “compromisso” tornaram-se atributos essenciais para as organizações
culturais dos EUA, tendo em conta os desafios enfrentados pela democracia
naquele país. Há poucos dias, senti-me verdadeiramente deprimida ao ler sobre a
recusa de uma estação de rádio da Carolina do Norte a transmitir óperas da Metropolitan
Opera que considerava “inapropriadas”. A recusa, <a href="https://www.npr.org/2023/09/29/1202425600/met-opera-wcpe-north-carolina"><b>li
num artigo</b></a>, “ocorre num momento em que a Metropolitan Opera está ansiosa por
mostrar o seu compromisso com óperas e obras escritas recentemente, fora do
cânone tradicional da música escrita por homens brancos. Três das óperas que a
WCPE considera rejeitar na temporada 2023-24 foram escritas por compositores
negros ou mexicanos. Em Abril passado, a WCPE também se recusou a transmitir
outra ópera produzida pelo Met, escrita por um compositor negro que incluía
temas LGBTQ”. Considerando os esforços da Met para ir além do “cânone” e
tornar-se mais relevante para mais cidadãos nos EUA, a gerente da estação de
rádio expressou profundas preocupações morais, tais como “E se uma criança
ouvir isto? Quando eu estiver diante de Jesus Cristo no Dia do Juízo, o que
direi?”. No dia 5 de Outubro, chegou a notícia de que a estação de rádio tinha
revertido a sua decisão devido a críticas generalizadas.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Isto não tem apenas a ver com os EUA. Cada país, cada
sociedade, enfrenta os seus próprios desafios e as organizações culturais
muitas vezes não conseguem compreender o seu papel em lidar com eles ou optam
por permanecer à margem.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Li recentemente sobre a forma curiosa como uma orquestra
australiana escolheu lidar com o “Voice Referendum”, que foi realizado no dia
14 de Outubro. O referendo em si foi bastante intrigante para mim: perguntava-se
aos eleitores se aprovavam uma mudança na Constituição australiana que
reconhecesse os indígenas australianos através da criação de um órgão (chamado “Voz
dos Aborígenes e dos Habitantes das Ilhas do Estreito de Torres) para
representar esta população perante o Parlamento e o Governo Executivo da
Commonwealth. </span><span lang="EN-GB" style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><a href="https://www.inclusiveaustralia.com.au/resources/the-inclusive-australia-social-inclusion-index-2020-21-report-1"><span lang="PT" style="mso-ansi-language: PT;"><b>Uma vez reconhecida a invisibilidade e a
contínua discriminação das populações indígenas</b></span></a></span><span style="line-height: 107%;">, como
é possível que o direito da sua voz ser ouvida fosse uma questão para um
referendo e uma mudança na constituição? De qualquer forma, a maioria dos australianos
votou “Não”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><a href="https://theconversation.com/arts-organisations-say-they-want-to-be-cultural-leaders-but-are-they-living-up-to-their-goals-215445"><span lang="PT" style="mso-ansi-language: PT;"><b>O artigo que li</b></span></a></span><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">
</span><span style="line-height: 107%;">era
relacionado com a liderança cultural e começava com a seguinte história: Quando
a data do referendo foi anunciada, a Orquestra Sinfónica da Tasmânia (TSO)
cancelou discretamente o seu concerto Last Night of the Proms, agendado para a
noite anterior. Na altura, a orquestra informou apenas quem tinha comprado
bilhete, individualmente. Semanas depois, num comunicado para a imprensa, a TSO
disse que o motivo do cancelamento foi que “prosseguir com uma celebração
musical da pompa britânica nessa noite pareceu insensível, dada a proximidade
com o referendo do Voice no dia seguinte”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">“Porque é que a orquestra não fez nenhuma declaração
significativa a propósito do cancelamento?”, questionou Samuel Cairnduff, autor
do artigo e doutorando em liderança cultural. Na minha opinião, há um sinal
claro de sensibilidade para com as questões sociais que afectam parte da
população do país e que preocupam muitos outros cidadãos. E também parece
existir consciência sobre as formas como a população é afectada. Ao mesmo
tempo, a TSO seguiu os passos frequentemente seguidos pela maioria, talvez, das
organizações culturais em todo o mundo: optou por não tomar uma posição clara
sobre uma questão que divide os cidadãos australianos; optou por não criar um
espaço tão necessário para debater este assunto; escolheu ficar à margem. Não
se sentiriam confortáveis em realizar o programa inicialmente planeado (e isso
significa alguma coisa), mas desejaram permanecer o mais discretos - ou deveria
dizer “neutros”? – possível. É isto que se pode esperar de uma organização que
pretende servir o sector como líder cultural (pág. 7 do seu </span><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><a href="https://www.tso.com.au/wp-content/uploads/2022/03/TSO2030_StrategyDocument_WEB.pdf"><span lang="PT" style="mso-ansi-language: PT;"><b>documento estratégico</b></span></a></span><span style="line-height: 107%;">)?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O mundo da música clássica é tão político como qualquer
outro. Ao ler sobre este cancelamento, lembrei-me da Orquestra Filarmónica de
Cardiff que alterou um concerto com obras de Tchaikovsky, previsto para 18 de Março
de 2022. Embora muitos tenham visto isso como um “cancelamento” do compositor
russo, <a href="https://www.bbc.com/news/uk-wales-60684374"><b>a orquestra
esclareceu</b></a> que “Havia também duas peças com temáticas militares - Marche
Slave e 1812 Overture - que consideramos particularmente inadequadas neste
momento.” (além de mencionar que um membro da orquestra tinha família na
Ucrânia e que também foram informados na altura de que o título “Pequeno Russo”
da Sinfonia nº 2 era considerado ofensivo para os ucranianos). É uma surpresa
que as peças musicais não sejam apenas “um conjunto de notas”, mas que
carreguem significado e uma mensagem? As orquestras e os músicos não deveriam
partilhar isto com o seu público e não só? Será a música “apenas” música – tal
como Gustavo Dudamel afirmou uma vez que era “apenas” um músico, quando se
esperava que tomasse uma posição em relação ao tratamento dado pelo regime
venezuelano aos manifestantes pacíficos em 2014? (<a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2014/03/ser-apenas.html"><b>veja
mais neste blog</b></a>)<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Não somos “apenas”… E o que criamos ou produzimos também
não é “apenas”. Tomamos posição, tanto com o que dizemos como com o que não
dizemos; tanto com o que fazemos como com o que não fazemos.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Em 2014, <a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2014/12/a-dimensao-educativa.html"><b>escrevi
neste blog</b></a> sobre a dimensão educativa do trabalho dos profissionais da
cultura. Nesse texto mencionava um protesto ocorrido durante o intervalo do
“Requiem” de Brahms pela Orquestra Sinfónica de Saint Louis. Os manifestantes
levantaram-se e cantaram “Requiem for Mike Brown” (o jovem negro desarmado que
foi baleado por um polícia em Ferguson, um subúrbio de St.Louis). “Ninguém
interrompeu os manifestantes, ninguém chamou a polícia”, escrevi na altura,
“Talvez porque o que aconteceu fez sentido, naquele local, naquela hora, naquele
contexto específico”. Nesse mesmo texto, referia-me também à controversa
decisão do Tricycle Theatre de não acolher o Festival de Cinema Judáico do
Reino Unido, pela primeira vez em oito anos. A razão era que o festival recebia
apoio da Embaixada de Israel em Londres e, dado o ataque em curso à Gaza na
altura, não parecia apropriado aceitar apoio financeiro de uma agência
governamental – um duro lembrete para todos nós que actualmente comentamos
sobre o conflito Israel-Hamas que o ataque à Gaza e o assassinato de civis
palestinianos não é algo novo, não é uma resposta ao massacre levado a cabo
pelo Hamas a 7 de Outubro. Talvez, como profissionais da cultura, devêssemos
considerar a nossa responsabilidade por esta continuada falta de humanidade –
não apenas na Palestina ou na Austrália, mas também no nosso bairro. Ou ainda
estaremos a perguntar o que temos a ver com isso?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Viver em sociedade não é (nunca foi) uma tarefa fácil.
Aprender como fazer, se esforçar para fazer, exige esforço e tempo. Mas, <a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2023/09/o-que-e-politica-e-para-que-serve.html"><b>como
escrevi recentemente num post</b></a> sobre política e cultura, “a vida política, a
vida organizada numa <i>polis</i> (cidade), é uma condição para a nossa
sobrevivência”. Uma sociedade que se preocupa é uma sociedade que tem uma oportunidade
de prosperar e ser feliz. A minha sensação nos últimos meses é que os
profissionais da cultura parecem estar cansados, até mesmo impacientes, em
relação ao que muitos chamam de questões sociais “difíceis” ou “fracturantes”
ou mesmo “controversas”. Acredito que gostaríamos que as coisas fossem “mais
fáceis”, menos exigentes, preferimos continuar com o nosso “business as usual”
em vez de investirmos tempo para ouvir, para aprender, para compreender as
“nuances”, bom… para nos preocuparmos, mesmo. As organizações culturais para as
quais todos trabalhamos serão tão irrelevantes para as pessoas quanto a nossa
falta de interesse em nos envolvermos.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Mais neste blog:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2023/09/o-que-e-politica-e-para-que-serve.html">O
que é a política e para que serve a cultura?</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2014/12/a-dimensao-educativa.html">A
dimensão educativa</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2014/03/ser-apenas.html"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Ser ‘apenas’</b></span></a><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-53262174004329474792023-10-01T13:14:00.000+01:002023-10-01T13:14:01.804+01:00A censura nem sempre nos incomoda, não é verdade?<p style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgI8D8KSrS3YDZn7PjmyYe-778Wt7FzFCxpeSmb_cHupImW7iue_A28i1FpDcwq5CL0juXYdGp2mX5yoALdQxCDjyWbGSYZlPSlLeVEk8VVCl5uoCw_2L4EedorkNa9eC99FRkD3s5ZLcC4_gx2i4lEnfLlZ1XXDqSn0yzsuL1CObmnpeiNVvjuIHriOdst/s500/luca_top_500.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="313" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgI8D8KSrS3YDZn7PjmyYe-778Wt7FzFCxpeSmb_cHupImW7iue_A28i1FpDcwq5CL0juXYdGp2mX5yoALdQxCDjyWbGSYZlPSlLeVEk8VVCl5uoCw_2L4EedorkNa9eC99FRkD3s5ZLcC4_gx2i4lEnfLlZ1XXDqSn0yzsuL1CObmnpeiNVvjuIHriOdst/s16000/luca_top_500.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-family: times; font-size: x-small;">Imagem retirada da página de Facebook do LUCA - Teatro Luís de Camões</span></td></tr></tbody></table><p></p><p><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; line-height: 107%;">O Fitzwilliam Museum em
Cambridge é um dos mais conhecidos museus universitários. A sua actual
exposição </span><a href="https://fitzmuseum.cam.ac.uk/plan-your-visit/exhibitions/black-atlantic-power-people-resistance"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>Black Atlantic: Power, people, resistance</b></span></a><span style="background: white; line-height: 107%;"> questiona-nos: “Quais as histórias que são
lembradas, e porquê?”. O museu afirma que esta exposição explora algumas
histórias novas da História, questionando o papel de Cambridge no comércio
transatlântico de pessoas escravizadas.</span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Em 1816, Richard Fitzwilliam
doou muito dinheiro, literatura e arte à Universidade de Cambridge, que deu
origem ao museu. As doações foram possíveis graças à enorme riqueza de seu avô,
Sir Matthew Decker, um comerciante inglês nascido na Holanda que ajudou a
estabelecer a South Sea Company em 1711, responsável pelo tráfico de pessoas
escravizadas da África. Respondendo a uma necessidade e exigência de uma parte
da sociedade – mas também sua, parece-me – o museu coloca o dedo na ferida,
questionando-se a si próprio e o seu contributo na perpetuação de uma
determinada história.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">É comum ouvirmos pessoas
argumentar contra o “apagar da história”. Fico sempre com a sensação de uma
reacção demasiado superficial, de pessoas demasiado confortáveis no seu lugar,
que não se questionam verdadeiramente qual a história que foi apagada. No verão
passado, uma notícia que deu a volta ao mundo foi a da <a href="https://www.nytimes.com/interactive/2023/08/14/video/belizaire-frey-children-portrait-met.html"><b>aquisição
do quadro “Bélizaire and the Frey children” pelo Metropolitan Museum of Art</b></a>.
Bélizaire foi uma criança escravizada e a sua figura tinha sido apagada do
quadro, por razões ainda desconhecidas. Um trabalho de restauro em 2005 voltou
a revelá-lo, sendo que o Met adquiriu o quadro “como parte de seu esforço maior
para reformular a forma como conta a história da arte americana”. Isto também
me faz lembrar a iniciativa do Worcester Art Museum, em 2018, de incluir tabelas
que se referissem à associação de pessoas retratadas em quadros à escravatura, <b><a href="https://hyperallergic.com/439716/can-art-museums-help-illuminate-early-american-connections-to-slavery/">“chamando
a atenção para as ligações entre arte, escravatura e riqueza na América</a>”</b>. </span><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>É</b> a esses apagamentos e deturpações que alude<b> </b>também<b> <a href="https://www.theguardian.com/artanddesign/2023/sep/24/black-atlantic-power-people-resistance-fitzwilliam-museum-cambridge-review" target="_blank">a obra
da artista britânica Barbara Walker <span style="border: 1pt none windowtext; mso-border-alt: none windowtext 0cm; padding: 0cm;">Vanishing Point 29
(Duyster) </span>(2021)</a></b></span><span style="background: white; color: #121212; line-height: 107%;"><b>.</b>
Mas não é este apagamento da história que incomoda certas pessoas, não é disso
que falam. A nossa sensibilidade é bastante selectiva; a nossa luta pela
História, pela Arte, pela liberdade de expressão também.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1JcqY5ED6gHP4v23L3zL19Iu-M7nrhvEqUKaAFYnsNTUr60Xty-grCPee3581MDs1t91H6M3hGGNRVkZp3Zn2lOYeRurR22fL_d84zahu02OFj3Ssdfpn79Cq2r2AO4uRrgzESYCCtiDSLjW6TYDQySNyADT-noglwTzZNZxhJpC-PGM2DYaDnH0Um2Xw/s500/erasure_guardian_500.png" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="393" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1JcqY5ED6gHP4v23L3zL19Iu-M7nrhvEqUKaAFYnsNTUr60Xty-grCPee3581MDs1t91H6M3hGGNRVkZp3Zn2lOYeRurR22fL_d84zahu02OFj3Ssdfpn79Cq2r2AO4uRrgzESYCCtiDSLjW6TYDQySNyADT-noglwTzZNZxhJpC-PGM2DYaDnH0Um2Xw/s16000/erasure_guardian_500.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-family: times; font-size: x-small;">Imagem retirada do jornal The Guardian.</span></td></tr></tbody></table></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Em
Maio passado, a instalação de Dori Nigro e Paulo Pinto <em>Adoçar a Alma para o Inferno III</em><em><span style="font-style: normal;">, integrada na Bienal
Fotografia do Porto, questionava-nos: </span></em>“Quantas pessoas escravizadas
vale um hospital psiquiátrico?”. O Centro Hospitalar Conde de Ferreira, onde a
obra estava instalada, é uma de mais de 100 instituições que foram apoiadas por
</span><a href="https://filantropia.tv/biografias-conde-de-ferreira/" target="_blank"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%; text-decoration: none;">Joaquim Ferreira dos Santos</span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">, Conde de Ferreira, com
dinheiro <em><span style="font-style: normal;">resultante
sobretudo do comércio de pessoas escravizadas, entre Angola e Brasil. No
próprio dia da inauguração, </span></em>o administrador executivo do CHCF
Ângelo Duarte ordenou o encerramento da sala onde se encontrava a obra, </span><a href="https://www.publico.pt/2023/05/24/culturaipsilon/noticia/bienal-fotografia-porto-acusa-misericordia-acto-censura-2050909"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>alegando</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> o </span><span style="line-height: 107%;">potencial desconforto que tal poderia gerar na
comunidade daquela que é a casa de muitos doentes”. A censura não pareceu
realmente incomodar a sociedade, começando pelo próprio sector da cultura. </span><a href="https://hyperallergic.com/827128/portugal-hospital-removes-artwork-about-its-slavery-ties/"><span style="line-height: 107%;"><b>Li na
altura</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> que a Bienal recebeu emails de apoio<span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;"> da Câmara
Municipal do Porto, da Direção-Geral das Artes, da Universidade do Porto e de
outros parceiros. Li também uma </span></span><a href="https://www.publico.pt/2023/06/21/culturaipsilon/opiniao/arte-abrir-portas-nao-fechalas-2054115"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>carta aberta</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">,
que me parece que foi iniciativa da UNA – União Negra das Artes. Mas senti que,
em grande parte, como sector cultural, não nos sentimos realmente incomodados,
não manifestámos publicamente a nossa solidariedade para com os nossos colegas,
nem como indivíduos nem como instituições; ficámos demasiado silenciosos.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Achei, por isso, algo irónica
a </span><a href="https://www.publico.pt/2023/09/13/culturaipsilon/noticia/estatua-camilo-porto-sair-espaco-publico-apos-peticao-invoca-questoes-gosto-moral-2063247"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>controvérsia provocada nessa mesma cidade do Porto</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">, e discutida por
diversos colegas em diferentes pontos do país, a propósito da permanência ou
não da estátua de Camilo Castelo Branco e Ana Plácido em frente à antiga Cadeia
da Relação. Não me interessa aqui discutir a desastrosa gestão deste assunto pelo
Presidente da Câmara do Porto. Nem vou repetir </span><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/06/a-minha-responsabilidade-por-este.html"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>o que já partilhei</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> sobre a contestação de estátuas que se encontram no espaço
público. Interessa-me discutir a preocupação com </span><a href="https://amusearte.hypotheses.org/10033"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>a liberdade
de expressão artística</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> ou com </span><a href="https://www.publico.pt/2023/09/14/culturaipsilon/noticia/nova-peticao-pede-estatua-camilo-porto-fique-onde-2063384"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>o “apagar a história”</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> ou, ainda, com </span><a href="https://www.publico.pt/2023/09/15/opiniao/editorial/estatua-camilo-irrevogavel-moreira-2063507"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>a opinião dos restantes portuenses</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">. A nossa sensibilidade
provou ser, mais uma vez, muito selectiva e nós, mais uma vez, pouco honestos.</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Há
dias, houve mais uma tentativa de censura, no lançamento do livro “No meu
bairro”, de Lúcia Vicente. A linguagem neutra usada no livro incomodou algumas
pessoas, que se acharam no direito de interromper o evento, de calar a autora. </span><a href="https://www.publico.pt/2023/09/23/culturaipsilon/noticia/livro-infantil-linguagem-inclusiva-alvo-protesto-autora-censura-2064389"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>Lúcia Vicente disse ao Público</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> que </span><span style="line-height: 107%;">"estavam
sete pessoas na audiência que tinham vindo para destabilizar ou para questionar
directamente o livro, mostrando o seu desagrado. O que me pareceu perfeitamente
aceitável, até entrar a pessoa com o megafone"… Desta vez, vi com alguma
emoção e esperança o vizinho </span><a href="https://www.facebook.com/photo?fbid=799292318865386&set=a.502554041872550"><span style="line-height: 107%;"><b>Teatro
do Bairro Alto a manifestar publicamente a sua solidariedade</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Dias
mais tarde, o </span><a href="https://www.facebook.com/photo?fbid=817671010362311&set=a.639980994797981"><span style="line-height: 107%;"><b>LUCA –
Teatro Luís de Camões posicionou-se também</b></span></a><span style="line-height: 107%;">; talvez mais
discretamente, para quem não estava a par do sucedido, mas inequivocamente.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgwiZKjDMraWdDHo1eL0qro8qbKzUofS2xfuOqPAm841XcsOHiq6fbV1nkTTm8PJNuuiG-ICGTxovK_Ltdf9g9p1IHwgApxW-GTScyHaJuMH3nChyphenhyphenFdcNFZ05PjiuX2aw9mGb8w1jbv0aVumNDbquxw_vXUMJuz1x77X24yayEE0TMCsYGbIODijuPMy0y_/s500/tba_luca_500.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="275" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgwiZKjDMraWdDHo1eL0qro8qbKzUofS2xfuOqPAm841XcsOHiq6fbV1nkTTm8PJNuuiG-ICGTxovK_Ltdf9g9p1IHwgApxW-GTScyHaJuMH3nChyphenhyphenFdcNFZ05PjiuX2aw9mGb8w1jbv0aVumNDbquxw_vXUMJuz1x77X24yayEE0TMCsYGbIODijuPMy0y_/s16000/tba_luca_500.png" /></a></span></div><span style="font-family: verdana;"><br /></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Podemos pensar que estamos longe da situação gravíssima que
se vive nos últimos anos nos EUA, com as repetidas (e bem-conseguidas) </span><a href="https://www.theguardian.com/books/2023/sep/20/book-bans-us-rise-public-libraries"><span style="line-height: 107%;"><b>tentativas
de censura de livros</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> nas bibliotecas escolares, que mais
recentemente atingem também as bibliotecas públicas. Iniciativas como o </span><a href="https://front.moveon.org/recap-of-banned-bookmobile-tour/"><span style="line-height: 107%;"><b>Banned
Bookmobile Tour</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> ou </span><a href="https://booksunbanned.org/"><span style="line-height: 107%;"><b>Books
Unbanned</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> lutam contram o silenciamento de autores e histórias,
enquanto o <span style="background: white; color: #121212;">Chartered Institute of
Library and Information Professionals no Reino Unido emitiu recentemente novas directrizes
para os seus membros afirmando que </span></span><a href="https://www.theguardian.com/books/2023/sep/21/new-guidelines-urge-uk-libraries-not-to-avoid-controversial-books-and-ideas"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>“Num mundo polarizado, é importante que o nosso sector seja
claro na sua oposição à censura.”</b></span></a><br />
<br />
</span><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Dizia
que podemos pensar que estamos longe destas situações gravíssimas. Devo lembrar
que, há pouquíssimos anos, afirmava-se que Portugal estava imune à extrema
direita? É o nosso silêncio e relativização, é a forma como normalizamos certos
actos e discursos, que dá espaço aos inimigos da democracia. A nossa defesa da
liberdade de expressão e do não apagamento da História deve ser informada,
permanente, inequívoca. E deve existir mesmo – e sobretudo - quando nos faz
sair da nossa zona de conforto. </span><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-68319120971096019692023-09-25T00:09:00.002+01:002023-09-25T07:13:38.676+01:00O que é a política e para que serve a cultura?<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMEc-kIJ8sfkqwA9P5KAA5PbjyLPJSRqpZmyTZJmiHbaBqJ4AHpix7raqOgA-reWgwjcZcChm4b8R2zLptXwRx_921JQJ8DJmgjzl7N-JeTpgWM6DSnAa1y5onaa6K97S3_1oTCKahIx_8u7eQA2oLautuob2z24dLrufTzR05epPJPh63QTNSiH4uznvP/s500/chicago_500px.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="327" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMEc-kIJ8sfkqwA9P5KAA5PbjyLPJSRqpZmyTZJmiHbaBqJ4AHpix7raqOgA-reWgwjcZcChm4b8R2zLptXwRx_921JQJ8DJmgjzl7N-JeTpgWM6DSnAa1y5onaa6K97S3_1oTCKahIx_8u7eQA2oLautuob2z24dLrufTzR05epPJPh63QTNSiH4uznvP/s16000/chicago_500px.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">A onda de calor em Chicago em 1995<br />(imagem retirada da apresentação de Liva Kreislere)</td></tr></tbody></table><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt; line-height: 107%;"><br /></span><p></p><p><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">No início de Agosto, tive a oportunidade de participar numa
escola de verão organizada pelo </span><a href="https://lcca.lv/en/"><span style="line-height: 107%;"><b>Latvian
Centre for Contemporary Art</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e dedicada ao tema </span><a href="https://lcca.lv/en/events/public-programme-of-the-summer-school--care-of-earth-care-of-people--/#izstade"><span style="line-height: 107%;"><b>“Care
of Earth. Care of People”</b></span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"> </span><span style="line-height: 107%;">(Cuidar
da terra. Cuidar das pessoas). Pouco antes de partir, tive a oportunidade de
assistir a uma parte da apresentação da jovem arquitecta e urbanista, Liva
Kreislere, sobre planeamento cultural. O planeamento cultural é uma abordagem
ao desenvolvimento da cidade que olha para a cidade como um fenómeno cultural e
concentra-se fortemente na população local, nos agentes culturais locais que
são partes interessadas e no envolvimento municipal. É um método onde os
artistas e as instituições culturais tomam cada vez mais uma posição central,
com um contributo comprovado para o bem-estar social, bem como para a melhoria
do envolvimento cívico dos cidadãos. “A cultura”, disse Liva, “está intimamente
ligada à saúde, à economia e à política”. Um dos exemplos que mencionou foi o da
onda de calor mortal, em 1995, em Chicago. Segundo um estudo, houve maior taxa
de sobrevivência entre a população idosa em bairros com fortes ligações entre os
seus membros. Comunidades estreitamente unidas cuidaram melhor dos seus idosos,
especialmente vulneráveis dadas as circunstâncias.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">“Perdemos o sentido de cidade e de cidadania”, disse Liva.
O que me lembrou do filósofo grego Christos Yannaras e do que escreveu no seu
livro “Sobre o significado da política” sobre a origem do fenómeno político, da
coexistência organizada dos seres humanos. Segundo o mito grego, as pessoas
viviam dispersas, por isso eram presas fáceis para os animais selvagens. Embora
tivessem desenvolvido artes criativas, que garantiam a sua alimentação, não tinham
desenvolvido a arte política. Assim, os deuses ofereceram-lhes a vida política,
a vida organizada numa <i>polis</i> (cidade), como condição para a sua
sobrevivência. Isso não é algo natural do ser humano, não está na sua natureza.
É um presente dos deuses, uma conquista de libertação da natureza humana.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estas referências misturavam-se na minha cabeça, voltavam
constantemente, fazendo-me questionar o que entendemos por “cultura” e qual o
seu papel na construção de uma sociedade que se preocupa com a terra e com as
pessoas. Passei as minhas férias de verão na minha cidade natal, na Grécia. O
país testemunhou este ano graves desastres naturais / provocados pelas pessoas;
viu a imagem de um abutre procurando o seu ninho na floresta ardida de
Evros; soube da morte de um passageiro atrasado que foi atirado ao mar pela
tripulação do ferry e ouviu um ministro equiparar a dor desta morte à dor das
famílias dos responsáveis pela mesma; viu os preços da água engarrafada subirem
à medida que as pessoas atingidas pelas cheias na Tessália foram privadas
(ainda estão privadas) de água corrente. No mês de Setembro, os aniversários de
dois assassinato intensificaram o meu questionamento em relação à cultura desta
nação: o do rapper Pavlos Fyssas pela organização criminosa fascista Aurora Dourada
(outrora um partido eleito no parlamento grego) e o do activista queer Zak
Kostopoulos no centro de Atenas e nas mãos de cidadãos “comuns”, com a polícia
a vigiar.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Quando o Arts Council England anunciou a sua estratégia
cultural para a década, </span><a href="https://www.artscouncil.org.uk/lets-create"><i><span style="line-height: 107%;"><b>Let’s Create</b></span></i></a><span style="line-height: 107%;">, em
2020, a questão subjacente era “Quem queremos ser em 2030?” Dizia: “Até 2030,
queremos que Inglaterra seja um país onde a criatividade de cada um de nós seja
valorizada e tenha a oportunidade de florescer. Um país onde cada um de nós tenha
acesso a uma gama notável de experiências culturais de alta qualidade. (…) Até
2030, imaginamos um país transformado pela sua cultura e, ao mesmo tempo, em
constante transformação: uma nação verdadeiramente criativa, na qual cada um de
nós pode desempenhar um papel.” Conhecem algum outro país que olhe para a sua
cultura como algo mais do que uma rede de espaços culturais formais e talvez também o conjunto de pessoas que trabalham no sector?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">A mãe de Zak Kostopoulos lembrou-nos há poucos dias que “A
cultura e a superioridade de uma sociedade são vistas na forma como protege e apoia
os mais fracos, os pobres, as pessoas com deficiência, a mulher, a criança, o
imigrante, os idosos, os doentes e outros. Na Grécia vimos os pobres perderem
as suas casas, as pessoas com deficiência atiradas ao mar, a mulher assassinada
pelo marido ou companheiro, a criança violada, o imigrante afundado com o barco,
a pessoa transgénero esfaqueada.” (</span><a href="https://www.avgi.gr/koinonia/460454_mi-lypasai-min-pikrainesai-mama"><span style="line-height: 107%;"><b>a sua
carta aberta para quem lê grego</b></span></a><span style="line-height: 107%;">)<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O que dizer à mãe do Zak quando na Grécia vimos também um partido conduzido por um dos criminosos presos da Aurora Dourada, que surge três semanas antes das últimas eleições legislativas, ganhar 11 lugares no parlamento? </span></span><span style="font-family: verdana;">Em que é que nos tornamos? Quem queremos ser? O que é a
política e para que serve a cultura?</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Leituras sugeridas por Liva Kreislere</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Lia Ghilardi (2015), <i>This
is our city: Place-making through cultural planning<o:p></o:p></i></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Franco Bianchini
(2014), <i>Cultural planning and artist-led urban transformation</i><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="line-height: 107%;">Ambas disponíveis </span><a href="https://drive.google.com/drive/folders/1LQxRv54M5FbBEZHdQya0DXVnd2BEYn64"><span style="line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Mais neste blog</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><a href="https://musingonculturextra.blogspot.com/2023/04/liberdade-para-que-cultura-para-que.html"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Liberdade
para quê? Cultura para quê?</b></span></a><br /><span style="font-size: 13.3333px;"><br /></span></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiACwRmGa_axZj6A5A-uLMOIbhsw_6AXMrKFSXWnZamNQtpmhiSrnvtYpnWarhHnA8jCdcbtXqslmnu2Y2mdbrp1RP1ZAXJDI4M32FW1sCYPo9BrF2oxyaRVr_VkwP6R6uZoFsuJjhHuxKwOgcqMxYrumPV3dHWOaRFAYDOZQPprI-j4tQhVhNSRgeiv6ts/s500/black%20vulture_christos%20kalogeros.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="455" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiACwRmGa_axZj6A5A-uLMOIbhsw_6AXMrKFSXWnZamNQtpmhiSrnvtYpnWarhHnA8jCdcbtXqslmnu2Y2mdbrp1RP1ZAXJDI4M32FW1sCYPo9BrF2oxyaRVr_VkwP6R6uZoFsuJjhHuxKwOgcqMxYrumPV3dHWOaRFAYDOZQPprI-j4tQhVhNSRgeiv6ts/s16000/black%20vulture_christos%20kalogeros.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Abutre à procura do seu ninho na floresta ardida (Foto: Christos Kalogeros/Facebook)</td></tr></tbody></table><br /><p class="MsoNormal"><br /></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-63235289971671804302023-06-05T16:22:00.004+01:002023-06-05T23:01:46.955+01:00Museus irrequietos<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhQnZijnWfFMHsHxdHdfb6EBIXcBdEli-9ea5WG4FPn3RX9p6T-8_kQN99muctyvXLFwDAwOfW0zOpvB8QgTkPywfFk7tWv75XEmbk8puQBv2qhYXbYHTOlK5cfRDbXrZRTwqr-4EET8cRceFzbixFncAQBTqNujFpfa1L1-4cKYZFi2S8OT8Mug4l8_w/s500/Cheri%20Samba_s.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhQnZijnWfFMHsHxdHdfb6EBIXcBdEli-9ea5WG4FPn3RX9p6T-8_kQN99muctyvXLFwDAwOfW0zOpvB8QgTkPywfFk7tWv75XEmbk8puQBv2qhYXbYHTOlK5cfRDbXrZRTwqr-4EET8cRceFzbixFncAQBTqNujFpfa1L1-4cKYZFi2S8OT8Mug4l8_w/s16000/Cheri%20Samba_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Chéri Samba, "Reorganisation". AfricaMuseum, Tervuren (Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><br /></span><p></p><p><span style="font-family: verdana;">Acompanhar o trabalho de museus que se questionam e que nos
questionam é particularmente entusiasmante, motivador e inspirador. Num meio
bastante conservador e pesado, estes museus são poucos, muito poucos ainda, e é
refrescante poder identificar aquela liderança que mexe com o que for necessário
e que ajuda a trazer mudanças necessárias, contaminado aos poucos todo o
sector. É neste tipo de museus que eu vejo um esforço verdadeiro e honesto para
serem úteis à sociedade, para fazerem parte dela, para serem relevantes.<span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Tive a oportunidade de visitar alguns desses museus. Começo
pelo </span><a name="_Hlk136868210"></a><a href="https://www.tropenmuseum.nl/en/"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868210;"><span style="line-height: 107%;"><b>Tropenmuseum</b></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136868210;"></span><span style="line-height: 107%;"> em Amsterdão. Aquando da
minha primeira visita, em 2017, a frontalidade com a qual abordava o passado
colonial do país, a criação da sua própria colecção, assim como o racismo na
sociedade contemporânea abalou-me. Nunca antes tinha visitado um museu
etnológico com este tipo de discurso. Tanto na sua exposição permanente, como
nas exposições temporárias (“Colonialism in Indonesia”, “The Future of the
History of Slavery” e </span><a name="_Hlk136868227"></a><a href="https://www.tropenmuseum.nl/en/afterlives-slavery"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868227;"><span style="line-height: 107%;"><b>“Afterlives of Slavery”</b></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136868227;"></span><span style="line-height: 107%;">) o museu questionava-se e
questionava-nos:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como é que o museu adquiriu a sua colecção?</span></span></li><li><span style="font-family: verdana;">Qual é a nossa história partilhada da escravatura?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Como lidamos com ela hoje?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Como podemos moldar o nosso futuro comum?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">É possível digerir a história da escravatura e todas as
suas consequências e seguir em frente?</span></li></ul><div style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></div><div style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><b><a href="<iframe src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/8czyr8f5erqUBr?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476" height="400" frameborder="0" marginwidth="0" marginheight="0" scrolling="no"></iframe>">
<iframe frameborder="0" height="400" marginheight="0" marginwidth="0" scrolling="no" src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/8czyr8f5erqUBr?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476"></iframe></a></b></span></div><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Na minha mais recente visita, em 2022, o museu já tinha
inaugurado a sua exposição </span><a name="_Hlk136868247"></a><a href="https://www.tropenmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/our-colonial-inheritance"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868247;"><span style="line-height: 107%;"><b>“Our colonial inheritance”</b></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136868247;"></span><span style="line-height: 107%;">. Com a frontalidade à qual
nos habituou – e de notar especialmente o determinante possessivo “nossa” (our)
no título da exposição - partilha uma extensa e profunda pesquisa em relação ao
passado colonial da Holanda. E tem uma pergunta ainda para os visitantes no
final:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como é que te podes envolver?</span></span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Este é um tipo de questionamento que tenho encontrado
noutros museus também. O recém- inaugurado </span><a name="_Hlk136868264"></a><a href="https://www.humboldtforum.org/en/"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868264;"><span style="line-height: 107%;"><b>Humboldt
Forum</b></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136868264;"></span><span style="line-height: 107%;"> em
Berlim questiona a proveniência da sua colecção e ainda o trabalho de
inventário e a interpretação dos objectos. Convidou ainda a escritora nigeriana
Chimamanda Ngozi Adichie para fazer o </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=gMRv5xhMCo4"><span style="line-height: 107%;"><b>discurso de abertura</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> em
Setembro de 2021. </span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">
<iframe frameborder="0" height="400" marginheight="0" marginwidth="0" scrolling="no" src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/KdvvD7ofCyyitg?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476"></iframe>
<br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O </span><a name="_Hlk136868325"></a><a href="https://www.africamuseum.be/en"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868325;"><span style="line-height: 107%;"><b>AfricaMuseum</b></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136868325;"></span><span style="line-height: 107%;"> em Tervuren, próximo de
Bruxelas, que reabriu ao público em 2018, afirma que as suas colecções são
propriedade legal do Estado Federal da Bélgica, mas propriedade moral dos
países de origem, e partilha com os visitantes a “regra de seis” que aplica
aquando da aquisição de objectos: <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O objecto é importante para a investigação científica?</span></span></li><li><span style="font-family: verdana;">Completa uma colecção ou uma exposição?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">É de valor excepcional?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Está bem documentado?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Em que circunstâncias foi obtido?</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Acrescenta algo ao nosso conhecimento sobre África
contemporânea?</span></li></ul><p></p>
<div style="text-align: center;"><iframe frameborder="0" height="400" marginheight="0" marginwidth="0" scrolling="no" src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/yndi9tJ30Zxz6N?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476"></iframe></div><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;">Questões desta natureza são também colocadas e partilhadas
com o público pelos Royal Museums of Fine Arts of Belgium, em Bruxelas, através
da campanha </span><a name="_Hlk136868520" style="font-family: verdana;"></a><a href="https://fine-arts-museum.be/en/exhibitions/our-collection-in-question" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868520;"><span style="line-height: 107%;"><b>“Our collection in question”</b></span></span></a><span style="font-family: verdana; mso-bookmark: _Hlk136868520;"></span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;">. Outros museus ainda
interpretam as suas colecções com um novo olhar, tendo adquirido uma outra
consciência, mesmo quando, aparentemente, a sua colecção não se relaciona com a
história do colonialismo ou com o racismo. Penso concretamente na referência
que encontrei no </span><a name="_Hlk136868536" style="font-family: verdana;"></a><a href="https://www.momu.be/" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136868536;"><span style="line-height: 107%;"><b>MoMu</b></span></span></a><span style="font-family: verdana; mso-bookmark: _Hlk136868536;"></span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"> (Museu da Moda) na Antuérpia
sobre a capa preta com capucho: usada pelos monges na época medieval, e pelas
mulheres no século 18, protegendo a pessoa dos olhares indiscretos; nos anos
1970, é transformada no “hoodie” pela cultura hip-hop, protegendo das câmeras
de vigilância nas cidades, ganhando também significado político depois do
assassinato em 2012 do adolescente negro Trayvor Martin (o seu assassino
considerou-o suspeito porque vestia um <i>hoodie</i> preto, o que mostra que
poder vestir um <i>hoodie</i> sem preocupações faz parte do privilégio branco).</span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbSXYStYzqYl-FKq0BQ8KKCD6gJIq092HrMJu7ow2SJcycYIRQh8_OzKwX84o3-AAIlDNmY-xLXXG9K0Kc869I25JU_qTzKOjA4__8u1Sxfwkc6C5SPXxb0264JgDpk6MbSKc7pwah6eFkhIaWc860hSznzcjI3qGuuKgvGXnga30P_j7Str5z3FTglA/s500/MoMu_1_s.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbSXYStYzqYl-FKq0BQ8KKCD6gJIq092HrMJu7ow2SJcycYIRQh8_OzKwX84o3-AAIlDNmY-xLXXG9K0Kc869I25JU_qTzKOjA4__8u1Sxfwkc6C5SPXxb0264JgDpk6MbSKc7pwah6eFkhIaWc860hSznzcjI3qGuuKgvGXnga30P_j7Str5z3FTglA/s16000/MoMu_1_s.jpg" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiQEWk1ql6wQTND9-53ZGNI1UtC4ymEghqoVXrM50SDcqzS6k0nEQOlM9lrVI0Cdq8ud9Tz7MMA5Pqexcr_WXCQSjatyFv2hGYtX-ZRJXPIXgAbernPb4P-OnAA9vdAh9xyOLoNo1T1VorAC6x3vAFhXc3bKOD_kTVU1NdVKfIP_89RISuOBMwf-IqezQ/s500/MoMu_2_s.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="212" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiQEWk1ql6wQTND9-53ZGNI1UtC4ymEghqoVXrM50SDcqzS6k0nEQOlM9lrVI0Cdq8ud9Tz7MMA5Pqexcr_WXCQSjatyFv2hGYtX-ZRJXPIXgAbernPb4P-OnAA9vdAh9xyOLoNo1T1VorAC6x3vAFhXc3bKOD_kTVU1NdVKfIP_89RISuOBMwf-IqezQ/s16000/MoMu_2_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">MoMu, Antwerp (Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Neste contexto, devemos ainda lembrar-nos, a título de
exemplo, de exposições como </span><a href="https://www.musee-orsay.fr/fr/expositions/le-modele-noir-de-gericault-matisse-196083"><span style="line-height: 107%;"><b>“Le
modèle noir de Géricault à Matisse”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> no Musée d´Orsay em Paris
(2019) sobre questões estéticas, políticas, sociais e raciais, bem como sobre
imaginário revelado pela representação de figuras negras nas artes plásticas; </span><a href="https://www.rijksmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/past/slavery"><span style="line-height: 107%;"><b>“Slavery:
ten true stories”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> no Rijksmuseum em Amsterdão (2021), onde
também o director do museu, Taco Dibbits, se assume como beneficiário da
escravatura; ou </span><a href="https://www.metmuseum.org/exhibitions/juan-de-pareja"><span style="line-height: 107%;"><b>“Juan
de Pareja: Afro-Hispanic painter”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> no Metropolitan Museum en
Nova Iorque (2023), sobre o pintor que durante duas décadas foi escravizado por
Velázquez e também seu modelo.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A inevitável pergunta é: e em Portugal?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O mais recente episódio é a </span><a href="https://www.publico.pt/2023/06/01/culturaipsilon/noticia/misericordia-porto-justifica-censura-obra-arte-bemestar-doentes-2051874"><span style="line-height: 107%;"><b>censura
praticada pela administração do <span style="background: white;">Centro
Hospitalar do Conde de Ferreira à obra “Adoçar a Alma para o Inferno III”,
dos artistas Dori Negro e e Paulo Pinto</span></b></span></a><span style="background: white; color: #0a0a0a; line-height: 107%;">, que denuncia o esclavagismo do Conde de
Ferreira. A obra é apresentada no âmbito da Bienal’23 Fotografia do Porto e a
administração do hospital, para além de considerar as referências “ofensivas à
memória” do seu patrono, considera que “</span><span style="line-height: 107%;">não existem condições
psicológicas que permitam a exibição da peça em causa, já que, os ‘doentes,
trabalhadores e suas famílias se sentem afectados’ pela pergunta ‘quantas
pessoas escravizadas valem um hospital psiquiátrico?’".</span><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Não se trata de um museu, mas parece que nem nos museus
existem ainda “condições psicológicas” para certas reflexões e práticas. Ou não
existe vontade, sentido de responsabilidade, consciência da urgência. Ocorre-me
que, quando em Janeiro esteve na Culturgest, em Lisboa, Lonnie Bunch (primeiro
secretário negro da Smithsonian Institution e primeiro director do National
Museum of African American History and Culture), para falar sobre “Racismo na praça
pública” (</span><a href="https://www.culturgest.pt/pt/programacao/racismo-na-praca-lonnie-bunch/"><span style="line-height: 107%;"><b>informações</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=j2j8LICsVhU"><span style="line-height: 107%;"><b>vídeo</b></span></a><span style="line-height: 107%;">), não
esteve na plateia nenhum director de um museu nacional ou representante do
Ministério da Cultura; no simpósio que se seguiu no Museu Nacional de História
Natural e da Ciência (MUHNAC), “Acertando contas com o racismo: a memória
social do comércio de escravos” (</span><a href="https://www.ulisboa.pt/evento/acertando-contas-com-o-racismo-memoria-social-do-comercio-de-escravos"><span style="line-height: 107%;"><b>informações</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=-kLBDA98ds8&t=1s"><span style="line-height: 107%;"><b>vídeo</b></span></a><span style="line-height: 107%;">)
esteve apenas o Director do Museu Nacional de Arqueologia. As ausências dos
directores dos nossos museus e monumentos nacionais têm sido uma constante em
vários fóruns. <o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh3jvtu4fLv0W3PFWpV3bs1J0PUxqIWbtWT6YPTLZas7ECr46jbnANug-fqoyfki8jgA4PU757GFvES53mGY1EhQJ1ZQquxo4HNGPgT4tmQi5x7U0X-fZT_VorkUrImdM86xDDDlphoe3QPsO5ycWRNkOKa-yroVZCyb50zC4dgV-nVsdqXbP3ZNaNs0Q/s500/Cynthia%20Schimming_No%20Title_s.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh3jvtu4fLv0W3PFWpV3bs1J0PUxqIWbtWT6YPTLZas7ECr46jbnANug-fqoyfki8jgA4PU757GFvES53mGY1EhQJ1ZQquxo4HNGPgT4tmQi5x7U0X-fZT_VorkUrImdM86xDDDlphoe3QPsO5ycWRNkOKa-yroVZCyb50zC4dgV-nVsdqXbP3ZNaNs0Q/s16000/Cynthia%20Schimming_No%20Title_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Cynthia Schimming, "No title - My philosophy, your interpretation". Humboldt Forum <br />(Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pensando em alguns em que estive presente ou envolvida na
organização, lembro-me de registar essa total ausência: <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">na palestra de Nicholas Mirzoeff <span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">"Decolonizing the Museum:
Lessons from New York"</span> em 2018 na RE.AL;</span></span></li><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">na palestra de Felwine Sarr (co-autor do chamado “relatório
Macron” sobre a restituição de objectos) na Culturgest em 2020; </span></span></li><li><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">no encontro Descentrar o império, reparar o futuro”,
realizado em Novembro 2022 na Culturgest; </span></span></li><li><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">no seminário da Acesso Cultura
“Descolonizar os museus: isto na prática…?” em 2019 (</span><a href="https://acessocultura.org/descolonizar-os-museus-isto-na-pratica/"><span style="line-height: 107%;"><b>informações
e gravações</b></span></a><span style="line-height: 107%;">), que teve Wayne Modest do Tropenmuseum como
orador principal e onde o Director do Museu Nacional de Etnologia participou
como panelista; <o:p></o:p></span></span></li><li><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">na conferência anual da Acesso Cultura em 2016, cujo tema
foi “O quê? E então? Relevância dos conteúdos e linguagem simples” e com
oradora principal a Martine Gosselink do Rijksmuseum, responsável pelo projecto
de reescrita das tabelas no seu museu (</span><a href="https://acessocultura.org/conf2016/"><span style="line-height: 107%;"><b>informações e gravações</b></span></a><span style="line-height: 107%;">). <o:p></o:p></span></span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">São apenas alguns exemplos. Houve mais. Como explicar estas
ausências? E como podemos esperar ver mudanças, mudanças necessárias e
urgentes, se as pessoas responsáveis não se mostram disponíveis para ouvir e
participar no diálogo?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Não devemos avançar sem mencionar o trabalho feito por
alguns, poucos, museus portugueses. Apesar da apatia e inércia generalizada, algo
está a mexer. Vale a pena referir aqui a exposição </span><a href="https://www.museudelisboa.pt/pt/acontece/convivencias-lisboa-plural-1147-1910"><span style="line-height: 107%;"><b>“Lisboa
Plural”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> no Museu de Lisboa (2019) ou </span><a href="https://www.museus.ulisboa.pt/exposicao-impulso-fotografico"><span style="line-height: 107%;"><b>“O
impulso fotográfico: (des)arrumar o arquivo colonial”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">,
actualmente no MUHNAC. Ambos estes museus, assim como a Acesso Cultura e outras
entidades, foram responsáveis pela vinda de Lonnie Bunch a Portugal.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><br /></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><span style="font-size: large;">O que há numa tabela?</span><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Esta reflexão foi provocada por uma tabela. Uma tabela que
acompanha uma escultura de Soares dos Reis exposta no MNAC. Lê-se: “Cabeça de
preto / Head of black”. Já por várias vias me tinham chegado comentários sobre
ela, mas na semana passada o post de uma colega no Facebook provocou uma conversa
intensa. Ainda bem. Deveria também ser levada para outros contextos.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="text-align: center;"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="line-height: 107%;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgIrOvUsysRSE6kwxMC50KzbXg6yDglC8mPmsLWGotjYKTVjAsg7vOroD9i2JqN1IREiOLWvdpFdn0oDE817QyowOXUXZCBFHqkdSwyBm-dxz2tBmNudpALfclJwD8PZeOpQHxWHW0phYzCntZHyteuRzloMzCbe3Bemwp5FNjIgIE0g-MnrjP9iSDOhg/s615/mnac.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="615" data-original-width="497" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgIrOvUsysRSE6kwxMC50KzbXg6yDglC8mPmsLWGotjYKTVjAsg7vOroD9i2JqN1IREiOLWvdpFdn0oDE817QyowOXUXZCBFHqkdSwyBm-dxz2tBmNudpALfclJwD8PZeOpQHxWHW0phYzCntZHyteuRzloMzCbe3Bemwp5FNjIgIE0g-MnrjP9iSDOhg/s16000/mnac.png" /></a></span></div><span style="line-height: 107%;"><br /><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O que me deixa mais perplexa no caso desta tabela é que o
museu entende que a mesma é problemática. Mas não age. Não com a urgência que,
pelo menos alguns de nós, desejaríamos. Sim, são questões complexas; sim, há
tanto por fazer. Mas há opções também, há prioridades e, acima de tudo, há a
obrigação de cuidarmos do nosso público, incluindo dos visitantes negros.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Houve nesta troca de opiniões mais recente os argumentos do
costume: “não vamos apagar a história”, “as pessoas entendem o contexto em que
a obra foi criada”, “censura”… E outro ainda: “Se mudássemos esta tabela
teríamos de as mudar todas” ou “Vamos mudar quando tivermos a oportunidade de
as rever todas”. Arrisco-me a dizer que quem usou estes argumentos não tem
acompanhado minimamente os desenvolvimentos e a reflexão dos últimos oito anos,
pelo menos, desde que em 2015 o Rijksmuseum foi o primeiro a tomar a iniciativa
de rever títulos e interpretações. Não o fez apagando a história; e eu soube
graças ao seu trabalho que a maioria dos títulos das obras não é atribuída
pelos próprios artistas. Não podemos continuar a argumentar sem procurarmos
consultar a informação e a ampla bibliografia que já existe. Não podemos
continuar a argumentar fechados numa bolha, sem conhecimento.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Não sei quanto custará exactamente produzir uma tabela
nova, mas acho que se deve mudar com urgência e, se for necessário, apenas esta,
sim! No mínimo, para acrescentar – tal como fez num caso a Ferens Gallery em
Hall – “Título atribuído pelo artista”. Seria o mínimo e seria um sinal da
parte do museu para os seus visitantes. Seria melhor ainda um parágrafo de
contextualização, escrito pelo museu. Gostei muito do texto no painel
introdutório da exposição temporária <a name="_Hlk136871415"></a><a href="https://www.quaibranly.fr/en/exhibitions-and-events/at-the-museum/exhibitions/event-details/e/ouvrir-lalbum-du-monde"><span style="mso-bookmark: _Hlk136871415;"><b>“Photographs: an early album of the world”</b></span><span style="mso-bookmark: _Hlk136871415;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136871415;"></span>,
no museu Quai Branly e a forma como lida com a terminologia. Mas, sobretudo, o
facto de comunicar as suas opções ao visitante e de se mostrar consciente das
suas responsabilidades.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Uma tabela nova para a obra de Soares dos Reis permitiria também
rever a tradução do título. Porque, como apontaram duas colegas, a tradução está
errada. Em inglês seria “Head of a negro”, o que permitiria, talvez, entender a
gravidade no uso da palavra “preto” em português sem qualquer comentário da
parte do museu. A tradução (concretamente, a revisão por especialistas, porque
os tradutores não o são necessariamente) é de enorme importância. Lembro-me do
choque que senti quando reparei pela primeira vez que a tradução de “Coleira de
escravo” na exposição do Museu Nacional de Arqueologia “Um museu, tantas colecções!”
(2017) era “necklace”. Temos a obrigação de cuidar, dos objectos e das pessoas.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">No ano passado, numa visita à Casa-Museu Marta Ortigão
Sampaio, no Porto, vi os “vestígios” de um projecto educativo realizado com uma
escola. Por baixo da pintura de Aurélia de Souza intitulada “Cabeça de homem preto”,
estava registado o desconforto de um/a aluno/a: <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">“O meu desconforto foi por ele ser o único a ser descrito
pela cor da sua pele.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Ao lado da obra, a tabela do museu, onde a palavra “preto/negro”
tinha sido apagada com corrector. Arrepiei-me com este gesto. Achei bem que a
tabela tivesse ficado assim na parede, com as marcas da intervenção do século
21. <a href="https://museudoporto.pt/peca-colecao/estudo-de-figura-cabeca-de-homem/"><b>No
website do museu</b></a>, o título é “Cabeça de homem” (suponho que não tenha sido
a própria Aurélia a atribuir o título anterior).<o:p></o:p></span></span></p>
<div style="text-align: center;"><iframe frameborder="0" height="400" marginheight="0" marginwidth="0" scrolling="no" src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/5a7Xjdfjhd98uk?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476"></iframe></div>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Sente-se uma inércia no mundo dos museus portugueses, é
como se a maioria de nós estivesse a esconder a cabeça na areia. Conhecendo as
dificuldades, as complexidades, a falta de meios, sabemos também que todos os
dias são definidas prioridades, tomadas decisões, feitos investimentos. Cuidar
das pessoas, tão bem como cuidamos dos objectos, é uma prioridade, uma
urgência. Sermos relevantes é, no mínimo, uma questão de sobrevivência.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Ainda neste blog</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2022/06/quem-tem-medo-da-descolonizacao.html">Quem
tem medo da descolonização?</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2019/12/lisboa-plural.html">Lisboa
plural</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2018/06/discutindo-descolonizacao-dos-museus.html">Discutindo
a descolonização dos museus portugueses</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Outras leituras</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a name="_Hlk136867836"></a><a href="https://www.publico.pt/2016/02/12/culturaipsilon/noticia/nao-queremos-um-museu-so-para-brancos-1722839"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867836;"><span style="line-height: 150%;">Não queremos um museu só para brancos</span></span><span style="mso-bookmark: _Hlk136867836;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136867836;"><span style="line-height: 150%;"><o:p></o:p></span></span></b></span></p>
<span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><span style="mso-bookmark: _Hlk136867836;"></span>
</b></span><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 150%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://www.publico.pt/2022/08/29/culturaipsilon/opiniao/podemos-esperar-dirige-museu-2018461">O
que podemos esperar de quem dirige um museu?</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a name="_Hlk136867849"></a><a href="http://canadianart.ca/features/offensive-terminology-in-artwork-titles/"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 150%;">Offensive
Artwork Titles in Canadian Museums: What’s in a Name?</span></span><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 150%;"><o:p></o:p></span></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; mso-outline-level: 1;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"></span><a href="https://hyperallergic.com/263180/why-the-rijksmuseum-is-removing-bigoted-terms-from-its-artworks-titles/"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 150%;">Why the Rijksmuseum Is Removing Bigoted Terms from Its Artworks’ Titles</span></span></a></b></span></p><p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; mso-outline-level: 1;"><a href="https://hyperallergic.com/304385/danish-national-gallery-removes-the-word-negro-from-13-artworks-titles/" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="font-size: x-small; line-height: 150%;"><b>Danish National Gallery Removes the Word “Negro” from 13
Artworks’ Titles</b></span></span></a></p><p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; mso-outline-level: 1;"><a href="https://www.theguardian.com/artanddesign/jonathanjonesblog/2015/dec/15/artworks-racist-titles-rijksmuseum-amsterdam" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="font-size: x-small; line-height: 150%;"><b>Young Negro Girl: should artworks with offensive names get
an update?</b></span></span></a></p><p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; mso-outline-level: 1;"><a href="https://www.rijksmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/past/rijksmuseum-and-slavery" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="font-size: x-small; line-height: 150%;"><b>Rijksmuseum and slavery</b></span></span></a></p><p class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; mso-outline-level: 1;"><a href="https://hyperallergic.com/439716/can-art-museums-help-illuminate-early-american-connections-to-slavery/" style="font-family: verdana;"><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"><span lang="EN-GB" style="font-size: x-small; line-height: 150%;"><b>Can art museums help illuminate early American connections
to slavery?</b></span></span></a></p>
<span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><span style="mso-bookmark: _Hlk136867849;"></span>
</b></span><h1 style="background: white; margin: 0cm; vertical-align: baseline;"><span lang="EN-GB" style="color: #121212; font-weight: normal;"><o:p><span style="font-family: verdana; font-size: small;"> </span></o:p></span></h1>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-37596741377960622732023-05-14T10:09:00.005+01:002023-05-14T13:04:35.008+01:00E amanhã, o que acontece?<p> </p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhjO6zIz1zNykYq_WX2DAx-aWu4OR9JSFy4n8wqgIDmVaVbqHYu3Aex11sopvE7By_fHd9JJpAcgXPF6hI82E6N1fKEZhVe0qHWPPofkOdQGXD1-yLD2U_Uy7oQpZfJfbZ7VNqhA08gpK81Q22k6tQ7WrcqAwAp9tPRTicQj1Kd1ZPUcYJVqzMpcm9IKg/s500/ovar%201_s.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="271" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhjO6zIz1zNykYq_WX2DAx-aWu4OR9JSFy4n8wqgIDmVaVbqHYu3Aex11sopvE7By_fHd9JJpAcgXPF6hI82E6N1fKEZhVe0qHWPPofkOdQGXD1-yLD2U_Uy7oQpZfJfbZ7VNqhA08gpK81Q22k6tQ7WrcqAwAp9tPRTicQj1Kd1ZPUcYJVqzMpcm9IKg/s16000/ovar%201_s.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Último dia do projecto "Esta Máquina Cerca o Ódio e Força-o a Render-se" <br />em Ovar (2022)</td></tr></tbody></table><br /><p></p><p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Em 2022, tive a felicidade de participar num projecto muito
bonito da ondamarela, chamado </span><b><a href="https://ondamarela.pt/pt/emcofr/"><span style="line-height: 107%;">”Esta
Máquina Cerca do Ódio e Força-o a Render-se</span></a><span class="MsoHyperlink"><span style="line-height: 107%;">”</span></span></b><span style="line-height: 107%;">. Era
um projecto que propunha a pessoas de diferentes idades em diferentes
localidades do país abordar as questões do ódio, do preconceito, da diferença e
da liberdade através de novas criações artísticas, construídas com essas mesmas
pessoas. No último dia do projecto, discutíamos o que tinha sido esta
experiência para os diferentes participantes. Penso muitas vezes numa
adolescente numa dessas rodas de conversa. Quando disse “Os artistas vão-se
embora hoje, o projecto acaba. O que acontece amanhã?”, ela murmurou: “Amanhã vai
ser um dia triste.”<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Lembrei-me novamente dela no mês passado, no encontro </span><a href="https://www.comediasdominho.com/portfolio/encontro-mutante/"><span style="line-height: 107%;"><b>Mutante</b></span></a><span style="line-height: 107%;"><b> </b>das
Comédias do Minho. Este encontro foi o culminar do </span><a href="https://www.comediasdominho.com/projeto-mutantes/"><span style="line-height: 107%;"><b>Projecto
Mutantes</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, que procurou envolver jovens dos 12 aos 18 anos que
habitam os 10 municípios do Alto Minho numa reflexão, através das artes, sobre
o ‘eu’, o ‘outro’ e o ‘nós’. Nos três dias em que profissionais da cultura e da
educação estiveram reunidos, quinze jovens que tinham participado nas oficinas
do projecto trabalharam intensamente com a coreógrafa Joana Castro na
construção de uma performance, apresentada no último dia. Vimos e ouvimos
jovens sensíveis, atentos, sinceros, esperançosos, mas também angustiados, e
sentimos que, ao longo desses três dias de trabalho, criou-se uma ligação muito
forte, e muito comovente, entre eles, que antes não se conheciam. Na conversa
que se seguiu, perguntei: “E amanhã, o que acontece?”. Vários responderam:
“Amanhã há escola.”<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiDMlsVxh2BfVt1UYcNd-6E4O5FmbxxtgG7I-YQJ7k8bgKgVMNgiHIxLFjDI_AZYHwe9nCMvMINuedKE3Z_8vnZL_He7RuAE6HTGELF6kK9EKNhcz4vTuaWzHL6qVHkrgiu3rHLPaW_54D_mdzvifRwEgXjvfOMyTGwkS0aq7aYd5YI9UKf-jX1tXtyww/s500/mutantes_s.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiDMlsVxh2BfVt1UYcNd-6E4O5FmbxxtgG7I-YQJ7k8bgKgVMNgiHIxLFjDI_AZYHwe9nCMvMINuedKE3Z_8vnZL_He7RuAE6HTGELF6kK9EKNhcz4vTuaWzHL6qVHkrgiu3rHLPaW_54D_mdzvifRwEgXjvfOMyTGwkS0aq7aYd5YI9UKf-jX1tXtyww/s16000/mutantes_s.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Último dia do encontro Mutante em Paredes de Coura</span><span style="font-family: "Times New Roman";"> (2022)</span></td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O fim formal de um projecto parece constituir mesmo um fim
para muitas das pessoas que nele participaram. Não parece haver um
prolongamento nas suas vidas, não parece haver vontade ou capacidade ou,
talvez, imaginação para a sua continuidade na “vida real”. Talvez as pessoas
(não só as mais jovens) não se imaginem capazes de mudar algo que o projecto as
fez reconhecer que precisava de ser mudado. E apesar de muitos dos projectos
terem como objectivo o empoderamento ou a promoção da participação cívica,
existe uma cultura política que convence muitas pessoas que não vale a pena
imaginar, não vale a pena tentar, não vale a pena preocupar-se e agir. Existe
uma cultura de impossibilidade.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">As artes e a cultura não têm por si o poder de trazer
mudanças na vida pessoal e colectiva das pessoas. Quem a elas se expõe e com
elas se envolve recebe alimento, mas não se torna automaticamente numa pessoa
mais activa, mais imaginativa ou, sequer, numa pessoa melhor. Dito isto, fico
muitas vezes a pensar no que poderia ser feito para haver uma ligação com “o
amanhã” e para se criar uma cultura onde as pessoas se possam sentir incluídas,
empoderadas, importantes e necessárias, cuidadas, donas da sua cabeça e da sua
vida.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiH5iJMh17PsgfSHBSvvc2sfa1tywsnNsGs2HPCjfXFNM9-HZliOUWZKDlfdFBJk6-7Ev63QV5m2osW9adGc2qQfW8zofDERR4eMGDwBCnJvQGZ-e9KL1xKk9hMiSabtNDzWeNCkEZT5TQ3SZt-VUqhMHb8_7ND5AXMB2cIcvPVO8U-pf6yeOXNMkYf5g/s500/tropen%201.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="345" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiH5iJMh17PsgfSHBSvvc2sfa1tywsnNsGs2HPCjfXFNM9-HZliOUWZKDlfdFBJk6-7Ev63QV5m2osW9adGc2qQfW8zofDERR4eMGDwBCnJvQGZ-e9KL1xKk9hMiSabtNDzWeNCkEZT5TQ3SZt-VUqhMHb8_7ND5AXMB2cIcvPVO8U-pf6yeOXNMkYf5g/s16000/tropen%201.jpg" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhpi285sD7V_w2Na_IgLvwa2gYDXUXH9c7X3n15uwyBGQfUl-wlBnrP3SF71-9x9fGggvfmtPVeGlUKGQyDI75_U4cR8tK7_d_uEWkFZnUojmpxfP7PCdMmuJqI-qnOWiFb6CECSBK3NaoTsV6WCsWPxsXB-mV53DIA1fg_KLeuB8tsfkt3Bx-EX_blDA/s500/tropen%202.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="288" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhpi285sD7V_w2Na_IgLvwa2gYDXUXH9c7X3n15uwyBGQfUl-wlBnrP3SF71-9x9fGggvfmtPVeGlUKGQyDI75_U4cR8tK7_d_uEWkFZnUojmpxfP7PCdMmuJqI-qnOWiFb6CECSBK3NaoTsV6WCsWPxsXB-mV53DIA1fg_KLeuB8tsfkt3Bx-EX_blDA/s16000/tropen%202.png" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Quando em Outubro passado estive no Tropenmuseum em
Amsterdão, tive a oportunidade de visitar a nova exposição </span><a href="https://www.tropenmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/our-colonial-inheritance"><span style="line-height: 107%;"><b>”Our
Colonial Inheritance”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> (A nossa<span style="mso-spacerun: yes;">
</span>herança colonial). O museu, que nos habituou a uma atitude corajosa e
frontal em relação ao seu próprio passado e o passado e presente do país, também
desta vez não nos decepcionou. Mas o que gostaria de realçar aqui é o que
acontece quando chegamos ao final da exposição. Antes de entrarmos na última
sala, lemos num painel: “Como é que se pode envolver? Escolha a forma que mais
lhe convém”. Somos, então, convidados a conhecer diferentes pessoas que
decidiram agir para a construção de um mundo melhor e mais justo. As formas de
o fazer foram diferentes e isto transmite a ideia que há algo que cada um de
nós pode fazer, à sua maneira; que não somos nem pequenos nem impotentes
perante grandes causas e problemas. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Penso também na minha primeira visita, em Março passado, à </span><a href="https://kazernedossin.eu/en/"><span style="line-height: 107%;"><b>Kazerne Dossin</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, um
museu-memorial ao Holocausto na cidade belga de Mechelen. Houve três coisas que
me fizeram pensar no papel que um museu pode ter no empoderamento das pessoas e
na promoção da cidadania activa:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Na exposição temporária </span><a href="https://kazernedossin.eu/en/expo/temporary-exhibition-homosexuals-and-lesbians-in-nazi-europe/"><span style="line-height: 107%;"><b>“Homosexuals
and lesbians in Nazi Europe”</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> (Homossexuais e lésbicas na
Europa Nazi), a História ganha uma escala mais humana, mais próxima, menos
abstracta, através das histórias pessoais de diferentes pessoas que sofreram
discriminação e perseguição, que morreram ou que sobreviveram. <o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiamBiWmCqn9eB5iP6i5QBAZ1Mq1r8ZMREHMh1L-spG2jTSBunJxA01vSGrc4hTMTarQ-6HmVsREpFhtVlA8w_l7TGfCTwvB72dOYcDWI-XxN5lMfh4KoSA68gwn1xgYT0j1hZSo5iTIUYXWbMmYg312kRolfKqY-vIWB3uDg415hIq4aGYkzEJtYMJkQ/s500/mechelen%200.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiamBiWmCqn9eB5iP6i5QBAZ1Mq1r8ZMREHMh1L-spG2jTSBunJxA01vSGrc4hTMTarQ-6HmVsREpFhtVlA8w_l7TGfCTwvB72dOYcDWI-XxN5lMfh4KoSA68gwn1xgYT0j1hZSo5iTIUYXWbMmYg312kRolfKqY-vIWB3uDg415hIq4aGYkzEJtYMJkQ/s16000/mechelen%200.png" /></a></span></div><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://kazernedossin.eu/en/expo/permanent-collection/"><span style="line-height: 107%;"><b>Na
exposição permanente</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, apresentada em três capítulos distribuídos
por três andares (Massas, Medo, Morte), o museu inclui a resistência ao regime
dos ocupantes Nazi, às vezes através de episódios cómicos, mas vindos de
pessoas comuns, funcionários públicos que tinham, provavelmente, tanto medo
como todas as outras pessoas.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipVghyxbjpi4H1S8QfF5NIpyFobCqtkMnnOg4AxrWQPk27ySOUzbDHwL6X165kfi9oLEz5ixbOkGJbRQ2BGkxgL59rpQgRBOPfn4IA6Ikdf3iza5wL2GFjHFsXrfiy6TrSvNDSw94ZSifgkMAUAfRqOsAMEx8nl2Uv5zU0sw2FGrOR5obVmILWIAd0cQ/s587/mechelen%201.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="587" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEipVghyxbjpi4H1S8QfF5NIpyFobCqtkMnnOg4AxrWQPk27ySOUzbDHwL6X165kfi9oLEz5ixbOkGJbRQ2BGkxgL59rpQgRBOPfn4IA6Ikdf3iza5wL2GFjHFsXrfiy6TrSvNDSw94ZSifgkMAUAfRqOsAMEx8nl2Uv5zU0sw2FGrOR5obVmILWIAd0cQ/s16000/mechelen%201.png" /></a></span></div><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">No final de cada capítulo, antes de seguirmos para o andar
seguinte, o museu interpela-nos com a actualidade. Isto não são histórias
passadas, estão sempre presentes. “Imigração e refugiados na Europa hoje” ou
“Quando o Estado começa a discriminar” são questões actuais, das pessoas ao
lado ou de nós próprios.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhJz4X07pSDuE8IhcQzSSxPheB4KK9pQo4CJxRHz2F7mDK79FH5KqZ-H2k8gnIPfpiNj_7m_7u2I6mW9MNMWaj-1BwVMO-pOTnajV0M2DKnF21QhmmPvnBB_aNYHmP2vKJyNMKC6xRbDhBel5nFblDMFMmIVwd74m6ixLRQfdO39gwD2cWN9xWtA2-Cwg/s500/mechelen%202.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhJz4X07pSDuE8IhcQzSSxPheB4KK9pQo4CJxRHz2F7mDK79FH5KqZ-H2k8gnIPfpiNj_7m_7u2I6mW9MNMWaj-1BwVMO-pOTnajV0M2DKnF21QhmmPvnBB_aNYHmP2vKJyNMKC6xRbDhBel5nFblDMFMmIVwd74m6ixLRQfdO39gwD2cWN9xWtA2-Cwg/s16000/mechelen%202.png" /></a></div><br /><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O sentimento de impotência, o sentimento de impossibilidade
de mudança é algo que se cultiva entre os cidadãos, algo que se torna cultura. A
Joana Villaverde registou-o de uma forma que me marcou no seu artigo <a href="https://www.publico.pt/2020/08/21/culturaipsilon/noticia/vidas-interior-importam-1928572"><b>“As
vidas do interior importam”</b></a>, escrito em 2020 em Avis, no Alentejo. Acredito
que este sentimento ganha força porque as pessoas se sentem também sozinhas,
quando, na verdade, não o estão. O trabalho da <a href="https://commoncausefoundation.org/_resources/"><b>Common Cause Foundation</b></a>
tem sido fundamental no sentido de mostrar como a maioria das pessoas, a
maioria de nós, abraça valores intrínsecos, altruístas, mas está convencida que
não acontece o mesmo com os outros. O seu estudo de 2016 <a href="https://commoncausefoundation.org/wp-content/uploads/2021/10/CCF_survey_perceptions_matter_full_report.pdf"><b>“Perceptions
Matter”</b></a>, que focava a população britânica, indicou que, enquanto 74% dos
inquiridos valorizava, por exemplo, a entreajuda, a igualdade, a proteção da
natureza, 77% acreditava que os outros só se interessam por valores egoístas,
como a riqueza, a imagem pública e o sucesso. Será muito diferente por aqui?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Vivemos mais próximo e, ao mesmo tempo, mais afastados.
Cuidamos dos nossos e ignoramos os outros. Desconfiamos daqueles que não
conhecemos, não amamos quem não conhecemos. Talvez, um possível caminho seja
mesmo por aqui: procurarmos formas de tornar mais evidente, numa escala mais
pequena, mais próxima, mais humana, que não estamos sozinhos, que partilhamos
valores, que nos preocupamos, que nos temos uns aos outros. Que o amor e a
esperança não acabam quando o projecto acaba.</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-89333999191106647322023-04-15T12:27:00.003+01:002023-04-15T12:28:14.813+01:00Liberdade para quê? Cultura para quê?<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5BiBWd2lXwWZ4aLCsLLrl3RM0CO5jAkRix4A9mhZ0o70ilchupWCFKa3OjjwLV68hcDK3kzN53DK0YrQVRfTBI-pnNo279_8bEoiyBxReSx4TpTVlsGDyKYeHsiG-6oS3dHZTPAJ0KPP4k30Tbu4Dy6Ugtu2whHOR-VVtf2thQ58pf2zvcHm8MzAkig/s500/coimbra_500px.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="273" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5BiBWd2lXwWZ4aLCsLLrl3RM0CO5jAkRix4A9mhZ0o70ilchupWCFKa3OjjwLV68hcDK3kzN53DK0YrQVRfTBI-pnNo279_8bEoiyBxReSx4TpTVlsGDyKYeHsiG-6oS3dHZTPAJ0KPP4k30Tbu4Dy6Ugtu2whHOR-VVtf2thQ58pf2zvcHm8MzAkig/s16000/coimbra_500px.png" /></a></div><br /><p></p><p><span style="font-family: verdana;">A minha palestra na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, no dia 13 de Abril de 2023, no âmbito do ciclo "Portugal - 50 anos (1973-2023): O que mudou? O que falta fazer?". Pode ser lida <a href="https://musingonculturextra.blogspot.com/2023/04/liberdade-para-que-cultura-para-que.html" target="_blank"><b>aqui</b></a>.</span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-33985061985088617652023-01-01T17:22:00.001+00:002023-01-01T17:22:05.332+00:00O ano do cuidado radical<p></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi0rcKBpXtcklrRhDbeG_y_kP6d3huHNwBHz9VLkicCKp7Ii0x5ugeFP-5E_ZZuQzlANO862NPDctrk55PDve_7ufNhS6Ia1xaQ3_51i8PRNiVopt34lWCFQna1ZXfBszGGKSAIRK_-GcFNVsGOjudhXOWFEQdbDG22MOxYZE5cgbLh7xv0Rt2aCPt-dA/s500/partridge_2014_s.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi0rcKBpXtcklrRhDbeG_y_kP6d3huHNwBHz9VLkicCKp7Ii0x5ugeFP-5E_ZZuQzlANO862NPDctrk55PDve_7ufNhS6Ia1xaQ3_51i8PRNiVopt34lWCFQna1ZXfBszGGKSAIRK_-GcFNVsGOjudhXOWFEQdbDG22MOxYZE5cgbLh7xv0Rt2aCPt-dA/s16000/partridge_2014_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Perdiz no Cabo Sounio, 2014 (Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><br /><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Há pouco mais de dez anos, lembro-me da
indignação que senti com um artigo de Clara Ferreira Alves no jornal Expresso,
onde criticava os jovens gregos por se casarem quando o país atravessava uma
grave crise económica. Considerava essa atitude irresponsável, reveladora de
uma falta de noção. Fiquei com raiva porque, no meu ver, a esperança e a
celebração são formas de resistir. A determinação de celebrar perante uma
adversidade é um acto de amor, amor pela vida, amor próprio e amor pelos
outros.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pensei nisso em diversas outras ocasiões e
também ontem à noite, quando vi o fogo de artifício da minha janela e em muitos
outros lugares do mundo. Nunca gostei muito do fogo de artifício, sempre me
pareceu uma extravagância desnecessária e, também, provocadora de um barulho
angustiante para várias pessoas e animais. Mais recentemente, descobri os seus
efeitos poluentes. Mas este ano, senti que o seu som “explosivo” era também uma
expressão da nossa falta de empatia, pois os ucranianos, enquanto celebravam também
a chegada do novo ano (um acto de amor, esperança e desafio), foram mais uma
vez atacados e tiveram que correr para os abrigos.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Uma das esperanças que a pandemia despertou em
mim foi que desenvolveríamos firmemente a capacidade da empatia, que seria algo
que ficasse connosco. Actos de cuidado e preocupação, especialmente por pessoas
que não conhecíamos, tornaram-se mais comuns. A própria palavra “cuidar” foi (e
é) cada vez mais utilizada, tanto no âmbito pessoal como profissional. Ainda
assim, uma das minhas observações nos últimos meses foi que voltámos a concentrar-nos
totalmente em nós próprios, vemos tudo como uma competição, onde mais direitos
para uma outra pessoa significa menos direitos para nós. Esta falta de empatia
e cuidado, associada a uma tentativa bastante infantil de não assumir a
responsabilidade por coisas que correm mal ou menos bem, é uma atitude que se
manifesta com frequência e que tem marcado as nossas relações, inclusivamente
no âmbito profissional.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Outra constatação que tenho feito é o crescente
autoritarismo no campo cultural, tanto da parte de alguns dos seus
profissionais, como da parte de políticos que têm uma palavra sobre a gestão do
sector. Vejo quem tem “poder” a exigir ser apenas lisonjeado e elogiado, não
deixando espaço para críticas e debates saudáveis e, em algumas ocasiões,
questionando a sua legitimidade e tentando desacreditar aqueles que expressão o
seu espírito crítico. Vejo-os tomar decisões arbitrárias, tratar as pessoas com
arrogância, hostilidade e desrespeito, sentir-se no direito de se recusar a
responder a perguntas ou a justificar as suas escolhas. Por um lado, isso não é
novidade, é tão antigo quanto a política; por outro, é um desenvolvimento
preocupante, considerando o que passámos e aprendemos como colectivo nos
últimos anos. Assim, precisamos de estar mais atentos, não apenas à
generalização dessas práticas, mas também às maneiras através das quais nós próprios
as apoiamos – por exemplo, permanecendo em silêncio ou sentindo-nos com medo e impotentes,
como se tudo isto fosse algo inevitável.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Uma terceira observação, relacionada com as
duas anteriores – e, em alguns casos, fruto delas -, é o estado de saúde mental
dos profissionais da cultura, <b><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.com/2022/10/a-saude-mental-dos-profissionais-dos.html" target="_blank">sobre o qual escrevi pela primeira vez em Outubro passado</a></b>.
O crescente espírito competitivo, o ritmo louco com que produzimos
(simplesmente produzimos), o autoritarismo e abuso de poder, a falta de empatia
e solidariedade, têm resultado em depressão profunda, baixas médicas, algumas
demissões e um mau-estar generalizado.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">No seu livro “Caring Democracy”, Joan Tronto
questiona: “Como é que as pessoas podem afirmar que vivem numa democracia se os
seus medos e inseguranças começam a sobrepor-se à sua capacidade de agir pelo
bem comum?”. Tronto afirma que o actual “déficit de cuidado” e o actual
“déficit democrático” estão relacionados entre si. Escreveu isso em 2013, então,
só podemos confirmar que esses dois déficits se agravaram na última década. Não
lhes demos atenção suficiente e à sua co-relação.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Com o início deste novo ano, e embora as coisas
pareçam bastante sombrias, sinto a necessidade de aceitar mais uma vez o
desafio de esperar, de sonhar. Este ano deve ser o ano do cuidado radical. “O
que nos torna livres, na verdade”, escreveu Tronto, “é a nossa capacidade de
cuidar e de assumir compromissos com aquilo com que queremos preocupar-nos”. Preocupo-me
com a liberdade, o direito de cada pessoa de ser inteira, de ser o melhor que
pode. Preocupo-me com a inteligência, o pensamento crítico e a honestidade
intelectual, assim como com a sua expressão pública. Preocupo-me com os meus
colegas, com o que pensam, fazem e sentem. Preocupo-me com as pessoas que
conheço e com as que não conheço. Preocupo-me e quero preservar a liberdade de
o fazer.</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-35070015429266092702022-12-03T20:54:00.005+00:002022-12-08T17:42:10.242+00:00É mesmo tão difícil de compreender?<p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiD6VT-xnR0ZjWzSuLWL5Gj-IET747l6Pcale4rXh_TP6eb_hNE9H0Hf_IFDlmFBQ2ldlpbQ_p1rPDgSzP028U19YG3shpdHv3yHgJ5hO1D86FI4rr6eW-_ZccRp92dC-0vZm7ptlg1YSgOG8Vh8Dkvshk6Dd8DQHrL0LV5V73ZA4RQJfhgWlbTCOm0fQ/s500/Just%20Stop%20Oil%20photo%20on%20NYT_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiD6VT-xnR0ZjWzSuLWL5Gj-IET747l6Pcale4rXh_TP6eb_hNE9H0Hf_IFDlmFBQ2ldlpbQ_p1rPDgSzP028U19YG3shpdHv3yHgJ5hO1D86FI4rr6eW-_ZccRp92dC-0vZm7ptlg1YSgOG8Vh8Dkvshk6Dd8DQHrL0LV5V73ZA4RQJfhgWlbTCOm0fQ/s16000/Just%20Stop%20Oil%20photo%20on%20NYT_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto: Justo Stop Oil via The New York Times</td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;">“Museus apertam vigilância preocupados com ações de ‘terrorismo’
ambientalista contra arte”. <b><a href="https://www.tsf.pt/portugal/cultura/museus-apertam-vigilancia-preocupados-com-acoes-de-terrorismo-ambientalista-contra-arte-15320973.html" target="_blank">Não sei se foi a palavra “terrorismo” no título</a></b></span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"> que
me chocou mais ou as próprias respostas dadas ao jornalista por diferentes
directores de museus portugueses. Respostas que revelam total distanciamento da
questão da emergência climática e do papel e impacto que os museus têm sobre
ela. Fiquei estupefacta quando o director de um museu nacional afirmou que
tinha “alguma dificuldade em perceber o que os museus e as obras de arte têm a
ver com este tipo de protesto ambientalista” e que “Está relacionado com a
questão do petróleo e da poluição, mas as obras de arte não têm culpa nenhuma.
São ações mediáticas, mas é difícil de perceber porque têm as obras de arte de
pagar por isto.” Um outro director de um museu nacional disse que considera estas
ações preocupantes porque os museus “guardam, restauram e exibem coleções
únicas no mundo, [que] estes casos são ‘preocupantes’ para estes espaços
culturais, porque "colocam em risco um património que é de todos" e que
"deve ser protegido para as atuais e futuras gerações" (essas
palavras não serviriam perfeitamente para discutir o nosso património natural e
a nossa obrigação para com as gerações futuras?).<span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pode-se pensar que talvez o jornalista não tenha feito
perguntas que iam além dos actos dos activistas, por isso os directores de
museus também não falaram sobre o impacto que os museus estão tendo nas
mudanças climáticas e o que os seus museus estão, de facto, a fazer a esse
respeito. Acho, no entanto, que se esse fosse o caso – isto é, se eles tivessem
conhecimento e informações para partilhar – te-lo-iam feito, mesmo sem serem questionados
directamente; teriam tomado uma posição.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Dias após a publicação dessas entrevistas, que não causaram
qualquer reacção especial no país e no mundos dos museus, <b><a href="https://icom-deutschland.de/de/nachrichten/564-statement-attacks-on-artworks-in-museums.html" target="_blank">o ICOM Alemanha publicou um comunicado</a></b></span><span style="line-height: 107%;">,
assinado por mais de 90 directores de museus a nível internacional, que essencialmente
diz o seguinte: “Os activistas responsáveis por eles subestimam severamente a
fragilidade desses objectos insubstituíveis, que devem ser preservados como
parte de nosso património cultural mundial. Como os directores de museus estão
frustrados com a preservação dessas obras, ficamos profundamente abalados com o
seu risco de extinção”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Jasmine Liu, da Hyperallergic, respondeu com um artigo
muito apropriadamente intitulado <b><a href="https://hyperallergic.com/778967/museum-leaders-deeply-shaken-by-climate-protests/" target="_blank">“À medida que o mundo arde, líderes de
museus 'profundamente abalados' com protestos climáticos”</a></b></span><span style="line-height: 107%;">.
Escreveu: “O mundo está a aproximar-se de uma catástrofe climática, com gases
de aquecimento a atingir recordes e com os especialistas a alertar sobre
mudanças ‘irreversíveis’ no nosso meio ambiente. Perante este cenário, proeminentes
líderes de instituições de arte divulgaram uma declaração indicando que estão
“profundamente abalados” – não pelo alarmante aquecimento do planeta,
necessariamente, mas pelos recentes protestos climáticos que colocam em perigo
a arte”. Ela tem, razão. Os directores de museus estarão, assim, tão alienados?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Alguns dias depois, Hakim Bishara, ainda mais irónico,
perguntava <b><a href="https://hyperallergic.com/779372/museum-directors-do-you-need-a-hug/" target="_blank">“Directores de museus, precisam de um abraço?”</a></b></span><span style="line-height: 107%;">, <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>identificando uma causa essencial para estas
declarações embaraçosas: uma inconfundível falha de liderança. “O maior
problema aqui”, escreveu, “é que esses directores de museus têm um entendimento
extremamente limitado das suas funções. Nas suas próprias palavras, a
responsabilidade primária do museu reside em “coleccionar, estudar, partilhar e
preservar” o património cultural. Não, precisamos que vocês façam mais do que
isso. Precisamos que os directores de museus se tornem verdadeiros líderes
culturais, que saibam como identificar e abordar os problemas mais prementes da
sociedade e envolver-se activamente na sua resolução. Peço-vos que parem de
pensar como cuidadores e comecem a actuar como agentes de mudança. Comecem a
representar a vossa comunidade, não apenas o vosso conselho de administração.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><b><a href="https://www.museumsassociation.org/museums-journal/news/2022/11/icom-says-it-shares-climate-activists-concerns-but-condemns-art-attacks/" target="_blank">Numa declaração publicada a 18 de Novembro</a></b></span><span style="line-height: 107%;">, o ICOM
– Conselho Internacional dos Museus parecia ter conseguido equilibrado um pouco
melhor as coisas. Quis “reconhecer e partilhar as preocupações expressas pelos
museus em relação à segurança das colecções e as preocupações dos activistas
climáticos, pois enfrentamos uma catástrofe ambiental que ameaça a vida na
Terra”. Disse também que “os museus são actores-chave na condução da acção
climática e devem ser vistos como aliados no movimento climático”. É verdade,
mas é preciso mais do que palavras. Os museus não podem e não devem ser vistos
como “aliados” enquanto não tomarem nenhuma atitude e aparentarem não ter a
menor noção ou verdadeira preocupação com a emergência que estamos já a viver. Dias depois, <b><a href="https://www.artnews.com/art-news/news/italy-climate-protests-admission-fees-museums-1234647374/#new_tab" target="_blank">o Ministro da Cultura italiano, Gennaro Sangiuliano, afirmava</a></b> descaradamente: “Tendo em conta o enorme património a proteger, a intervenção [de reforço da segurança e protecção das obras] representará um custo considerável para os cofres do ministério e de toda a nação. Infelizmente, só posso prever um aumento no custo do ingresso". Quão desavergonhado um político pode ser?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">A NEMO - Network of European Museum Organizations – no meu
ver, uma das organizações mais relevantes na sector – <b><a href="https://youtu.be/o9aibEVE42U?t=1" target="_blank">realizou recentemente umwebinar</a></b></span><span style="line-height: 107%;">, onde
apresentou os resultados do seu <b><a href="https://www.ne-mo.org/fileadmin/Dateien/public/Publications/NEMO_Report_Museums_in_the_climate_crisis_11.2022.pdf" target="_blank">inquérito sobre os museus na crise climática</a></b></span><span style="line-height: 107%;"> e as suas
recomendações. Vejamos:</span></span></p><p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="font-family: verdana; text-indent: -18pt;">8 em cada 10 museus afirmaram reflectir os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nos seus planos estratégicos (sendo
o ODS13 “Tomar medidas urgentes para combater as mudanças climáticas e os seus
impactos”). NEMO comentou sobre isso, afirmando que a narrativa tem sido muitas
vezes que o património cultural e as instituições de património cultural são
algo a ser protegido, mas muitas vezes não consideram como as instituições
culturais podem contribuir na criação de soluções e no apoio à transição
sustentável;</span></li><li><span style="font-family: verdana;">1 em cada 4 museus trabalha com critérios
internos ou com uma rede de avaliação externa para medir os seus esforços
sustentáveis;</span></li><li><span style="font-family: verdana;">1 em cada 10 museus está consciente das
políticas climáticas locais/regionais ou nacionais que falam deles ou que os abordam;</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Menos de 1 em cada 10 museus concluiu uma
análise sobre os desafios associados às mudanças climáticas na sua região;</span></li><li><span style="font-family: verdana;">2 em cada 3 museus não têm conhecimento
suficiente sobre os ODS e acção climática na sua organização;</span></li><li><span style="font-family: verdana;">1 em cada 10 museus faz parte de uma rede
cultural que se concentra nas mudanças climáticas.</span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Quando várias pessoas de meia-idade dizem aos jovens activistas
que existem “melhores maneiras de protestar” e recomendam mais informação e
educação (os cientistas têm, na verdade, tocado a campainha sobre a mudança
climática desde o início dos anos 90, quando as pessoas de meia-idade hoje tinham
os seus 20 anos…), o que têm a dizer sobre todo um sector cultural que expressa
ignorância e quase total falta de acção? Não deveríamos sentir-nos
envergonhados e profundamente responsáveis, em vez de chamar aos activistas de
“terroristas”?</span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Não é que não haja conhecimento e iniciativas concretas no sector
dos museus, se queremos combater a nossa ignorância e contribuir para o combate
às alterações climáticas. No webinar da NEMO, Henry McGhie da </span><a href="http://www.curatingtomorrow.co.uk/"><span style="line-height: 107%;"><b>Curating Tomorrow</b></span></a><span style="line-height: 107%;"><b> </b>(um
serviço de consultoria para museus e o sector do património interessado em
criar um futuro melhor, com </span><a href="http://www.curatingtomorrow.co.uk/resources/"><span style="line-height: 107%;"><b>várias publicações
gratuitas</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> sobre a emergência climática e, mais importante, o empoderamento
climático) apresentou brevemente um plano para acção climática <u>nos</u> e <u>com
os</u> museus, que pode dar uma orientação básica sobre o que devemos discutir
e como agir. “Nos” e “com os” é muito importante aqui, pois não se trata apenas
do que os museus podem fazer pelos outros, mas também do que eles devem fazer
internamente; dois aspectos igualmente importantes do trabalho que precisamos de
fazer.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNF-3L4y2tClVCBnH411Qvc40r2jcXlEQXQENB65OCbx8Xl5AsPaZlA_eBAsvzw7md3CBPmEpU3pomKKzTEIz1kKBUiOlrmtFsOzETKVWjAAQrmvoHgv8RDO1T0HkgbX6kV5nzIxAPq5xvbteT4OQoFvLA02-S0EY2adT852dh_x5-n2hSZXTbdImvhw/s543/nemo_500.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="543" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgNF-3L4y2tClVCBnH411Qvc40r2jcXlEQXQENB65OCbx8Xl5AsPaZlA_eBAsvzw7md3CBPmEpU3pomKKzTEIz1kKBUiOlrmtFsOzETKVWjAAQrmvoHgv8RDO1T0HkgbX6kV5nzIxAPq5xvbteT4OQoFvLA02-S0EY2adT852dh_x5-n2hSZXTbdImvhw/s16000/nemo_500.png" /></a></span></div><span style="font-family: verdana;"><br /><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Há mais, muito mais:</span></span></p><p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-indent: -18pt;">O colectivo Artists Commit, <b><a href="https://www.theartnewspaper.com/2021/04/22/launch-of-artists-commit-intensifies-the-push-to-act-on-climate-change" target="_blank">liderado porartistas e fundado em 2021</a></b></span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-indent: -18pt;">, começou
a divulgar <b><a href="https://www.theartnewspaper.com/2022/01/14/artists-commit-climate-impact-reports-exhibitions" target="_blank">relatórios sobre o impacto climático</a></b> que reúnem dados sobre a energia
consumida e os resíduos gerados por projectos e exposições específicas, a fim
de acelerar a acção climática</span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-indent: -18pt;">. Os
relatórios concentram-se em quatro áreas - redução de emissões, eliminação de
resíduos, apoio às pessoas e promoção de acções colectivas - e o grupo usou a
<b><a href="https://galleryclimatecoalition.org/carbon-calculator/" target="_blank">calculadora de carbono</a></b> da Gallery Climate Coalition</span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-indent: -18pt;">. A
Coalition disponibilizou também um <b><a href="https://galleryclimatecoalition.org/usr/library/documents/main/gcc_decarbonisation-action-plan_2021_final.pdf" target="_blank">Plano de Acção de Descarbonização</a></b></span><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-indent: -18pt;">, uma
estratégia de dez passos para as instituições de arte reduzirem as emissões de
carbono.</span></li><li><span style="font-family: verdana;">Existe
o <b><a href="https://www.museumsforclimateaction.org/mobilise/toolbox" target="_blank">Museums for Climate Action Toolbox</a></b></span></li><li><span style="font-family: verdana;">Existe o kit de ferramentas CIMAM – Comité
Internacional para Museus e Colecções de Arte Moderna sobre <b><a href="https://cimam.org/sustainability-and-ecology-museum-practice/cimams-toolkit-on-environmental-sustainability/" target="_blank">SustentabilidadeAmbiental na Prática Museológica</a></b> </span></li></ul><br /><p></p>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdfAzS3iKvsCI6uO-lalSqDSDvW1IoxLmB5AdiCytbNmYZ2Ksei9anUL8-yz9bZ5v16-tfLOOJXwYVXd0X4EyF_3ze0K2AHNVm3izkHRq6MnTtKl135_IKdRiXXUERFbamav9S9R2xMCWT4qRPHgpd-98OHX7NaEFnaow590Xf2Ywnli326AoWWJRb-g/s500/bordallo%20ii_500.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="339" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdfAzS3iKvsCI6uO-lalSqDSDvW1IoxLmB5AdiCytbNmYZ2Ksei9anUL8-yz9bZ5v16-tfLOOJXwYVXd0X4EyF_3ze0K2AHNVm3izkHRq6MnTtKl135_IKdRiXXUERFbamav9S9R2xMCWT4qRPHgpd-98OHX7NaEFnaow590Xf2Ywnli326AoWWJRb-g/s16000/bordallo%20ii_500.jpg" /></a></div><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;">Neste momento, parece haver grandes filas em Lisboa para a exposição </span><b style="font-family: verdana;"><a href="https://www.bordaloii.com/news/evilution-solo-show" target="_blank">“Evilution”</a></b><span style="font-family: verdana;"> do artista Bordallo II</span><span style="font-family: verdana;">,
que questiona os “males” (evils) da nossa “evolução” e os seus efeitos,
especialmente em termos de produção de lixo. O local não é central e não há bons
transportes públicos, mas as pessoas procuram informação, procuram formas de se
envolver e de agir. Não querem sentir-se impotentes. Como é que os museus respondem às suas preocupações e
necessidades? Não podemos estar a expressar dificuldade em entender o que tudo
isso tem a ver com os museus ou com as obras de arte ou com cada um de nós
pessoalmente (como indivíduo e como profissional dos museus e da cultura). É
cada vez mais dramático que este sector confirme, repetidamente, a sua
alienação da sociedade, a sua irrelevância. Precisamos de fazer melhor. E
estamos atrasados.</span></p>
<p class="MsoNormal"><br /></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Nota: O post foi actualizado a 8 de Dezembro, para incluir as declarações do Ministro da Cultura italiano.</b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Mais neste blog:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="line-height: 107%;"><b><a href="https://www.publico.pt/2022/08/29/culturaipsilon/opiniao/podemos-esperar-dirige-museu-2018461" target="_blank">O que podemos esperar de quem dirige um museu?</a></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"> <br /></span></o:p></span><span style="font-family: verdana; font-size: small;">Mais leituras:</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span class="MsoHyperlink"><span color="windowtext" lang="EN-GB" style="line-height: 107%; text-decoration: none;">New London
Architecture, <i><b><a href="https://nla.london/news/the-art-of-zero-waste-can-temporary-exhibitions-be-sustainable" target="_blank">The art of zero waste: can temporary exhibitions be sustainable?</a></b></i></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span class="MsoHyperlink"><span color="windowtext" lang="EN-GB" style="line-height: 107%; text-decoration: none;">Touring
Exhibitions Organisation, <i><b><a href="https://www.teo-exhibitions.com/sustainable-travelling-exhibitions/" target="_blank">Sustainable Travelling Exhibitions: Can travelling exhibitions be part of a sustainable museum policy?</a></b></i> </span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span class="MsoHyperlink"><span color="windowtext" lang="EN-GB" style="line-height: 107%; text-decoration: none;"><b><a href="https://theatregreenbook.com/" target="_blank">The Theatre Green Book</a></b> </span></span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-8340728970925044022022-10-02T18:05:00.002+01:002022-10-02T18:05:51.957+01:00A saúde mental dos profissionais dos museus em Portugal: quem se importa?<p> <table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjIHwqQgpAEb-WttgSeRLQsjz-wSSAraxN1S4p-_NX1bMxw7mqdU9nGzkAOYAnn7xPgei0iPt-QurWAW01mxjQcpaxyUjgPBKKIFAhHPIE9H0EVve0Rk2NY5M4b8jFZA2N7L8f_3URMQuHPT9NAq5jKdCDDYb2v5JU8WtI7veVvaJdDC2t7pF8NxqbXVQ/s500/union_s.png" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="335" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjIHwqQgpAEb-WttgSeRLQsjz-wSSAraxN1S4p-_NX1bMxw7mqdU9nGzkAOYAnn7xPgei0iPt-QurWAW01mxjQcpaxyUjgPBKKIFAhHPIE9H0EVve0Rk2NY5M4b8jFZA2N7L8f_3URMQuHPT9NAq5jKdCDDYb2v5JU8WtI7veVvaJdDC2t7pF8NxqbXVQ/s16000/union_s.png" /></a></td></tr></tbody></table></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: 13.3333px; text-align: left;"><span style="font-family: times;">29 de agosto de 2022; Columbus, OH, EUA; Funcionários e apoiantes do Columbus Museum of Art reúnem-se à frente do museu, antes de entregarem uma carta à administração, solicitando o reconhecimento voluntário do sindicato CMA Workers United. Créditos: Adam Cairns-The Columbus Dispatch</span></span></td></tr></tbody></table><p><span style="font-family: verdana;">“Nos últimos meses, a equipa de liderança do YBCA [Yerba
Buena Center for the Arts] tem lidado com os impactos e a volatilidade sem
precedentes causados pela pandemia do COVID-19.</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">(…) Hoje, devido a estes impactos, é com pesar que anuncio
a eliminação de 27 postos de trabalho no YBCA. Isto representa mais de um terço
da nossa equipa, principalmente em postos directamente ligados a eventos e
actividades ao vivo, que não se realizarão no futuro próximo. Como uma
organização que se preocupa profundamente com os seus funcionários, evitámos
fazer estas mudanças enquanto as nossas finanças o permitiram. Também
considerámos cuidadosamente a equidade em todas as nossas decisões.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estes valorizados membros da equipa, que deram importantes contributos
ao YBCA, receberão indemnização e três meses de assistência médica. Terão,
ainda, prioridade como candidatos para futuras vagas no YBCA. Para os
restantes, melhor-remunerados, membros da equipa, implementaremos reduções
salariais entre 5 e 12%, com as maiores reduções ao nível superior da
organização.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Anuncio essas mudanças reconhecendo com grande pena que
estamos a perder membros de nossa família YBCA que deram muito de si para criar
um legado duradouro no YBCA. Somos eternamente gratos pela visão, criatividade,
compromisso e paixão com que contribuíram para fazer do YBCA o que é hoje. Sei
que se juntam a mim para expressar gratidão pelos membros de nossa equipa que
estão de saída.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Foi desta forma que, a 21 de Julho de 2020, Deborah
Cullinan (na altura, CEO do YBCA) </span><a href="https://ybca.org/an-important-announcement-from-ybca/"><span style="line-height: 107%;"><b>anunciava
o despedimento de 27 membros da sua equipa devido aos impactos da pandemia</b></span></a><span style="line-height: 107%;">.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Há mais ou menos um ano, estava no Museu do Douro, a
participar no </span><a href="https://immer.fba.up.pt/2021/#programa"><span style="line-height: 107%;"><b>IMMER
#3 - International Meeting on Museum Education and Research</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Na
minha sessão, apresentei este excerto do anúncio do YBCA. Estava mais ou menos
a meio da leitura, quando uma das pessoas presentes começou a chorar. Percebi e
senti um aperto no estômago... Era uma das pessoas que tinha sido “dispensada”
do museu onde trabalhava e que se tornou no caso mais mediático, pela forma
como tratou os seus trabalhadores naquele primeiro ano da pandemia. Continuei a
ler, tendo pousado a minha mão no ombro da pessoa. O resto da sala em silêncio
absoluto. Havia mais pessoas entre nós que tinham trabalhado naquele museu. A
distância que o separa do YBCA tornou-se ainda mais evidente.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Lembrei-me novamente dessa ocasião e da forma como nos
marcou quando, com um intervalo de poucos dias, tomei conhecimento da situação
vivida por duas colegas que trabalham em museus e que estão em momentos
diferentes das suas carreiras: uma a cerca de 10 anos de se reformar e a outra
com cerca de três anos de serviço. O que partilharam comigo, e que afecta as
suas vidas profundamente - do ponto de vista profissional, mas,
inevitavelmente, pessoal também – tem-me sido relatado por vários outros
colegas e muito discutido em formações. Não se trata apenas de um caso
mediático; trata-se de práticas instaladas e generalizadas, mais ou menos
conhecidas e pouco contestadas. Não se trata de uma ou outra pessoa; trata-se
de diversas pessoas que trabalham neste sector, com ou sem vínculo, mais ou
menos novas. Continuaremos a fechar os olhos ou a sentir-nos impotentes?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Acredito que nada disto soará pouco familiar: hierarquias
rígidas; superiores com pouco conhecimento ou sensibilidade sobre a matéria dos
museus; acumulação de poderes e da capacidade de decisão numa pessoa, que não
consegue dar conta do recado; pouca ou inexistente delegação de funções; tempo
interminável de espera de respostas, qualquer que seja o assunto; falta de
recursos humanos e técnicos, mas grande exigência para a organização de
inúmeras “actividades” (a única coisa que conta para o relatório do final do
ano); lógicas partidárias na gestão dos museus com consequências muito
perversas nos territórios; mudanças nas autarquias que colocam tudo em <i>stand
by</i> ou que deitam abaixo o que já se fazia para fazer tudo de novo; eternas reorganizações
dos serviços…<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A tudo isto estão associadas condutas de abuso de poder,
assédio moral, falta de respeito pelas pessoas que fazem parte das equipas –
pelos seus conhecimentos e capacidades, mas também pelo seu direito a uma vida
pessoal. Uma das colegas com quem falei recentemente falou-me concretamente do
esforço para deixar de se preocupar, deixar de se importar e tentar resistir à
vontade de propor coisas, porque… não vale a pena, só dá chatices. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Alguma destas coisas será uma surpresa? Algo que ouvimos
pela primeira vez? Diria que não… Mas, de repente, fiquei muito mais consciente
de como estes relatos se estão a multiplicar e parecem definir, nos últimos
tempos, o sector dos museus em Portugal. Não é que não se verificam situações
destas noutros meios da área da Cultura. Mas, tendo o privilégio de colaborar
com diferentes organizações e profissionais nesta área, considero que o sector
dos museus se tornou particularmente problemático. O que me leva a questionar o
estado da saúde mental dos seus profissionais.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Desânimo, descrença, desmotivação, pessimismo são alguns
dos estados de espírito manifestados pelas pessoas. Mas há também a depressão,
as consultas com especialistas de saúde mental, a medicação, as baixas médicas.
Há casos mais graves de assédio moral que levam a pensar no suicídio, estaremos
conscientes disso? Não estou a inventar, tudo o que partilho aqui foi
partilhado por colegas. Estamos a falar do meio em que trabalhamos, estamos a
falar da pessoa ao nosso lado.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Nada disso é exclusivo do mundo dos museus portugueses. Noutros
países, no entanto, e especialmente nos EUA, estas situações começaram a
tornar-se mais evidentes, a ser discutidas em público. Contas no Instagram como
</span><a href="https://www.instagram.com/changethemuseum/?hl=en"><span style="line-height: 107%;"><b>Change
the Museum</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> ou </span><a href="https://www.instagram.com/abetterguggenheim/?hl=en"><span style="line-height: 107%;"><b>A
Better Guggenheim</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> revelam o que se passa no interior de algumas
dessas organizações, que se apresentam publicamente como defensoras de valores
e princípios éticos. A pandemia levou também muitos trabalhadores de museus a
fundar novos sindicatos ou a reactivar os já existentes (ver artigos no final
deste texto).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Não vivemos algo parecido em Portugal. Talvez porque primeiro
devemos ganhar consciência da severidade da situação, admitir que não estamos a
lidar com casos isolados. Às vezes fico a pensar nos resultados de um possível inquérito
de satisfação, não aos visitantes, mas aos trabalhadores… Quantas pessoas
desmotivadas? Quantas pessoas que se sentem condicionadas e postas de lado,
quando podem e desejam contribuir? Quantas pessoas que se sentem abusadas,
moralmente assediadas, porque se importam? Quantas pessoas a tomar medicação
para poderem enfrentar o local de trabalho? Quantas pessoas em baixa
psicológica? E ainda… quantas pessoas que deixaram o “conforto do emprego
seguro”, num momento tão inseguro, e apresentaram a sua demissão? Pessoas com
muitos ou poucos anos de serviço em determinado museu, que ficaram sem nada… No
meu meio mais imediato, três. Pensemos nisso… <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Neste momento, estou a ler o livro de Joan Tronto “Caring
Democracy”. O pensamento que lhe serve de base é que temos um déficit
democrático (democracy deficit) porque temos um déficit no cuidar (care
deficit). No final do capítulo que acabei ontem, Tronto afirma: “Ter 'escolha'
não é a mesma coisa que liberdade da dependência. (…) mesmo que pudéssemos ser
livres de todas as formas de dependência, isso não seria uma vida livre, seria
uma vida desprovida de sentido. A dependência marca a condição humana desde o
nascimento até a morte. O que nos torna livres, na verdade, é a nossa
capacidade de nos importarmos e de assumirmos compromissos com o que importa
para nós”. Sorri… Porque pensei que a razão porque deixei o “emprego seguro”,
há exactamente 10 anos, é que me recusei a deixar de me importar. Tal como
várias outras pessoas que chamo colegas e amigas e que lutam, de diferentes
formas, por esta liberdade. Mas a que custo? E, ao final de contas, porquê e
para quê?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Ler ainda:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="line-height: 107%;">Maria Vlachou, </span><a href="https://www.publico.pt/2022/08/29/culturaipsilon/opiniao/podemos-esperar-dirige-museu-2018461"><span style="line-height: 107%;"><b>O que
podemos esperar de quem dirige um museu?</b></span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="line-height: 107%;">Maria Vlachou, </span><a href="https://musingonculturextra.blogspot.com/2022/07/fitted-for-freedom.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Fitted
for freedom</b></span></a></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Mais leituras:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">Hakim Bishara, </span><a href="https://hyperallergic.com/765068/momas-cruel-offer-to-unionized-workers-during-the-pandemic/"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><b>MoMA’s cruel offer to unionized workers during the
pandemic</b></span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">. In <i>Hyperallergic</i>,
30.09.2022<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">John Hurdle, </span><a href="https://www.nytimes.com/2022/09/29/arts/design/strike-philadelphia-museum-of-art.html"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><b>Strike at Philadelphia Museum of Art is Window to Broader
Unrest</b></span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">. In <i>The New York
Times</i>, 29.09.2022<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">Zachary Small, </span><a href="https://www.nytimes.com/2022/02/21/arts/design/museums-unions-labor.html"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><b>U.S. Museums See Rise in Unions Even as Labor Movement
Slumps</b></span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">. In <i>The New York
Times</i>, 21.02.2022</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-76370337287028365552022-08-29T10:22:00.004+01:002022-08-29T10:31:53.227+01:00O que podemos esperar de quem dirige um museu?<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiilaMMn53EoeiLbzdAqcNHYEwiKPMF3dTUiApLjDRw1lvzDX8npgsjhquKPei30CjqCn9WqFr4rfrKjT3lbGTrM7yDBqPtbIuxQzSAR1qlduoWYUnrd36gUzx67dx8vZSRW3GpK7qx1bIsUV1Ef1-5VffScEDkp0dbDHjJWDcUiQwBtAcaPqZpROQwzg/s500/publico_mv.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiilaMMn53EoeiLbzdAqcNHYEwiKPMF3dTUiApLjDRw1lvzDX8npgsjhquKPei30CjqCn9WqFr4rfrKjT3lbGTrM7yDBqPtbIuxQzSAR1qlduoWYUnrd36gUzx67dx8vZSRW3GpK7qx1bIsUV1Ef1-5VffScEDkp0dbDHjJWDcUiQwBtAcaPqZpROQwzg/s16000/publico_mv.png" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><span style="font-family: verdana;">O meu artigo hoje <a href="https://www.publico.pt/2022/08/29/culturaipsilon/opiniao/podemos-esperar-dirige-museu-2018461" target="_blank"><b>no Público</b></a>.</span></div><br /><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-55559947948850761582022-07-18T19:10:00.001+01:002022-07-18T19:12:14.125+01:00Solidariedade em acção<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_wLVSH2uSKBcUDVDIylTlT6YK5I4iU6BAbubIS3Txme5HwAouWHQp7bGjf7pYYzjL0cM_JdOKa6TAJbfqnXfgwC6TJCKLNjXs3V7LhHaZoa2et5sGTSjC6dvz4NdTOwH8OJzbdvO5CNaaxwMwUq1r1nH1MO09ALFIaqkd1GZk_YA0b5Vc00LObz_fKg/s500/SiA_key%20challenge_500.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="278" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_wLVSH2uSKBcUDVDIylTlT6YK5I4iU6BAbubIS3Txme5HwAouWHQp7bGjf7pYYzjL0cM_JdOKa6TAJbfqnXfgwC6TJCKLNjXs3V7LhHaZoa2et5sGTSjC6dvz4NdTOwH8OJzbdvO5CNaaxwMwUq1r1nH1MO09ALFIaqkd1GZk_YA0b5Vc00LObz_fKg/s16000/SiA_key%20challenge_500.png" /></a></div><br /><p></p><p></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Nos últimos 18 meses, tenho tido o privilégio de fazer
parte de uma rede internacional de profissionais de museus chamada “Solidarity
in Action”. Há um ano, sou também membro do seu conselho consultivo. Juntamente
com as lições ensinadas pela pandemia, esse incrível grupo de pessoas (liderado
pela incansável e motivadora Bernadette Lynch) deu-me a oportunidade de aprofundar
o meu pensamento e prática de solidariedade. Permitiu-me também compreender melhor
a palavra na minha língua materna, a língua que mais “se sente”.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Em grego, a palavra para solidariedade é “αλληλεγγύη”, que
eu no passado sempre entendi como “estar perto do outro”. Indo mais a fundo,
depois de um dos primeiros fóruns da rede, olhei pela primeira vez para a
etimologia: o penhor, a segurança que se dá a outra pessoa; ser a garantia de
outra pessoa. Este novo entendimento da palavra afastou-me das noções de
filantropia, caridade, paternalismo. As ricas discussões no grupo ajudaram-me a
compreendê-la como um contrato para apoiarmos e cuidarmos uns dos outros. E
esse contrato, da forma como o entendo, espera que sejamos capazes de realizar
actos tão radicais como ouvir e empatizar.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">No mês passado, comemorámos os primeiros 18 meses da rede
com uma conferência online. Divididos em quatro grupos, discutimos os seguintes
assuntos:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Grupo 1 - Descolonização e solidariedade<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Grupo 2 - Organização da comunidade local e auto-ajuda fora
do museu<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Grupo 3 - Trabalhadores do museu desaprendendo para se
tornarem solidários<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Grupo 4 - Pedagogia da solidariedade<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Fiz parte do grupo 3, <b>Trabalhadores do museu
desaprendendo para se tornarem solidários</b>. A nossa tarefa era apresentar um
desafio principal e uma acção-chave principal.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Na discussão que se seguiu, as participantes partilharam
preocupações diversas, como o sentimento de impotência, a falta de equipas
diversas, os museus como espaços inseguros para desafiar o <i>status quo</i>, o
racismo estrutural e a distribuição desigual de poder, ser a “voz impopular”.
Conversámos sobre possíveis maneiras de realizar a mudança que desejamos:
reconhecer o poder que cada um tem, ouvir, criar espaço para diversas vozes,
envolver toda a gente, desenvolver a capacidade de empatia. Às vezes, são as
organizações pequenas e mais flexíveis que mostram o caminho. E aí alguém
disse: “Aprender a ser vulnerável, a ficar exposto”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Isso fez-me pensar no quão pouco preparados ou dispostos
estamos a aceitar o sentimento de vulnerabilidade. Uma vulnerabilidade que
surge quando temos de lidar com coisas que não conhecemos, que são novas para
nós, que contradizem o que pensávamos saber sobre o mundo à nossa volta.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Assim, o grupo conseguiu definir o seu desafio principal: <b>desaprender
o conforto do conhecimento</b>, abrir mão do excesso de confiança que o nosso conhecimento
nos dá, tornarmo-nos mais humildes e entendermos que o conhecimento não é uma base
de competição. “Partilharmos a nossa vulnerabilidade permite-nos construir mais
empatia”, disse uma participante. Assim, o grupo também conseguiu definir uma
principal acção-chave: <b>aprender a ser vulnerável como colectivo</b>, sermos
capazes de admitir que não sabemos tudo, tornarmos-nos em pessoas mais humanas,
solidárias, empáticas.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pensei na nossa discussão de grupo e no que poderia
significar na prática quando li o artigo de José Pacheco Pereira no jornal
Público. Desejando dar a sua opinião sobre a linguagem inclusiva, definindo a
discussão pública em torno deste tema como uma “polémica”, intitulou o seu
artigo <b><a href="https://www.publico.pt/2022/07/09/politica/opiniao/todes-nao-2013038" target="_blank">“Porque é que ‘todes’ não é todos, nem todas?”</a></b>. É uma pergunta, mas, na
verdade, não o é, pois ele já tem todas as respostas. Escreve sobre um “surto
de identidades”, identidades que “supostamente existem” e cuja aceitação é
“acrítica”, uma “doença obsessiva da identidade”, está a ser irónico e
sarcástico. Mas, acima de tudo, torna óbvia a sua ignorância em relação a estes
assuntos; e, juntamente com a sua ignorância, o seu grande desconforto em ter de
lidar com ela. <a name="_Hlk109062731">Não faz mal ser ignorante; somos todos,
sobre tantas matérias. </a>Mas se ele ouvisse, se admitisse que não sabe, se
tentasse descobrir o que não sabe, antes de partilhar a sua opinião num grande
jornal? “Opressão é não respeitar a individualidade de uma pessoa”, disse Pauli
Murray.</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="line-height: 107%;"><iframe allowfullscreen="" class="BLOG_video_class" height="266" src="https://www.youtube.com/embed/YOqNEO3cVsQ" width="320" youtube-src-id="YOqNEO3cVsQ"></iframe></span></div><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"><br /></span></span></p>Luísa Semedo, outra colunista do mesmo jornal, respondeu </span><a href="https://www.publico.pt/2022/07/14/opiniao/opiniao/chave-armario-orgulho-invisibilidade-2013578" style="font-family: verdana;" target="_blank"><span style="line-height: 107%;">(<b>“A
chave do armário e o orgulho da invisibilidade”</b></span></a><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;">). Citou
Ludwig Wittgenstein que em 1921, no seu <i>Tractatus Logico-Philosophicus</i>,
escreveu que “Os limites da minha linguagem significam os limites do meu
mundo”. Semedo questiona: “Ora, se não há palavra para descrever quem sou, quem
sou eu? Será que existo? Que existência me é permitida para mim própria, na
sociedade, na democracia?”</span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pacheco Pereira, como tantas outras pessoas que se sentem
ameaçadas pela diversidade do mundo, prefere acreditar que esta é apenas uma
questão de moda. É porque ignora a história. Estes assuntos não surgiram quando
nós ouvimos falar deles pela primeira vez. No seu artigo, Luísa Semedo fala-nos
de Pauli Murray (americana, 1910-1985: activista dos direitos civis, defensora
da igualdade de género, advogada, escritora). Será que Pacheco Pereira ouviu
falar? Ou, ainda, de Virgínia Quaresma (portuguesa, 1882 – 1973: primeira
repórter portuguesa, feminista, lésbica), entre tantas outras pessoas? A
verdade é que não ficamos mais pobres, como diz Pacheco Pereira, quando deixamos
de usar termos ofensivos para nos referirmos aos outros; ficamos mais pobres
quando não questionamos o que sabemos, quando procuramos desesperadamente o
conforto do nosso conhecimento e preferimos ignorar que o mundo está cheio de outras
histórias e de nuances.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Voltando à nossa discussão sobre “Solidarity in Action”,
porque é que os profissionais de museus sentem que os museus são um espaço
inseguro para desafiar o <i>status quo</i>? Porque a maioria está tão cheia de
respostas, tão à vontade com a superioridade trazida pelo seu conhecimento, que
se esquece de fazer perguntas, não consegue ou não quer ouvir, silencia as
vozes que trazem nuances à discussão. Muitos museus contribuem para uma versão
mais pobre de nós mesmos e isso é um facto que deve provocar muito mais
desconforto do que a linguagem inclusiva ou a diversidade do mundo.</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjx3KL1O3I8Ae-e7Qa5BDoIvP4Yb0aO0w9oKYWfx7Nl8g8e4nvX17McJb29aJ2rUJDpHHMjiJcI1n6SD-wT5T9zXsobjwnocJPHWy3aRtBuoWrhuBThnO-yZTNVAAiVpMw7_hkGD84RRm_7GwnB_L35aXalEhUfr-ZoG5KjyJR1Y6F6mbc7N5A_3egZXA/s500/virginia_500.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="379" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjx3KL1O3I8Ae-e7Qa5BDoIvP4Yb0aO0w9oKYWfx7Nl8g8e4nvX17McJb29aJ2rUJDpHHMjiJcI1n6SD-wT5T9zXsobjwnocJPHWy3aRtBuoWrhuBThnO-yZTNVAAiVpMw7_hkGD84RRm_7GwnB_L35aXalEhUfr-ZoG5KjyJR1Y6F6mbc7N5A_3egZXA/s16000/virginia_500.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Fotografia tirada na exposição "Para uma história do movimento negro em Portugal", Biblioteca Palácio Galveias, Lisboa.</td></tr></tbody></table><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="line-height: 107%;"></span></div><span style="line-height: 107%;"><br /><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span><p></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-44036630307722930602022-06-19T23:47:00.005+01:002022-06-20T16:30:50.795+01:00Quem tem medo da descolonização?<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhiGD3JANNlGz8eqYJH3a7K9nGopswz5-O5P8iKyXN27VDt5ym_VfwhhH4Q2qT1kxWEwNdgLsq96fXr8LZopjjnjE0HmwFg5pK9KBJaWSvFKfDS7YZ6lsMjZkferabEgHqgajGY8JZDfB07tUV2Xxbxj0Sw_Wt1A3sCNS4Ebv90yOMciLXu-a-moqKeFg/s500/20220609_111715_s.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhiGD3JANNlGz8eqYJH3a7K9nGopswz5-O5P8iKyXN27VDt5ym_VfwhhH4Q2qT1kxWEwNdgLsq96fXr8LZopjjnjE0HmwFg5pK9KBJaWSvFKfDS7YZ6lsMjZkferabEgHqgajGY8JZDfB07tUV2Xxbxj0Sw_Wt1A3sCNS4Ebv90yOMciLXu-a-moqKeFg/s16000/20220609_111715_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Humboldt Forum, Berlin (Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt; line-height: 107%;"><br /></span><p></p><p><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">“Quem tem medo da descolonização?” é o título de um </span><a href="https://www.ne-mo.org/news/article/nemo/call-for-applications-nemo-training-about-decolonisation-in-museums.html"><span style="line-height: 107%;"><b>curso
de formação</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> que será organizado em Setembro pela NEMO –
Network of European Museum Organisations, e acolhido pela UK Museums
Association, SS Great Britain e Bristol Museums. Para quem não se lembra,
Bristol é a cidade onde em Junho de 2020 a estátua do traficante de escravos
Edward Colston foi derrubada e depois colocada em exposição (mas deitada) no M
Shed Museum, o museu da cidade. Em Janeiro de 2022, </span><a href="https://theconversation.com/we-attended-the-trial-of-the-colston-four-heres-why-their-acquittal-should-be-celebrated-174481"><span style="line-height: 107%;"><b>um
júri considerou quatro das pessoas que ajudaram a derrubar a estátua – os
chamados “Colston Four” – inocentes de danos criminais</b></span></a><span style="line-height: 107%;">.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O título escolhido para o curso da NEMO soa como uma
pergunta que deveríamos estar a fazer a nós próprios em Portugal, considerando
o quão pouco o debate público evoluiu nos últimos cinco anos (e menos ainda a
prática museal). Um recente </span><a href="https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2588/html/primeiro-caderno/a-abrir/duelo/portugal-deve-devolver-pecas-de-arte-as-ex-colonias-"><span style="line-height: 107%;"><b>“duelo”
publicado no jornal Expresso</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, entre o investigador e
curador António Pinto Ribeiro e o director do Palácio Nacional da Ajuda, José
Alberto Ribeiro, não trouxe nada de novo. O director do palácio repetiu os
argumentos de outros colegas antes dele (ver, por exemplo, </span><a href="https://www.dn.pt/cultura/devolver-espolio-dos-museus-aos-paises-de-origem-so-vendo-caso-a-caso-diz-especialista-11760072.html"><span style="line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e </span><a href="https://www.publico.pt/2018/12/07/culturaipsilon/opiniao/legitimo-intoleravel-restituicao-origem-coleccoes-museus-1852818"><span style="line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="line-height: 107%;">), alertando-nos
contra decisões precipitadas impulsionadas pelo politicamente correto, pedindo
a revisão dos inventários dos museus, enfatizando a necessidade de territórios
ex-coloniais e hoje países independentes para investirem na investigação e
conservação e formarem os seus profissionais (dizendo, ao mesmo tempo, que
alguns objectos estão “mais bem instaladas” em Portugal…). De referir ainda os
alertas sobre o comércio ilícito e a insistente argumentação que visa comparar
o saque ou a aquisição antiética de artefactos de territórios ex-coloniais à
retirada, por exemplo, dos mármores do Parténon ou o roubo de tesouros
portugueses durante as invasões francesas. Por vezes, a forma como estes
argumentos são expressos revela a persistente arrogância dos curadores
europeus, que dizem basicamente que, se se envolvessem numa discussão sobre a
restituição, seriam eles próprios a estabelecer as regras em relação ao quando,
onde e como, assumindo que sabem melhor e revelando total desrespeito pelo
significado que certos objectos podem ter para outras culturas, aquelas que os
produziram. Mesmo assim, pode-se perguntar: considerando esses argumentos e
advertências - que formam, afinal, uma posição - que passos específicos é que
os seus autores deram na direcção das suas próprias recomendações nos últimos
4-5 anos? Vamos ficar para sempre com esse tipo de “duelos” repetitivos?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O caso do director do Museu Nacional de Etnologia é
bastante particular. Paulo Costa tem argumentado que o museu pelo qual é
responsável é </span><a href="https://www.publico.pt/2018/12/07/culturaipsilon/noticia/caso-museu-nacional-etnologia-1853017"><span style="line-height: 107%;"><b>um
caso à parte</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. O principal argumento é que este foi criado
muito tarde (em 1965 – as guerras coloniais começaram em 1961) e tinha uma
perspectiva científica (não tinham todos?). </span><a href="https://www.dn.pt/cultura/devolver-espolio-dos-museus-aos-paises-de-origem-so-vendo-caso-a-caso-diz-especialista-11760072.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Numa outra
entrevista</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, Paulo Costa dizia que “É preciso dizer que a maioria dos
museus não é feita com peças pilhadas, essa é uma ideia errada que algumas
pessoas têm. Há muito ruído sobre este assunto" (a entrevista foi feita em
Janeiro de 2020; o livro de Dan Hicks “The Brutish Museums”, que documenta o
papel instrumental que os museus europeus tiveram no saque de objectos e na
construção de narrativas racistas, ainda não tinha saído). O mais
decepcionante, no entanto, foi que numa conferência organizada em Novembro de
2021 pelo ICOM Portugal, intitulada “Museu com coleções não europeias” (“não
europeias”, realmente…), o director do Museu Nacional de Etnologia afirmou (ver
</span><a href="https://youtu.be/TrCYt-2OwoQ?t=20745"><span style="line-height: 107%;"><b>gravação em vídeo</b></span></a><span style="line-height: 107%;">,
5:45:55) que o chamado “relatório Macron” (sobre a restituição do património
cultural africano) foi da iniciativa de dois investigadores, não do Estado
francês, que não o reconheceu. Como sabemos, o relatório foi </span><a href="https://www.elysee.fr/emmanuel-macron/2018/11/23/remise-du-rapport-savoy-sarr-sur-la-restitution-du-patrimoine-africain"><span style="line-height: 107%;"><b>encomendado
pela Presidência da República Francesa</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e que foi, precisamente, com base
nesse relatório que </span><a href="https://www.quaibranly.fr/fr/collections/vie-des-collections/actualites/restitution-de-26-oeuvres-a-la-republique-du-benin/"><span style="line-height: 107%;"><b>o
Museu Quai Branly devolveu os primeiros objetos a Benin</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, é
profundamente perturbador que essa declaração não tenha sido contestada num encontro
de profissionais dos museus.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Entretanto, em 2020 o livro de Dan Hicks “The Brutish
Museums”, onde se refere que poderão existir objetos saqueados a Benin nas colecções
da Sociedade de Geografia de Lisboa e do Museu Nacional Grão Vasco. Esta
referência não gerou qualquer debate ou questionamento no campo dos museus e do
património em Portugal. No mesmo ano, Kwame Opoku (ex-assessor jurídico do
escritório das Nações Unidas em Viena), escrevendo sobre o caso português num
artigo intitulado </span><a href="https://www.modernghana.com/news/986892/will-portugal-be-the-last-former-colonialist-state.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Will
Portugal Be The Last Ex Colonialist State To Restitute Looted African
Artefacts?</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, além de criticar os argumentos de alguns profissionais
portugueses, questiona as origens de objectos apresentados em 1985 numa
exposição no Museu Nacional de Etnologia, intitulada “Escultura Africana em
Portugal”, provenientes de várias colecções públicas e privadas portuguesas.
Mais uma vez, não houve reação alguma ao seu questionamento.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">A qualidade do debate público em Portugal tem sido bastante
fraca e revela falta de interesse e coragem em assumir responsabilidades e,
pelo contrário, uma forte intenção de resistir a qualquer reflexão séria sobre
o papel dos museus em relação ao passado colonial e ao presente racista do
país. Ao mesmo tempo, as mentalidades evoluem noutras partes do mundo. Acredito
que o que realmente muda as regras do jogo neste momento é a </span><a href="https://hyperallergic.com/729818/smithsonian-adopts-landmark-policy-on-ethical-restitution/"><span style="line-height: 107%;"><b>nova
política de restituição da Smithsonian</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> que “dá aos seus museus a
autoridade para devolverem itens nas suas colecções que foram saqueados ou
adquiridos sob circunstâncias antiéticas. (…) Os museus agora poderão iniciar
devoluções e entrar em acordos de gestão partilhada com base em considerações
éticas, mesmo quando não houver nada que os obrigue legalmente a fazê-lo.” A
descolonização não tem apenas a ver com a restituição, é, antes de tudo, um
estado de espírito, a tomada de consciência das próprias responsabilidades
éticas, que muitas vezes vão além das obrigações legais.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Alguns museus europeus têm liderado este processo. Na
Holanda, o trabalho do </span><a href="https://www.tropenmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/afterlives-slavery"><span style="line-height: 107%;"><b>Tropenmuseum</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e do </span><a href="https://www.materialculture.nl/en"><span style="line-height: 107%;"><b>Research Center for Material
Culture</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> têm sido fundamentais, assim como a inovadora </span><a href="https://www.rijksmuseum.nl/en/whats-on/exhibitions/past/slavery"><span style="line-height: 107%;"><b>exposição
do Rijksmuseum sobre a escravatura</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> e a publicação </span><a href="https://english.cultureelerfgoed.nl/publications/publications/2020/01/01/traces-of-slavery-and-colonial-history-in-the-art-collection-edition-2"><span style="line-height: 107%;"><b>Traces
of Slavery and Colonial History in the Art Collection</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> da
Agência Holandesa do Património Cultural. No Reino Unido, o </span><a href="https://www.prm.ox.ac.uk/research-projects-0"><span style="line-height: 107%;"><b>Pitt Rivers Museum</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> é o
primeiro que me vem à mente e os seus projectos African Restitution Research,
Labelling Matters, Maasai Living Cultures, etc. Recentemente, fiquei a conhecer
o projecto </span><a href="https://themuseumslab.org/"><span style="line-height: 107%;"><b>MuseumsLab</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, uma
plataforma que reúne diversos museus (incluindo um único museu português, o Museu de Lisboa) para uma aprendizagem conjunta, intercâmbio e
educação continuada sobre o futuro dos museus em África e na Europa. Soube
deste projecto através do Museu de História Natural de Berlim e do seu trabalho
sobre </span><a href="https://www.museumfuernaturkunde.berlin/en/about/the-museum/colonial-contexts"><span style="line-height: 107%;"><b>Contextos
Coloniais</b></span></a><span style="line-height: 107%;">.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjWp37jc2waPOpBIx_3i1s97QVNcu44R78LfJsyfWeCUix5IO0E1USVLxSNCxSmYEiqH8lHxdxAKlcMfWZQlL8zHW3PVQ7lXlmrq-hSPJnEL0D5Wagbgy1TwQExf7DGid6IBjp5zh8KoDf6MS0nCQIBWRpIcYLPQsEJLC_VVyMDvrUHHG7HK4vApzErOA/s500/20220609_105306_s.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjWp37jc2waPOpBIx_3i1s97QVNcu44R78LfJsyfWeCUix5IO0E1USVLxSNCxSmYEiqH8lHxdxAKlcMfWZQlL8zHW3PVQ7lXlmrq-hSPJnEL0D5Wagbgy1TwQExf7DGid6IBjp5zh8KoDf6MS0nCQIBWRpIcYLPQsEJLC_VVyMDvrUHHG7HK4vApzErOA/s16000/20220609_105306_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Humboldt Forum, Berlin (Foto: Maria Vlachou)</span></td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">O que marcou a minha recente visita a Berlim foi o uso
repetido da palavra “perspectiva” nos museus e o facto de que os próprios
museus colocam questões. Estava ansiosa para ver o trabalho realizado pelo
Humboldt Forum, que teve a coragem de </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=gMRv5xhMCo4"><span style="line-height: 107%;"><b>convidar Chimamanda Ngozi
Adichie como palestrante principal</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> na sua abertura. Entrando na
primeira sala da colecção de Etnologia, o museu questiona o visitante: Quando é
que estes objectos foram trazidos para Berlim e onde foram colocados? Quais são
as questões urgentes? Mais à frente, comentando uma ficha de inventário
referente a um objecto da Namíbia, o museu pergunta: Que informação não está
correcta nesta ficha de informação? O que está a faltar nesta ficha de informação?
Ao mesmo tempo, lembra-nos que as perspectivas mudam e que essa parte da
exposição está desenhada para mudar e crescer.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTSGYPr7ufLJNvnpxddKQhJtoJdXaZnOI5DMRV5YbTqHRNLiMR0eqo_98gi98P-hUz3aPNkA1LEFHfGzvrBRmh_nkGC5MC4hGc6MkLpSwVolB-osB-OaRb1CoEJQSagh1eTOfhtsDa7fXVuJFzfyOSUn7NnrkxjmOeFNJhRr2pkxfWruorKvjAnYvsmg/s500/20220611_132904_s.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTSGYPr7ufLJNvnpxddKQhJtoJdXaZnOI5DMRV5YbTqHRNLiMR0eqo_98gi98P-hUz3aPNkA1LEFHfGzvrBRmh_nkGC5MC4hGc6MkLpSwVolB-osB-OaRb1CoEJQSagh1eTOfhtsDa7fXVuJFzfyOSUn7NnrkxjmOeFNJhRr2pkxfWruorKvjAnYvsmg/s16000/20220611_132904_s.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-family: times;">Emil Nolde, "Papuan Youth" (1914), Neue Nationalgalerie,</span><span style="font-family: "Times New Roman";"> Berlin (Foto: Maria Vlachou)</span></td></tr></tbody></table><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Quando o visitante sai do exposição permanente da Neue
Nationalgalerie, há um espaço para os visitantes denominado “Perspectivas: área
de diálogo e actividades”. Os visitantes são lembrados de que os artistas
também dão as suas perspectivas através dos seus trabalhos e são convidados a
pensar e encontrar as suas próprias abordagens. O museu também participa na
discussão generalizada e mais consciente dos museus alemães sobre o passado
colonial do país e pergunta, por exemplo: De que forma os artistas Brücke estão
ligados à história colonial da Alemanha? Não são (não eram) mundos separados e
nenhum museu é um “caso à parte”, se quiser ser honesto consigo mesmo e com a
sociedade em geral.</span></span></p>
<div style="text-align: center;"><iframe frameborder="0" height="400" marginheight="0" marginwidth="0" scrolling="no" src="https://www.slideshare.net/slideshow/embed_code/key/ITbWfyxq6zwkEf?hostedIn=slideshare&page=upload" width="476"></iframe></div><div style="text-align: center;"><br /></div><div style="text-align: center;">Textos do Humboldt Forum e Neue Nationalgalerie.</div><div>
<p class="MsoNormal"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Ainda neste blog:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="http://musingonculturextra.blogspot.com/2021/07/and-are-you-going-to-protect-me.html"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">And are you going to protect me?</span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="http://musingonculturextra.blogspot.com/2020/10/museums-making-sense-dealing-with.html"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;">Museums making sense: dealing with the discomfort of a
multicoloured world</span></a><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="http://musingonculturextra.blogspot.com/2019/09/the-urgency-of-difficult-conversations.html"><span style="line-height: 107%;">The
urgency of difficult conversations</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/06/a-minha-responsabilidade-por-este.html"><span style="line-height: 107%;">A
minha responsabilidade por este vandalismo</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2018/06/discutindo-descolonizacao-dos-museus.html"><span style="line-height: 107%;">Discutindo
a descolonização dos museus em Portugal</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2018/04/o-museu-das-minhas-descobertas_44.html"><span style="line-height: 107%;"><b>O
museu das minhas descobertas</b></span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Sugestões:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><a href="https://www.youtube.com/playlist?list=PLFD7mwBKVOdX_8BB664ojE1RYFZU139WW"><span style="line-height: 107%;"><b>Descolonisar os museus: isto na prática…?</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> Gravação do seminário organizado
em 2019 pela Acesso Cultura. As partes I e II (com Wayne Modest) estão em inglês;
a parte III apenas em português.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><o:p><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"> </span></o:p></p></div>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-13340762452673352322022-05-18T22:26:00.006+01:002022-05-19T11:25:58.819+01:00Vamos correr juntos? Os 40 anos do Teatro Art'Imagem<p><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgP35WOaLBC-_JIZAcdW0v5CcIM75r2wc3uE45M5bYoeafb17a83Q6zcPlnTQjnrO77Yri4vt9PCKFwKSQHpQzwkPeX1yOAiqlMIpRlQx2BJx20FELORmmJZlKeMHk_X8Un6PxLIi-6w_W_TutebpyJIH7LZUi9VXUiDVyBfu5MOevmg_Z7RDYH_5RfaA/s500/artimagem%201_nuno%20ribeiro_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgP35WOaLBC-_JIZAcdW0v5CcIM75r2wc3uE45M5bYoeafb17a83Q6zcPlnTQjnrO77Yri4vt9PCKFwKSQHpQzwkPeX1yOAiqlMIpRlQx2BJx20FELORmmJZlKeMHk_X8Un6PxLIi-6w_W_TutebpyJIH7LZUi9VXUiDVyBfu5MOevmg_Z7RDYH_5RfaA/s16000/artimagem%201_nuno%20ribeiro_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Foto: Nuno Ribeiro</span></td></tr></tbody></table><p></p><p><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Nos dias 10 a
12 de Maio participei nas </span><a href="https://www.teatroartimagem.org/jornadas-40-anos-de-teatro"><span style="line-height: 107%;"><b>Jornadas 40 Anos de Teatro: Como o teatro se desenvolveu nos
últimos 40 anos em Portugal</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, celebrando o aniversário do Teatro
Art’Imagem. No primeiro dia, assistimos ao espectáculo “Ai o Medo Que (Nós)
Temos de Existir”, 117ª criação da companhia. Nos dias seguintes, tivemos a
oportunidade de reflectir sobre quatro temas:</span> </span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><b>Painel 1:
Teatro e Intervenção<br /></b></span>com Sara Barros
Leitão, José Leitão, Rita Alves Miranda e José Soeiro</span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><b>Painel 2:
Teatro: Praxis e Academia<br /></b></span>com Fernando
Matos Oliveira (Universidade de Coimbra), António Capelo (ACE), Manuela Bronze
(ESMAE), Francesca Rayner (Universidade do Minho) e Eugénia Vasques </span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><b>Painel 3:
Descentralização Teatral<br /></b></span>com Helena
Santos, Jorge Baião (Centro Dramático de Évora), Rui Madeira (Companhia de
Teatro de Braga), Magda Henriques (Comédias do Minho) e Américo Rodrigues
(DGArtes)</span></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">
<b>Painel 4: As minorias e o Teatro<br /></b></span>com Flávio
Hamilton, Zia Soares, Marta Lança, Francesca Negro, Vanesa Sotelo e Maria João
Vaz </span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Coube-me a mim a
responsabilidade de fazer o encerramento, partilhando as minhas reflexões no
seguimento do que foi discutido ao longo dos dois dias. Partilho-as aqui:<span></span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Não sou
especialista em História do Teatro, por isso, senti que aprendi tanto nestes
dois dias. “Teatro jornal”, “teatro fórum” são coisas novas para mim e vou
querer saber mais sobre elas.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Gostei da forma
como a Sara Barros Leitão abriu estas jornadas. A forma como questionou a
própria palavra “teatro”, a génese desta forma artística, o contexto em que
certas peças do repertório clássico foram criadas e o contexto em que hoje são apreciadas.
Lembrou-me também de quando, no meu primeiro ano na faculdade, na disciplina de
introdução ao drama antigo, a nossa professora disse-nos que o teatro foi
criado e pôde crescer em Atenas no século 5º antes de Cristo graças à
democracia. Foi como que uma revelação para mim naquela altura, duas coisas que
eu não teria sabido associar.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A Sara
questionou a génese do teatro na Grécia. Penso que houve um teatro, um
determinado teatro, que sim, nasceu na Grécia, em Atenas, no século 5º, graças à
democracia. Uma democracia que colocou o ser humano no centro, como ser
político e ser social. A Assembleia pertencia aos homens, mas no Teatro
encontrávamos toda a gente, homens e mulheres. Como diz Edith Hall, o teatro
era o complemento natural da Assembleia. Era um espaço aberto, comum, onde se
expressava a vida em comum na “pólis”. E onde o Coro, elemento fundamental,
representava o colectivo.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Antes disso tínhamos
acontecimentos (</span><i><span lang="EL" style="line-height: 107%;">δρώμενα</span></i><span style="line-height: 107%;">) que seguiam o calendário, os ciclos da natureza, repetiam-se
todos os anos, os mesmos, envolviam mimética e improvisação. No século 5º temos
poetas cujos nomes conhecemos, temos encenação e uma reflexão crítica (além da
expressão de sentimentos que trouxe a poesia lírica do século 6º). A comédia
política de Aristófanes nasce na segunda metade do século 5º, umas décadas
depois da tragédia, quando a democracia (e a liberdade de expressão) estava
mais consolidada. E não sobrevive no século 4º... Na verdade, a democracia
durou (persistiu) durante um século. ‘Aquele’ século que nos deu ‘aquele’
teatro.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Um tema
político não é teatro político, disseram ontem. E um teatro político não
acontece necessariamente em democracia. Pensei no Belarus Free Theatre, cujos
membros fundadores e outros, depois de anos de perseguição, vivem e trabalham
hoje fora do seu país. Uma das fundadoras, Natalia Kaliada, </span><a href="https://www.thestage.co.uk/news/belarus-free-theatres-natalia-kaliada-funding-can-lead-to-self-censorship--speech-in-full"><span style="line-height: 107%;"><b>fez um discurso em 2015, no Reino Unido durante a State of the Arts
Conference No Boundaries</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Naquele discurso, Kaliada lembrava
que a companhia foi fundada numa ditadura; não existia para as autoridades, mas
existia para as pessoas e para o mundo. Mostrava-se surpreendida com a
auto-censura praticada pelos artistas britânicos para garantirem financiamento.
Alertava para o conformismo criativo que floresce em países democráticos. E
questionava: “Porque é que há tanto medo de trabalhos provocadores?”.</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMNyEMrA-dW3AIKOxpi_KWJZyP1YnTYlOE4u_2TbKBseNzX86o6Tn697buYV1Lcu-p2Yn8RfLYfDv3AdJ-0M-lYWfwEb9NJYiGlNF0gS8mQBXNIn_2aeF6ISGHoIKwrzu7CqhojxIgSolwAe87RbioU7jmifE8_ILfQEsW80JPZOOpgR2QM-BxSCsjgQ/s500/artimagem%203_nuno%20ribeiro_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMNyEMrA-dW3AIKOxpi_KWJZyP1YnTYlOE4u_2TbKBseNzX86o6Tn697buYV1Lcu-p2Yn8RfLYfDv3AdJ-0M-lYWfwEb9NJYiGlNF0gS8mQBXNIn_2aeF6ISGHoIKwrzu7CqhojxIgSolwAe87RbioU7jmifE8_ILfQEsW80JPZOOpgR2QM-BxSCsjgQ/s16000/artimagem%203_nuno%20ribeiro_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Foto: Nuno Ribeiro</span></td></tr></tbody></table><p></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Também se falou
de teatro urgente. Lembrei-me da peça </span><a href="https://www.nytimes.com/2017/02/05/theater/trump-wall-mexico-play.html"><span style="line-height: 107%;"><b>“Building the wall”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, que Robert
Schenkkan (prémio Pulitzer) escreveu em três dias no tempo da campanha de
Donald Trump (em vez de levar meses, como habitualmente). A peça foi depois
programada com igual urgência por uma série de teatros americanos. Lembrei-me
também de Rufus Norris, director artístico do National Theatre em Londres, que,
depois do referendo do Brexit, </span><a href="https://www.bbc.com/news/entertainment-arts-37387574"><span style="line-height: 107%;"><b>disse</b></span></a><span style="line-height: 107%;">: “Não acredito que 17,5 milhões de
pessoas sejam racistas ou idiotas. (…) Penso que temos de ouvir.” Assim, em
Julho-Agosto 2016, um mês depois do referendo, mandava vários dramaturgos para
diferentes territórios do país para ouvirem. Nove meses depois, as primeiras
peças, peças urgentes, eram apresentadas no palco do Teatro Nacional.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Há outras
urgências nas quais o teatro se vê envolvido, aquelas que a guerra traz. Uma
das primeiras demissões no sector cultural russo, no próprio dia em que a
invasão da Ucrânia começou ou no dia seguinte, foi a da </span><a href="https://www.theatermania.com/new-york-city-theater/news/artistic-director-of-moscows-meyerhold-theatre-res_93409.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Elena Kovalskaya</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, directora
artística do Meyerhold Theatre em Moscovo, que disse: “Não posso continuar a
receber o meu salário de um assassino”. </span><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.com/2022/03/mais-algumas-reflexoes-sobre-o-boicote.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Sou a favor do boicote cultural</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> no
que diz respeito à não manutenção de relações profissionais com instituições
culturais estatais russas. Por respeito por esta e por outras demissões. Por
respeito pela cultura da consciência e da responsabilidade individual.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">“O teatro tem a
obrigação de ser interventivo?”, perguntou-se ontem. Penso que, em primeiro
lugar, devemos poder responder à pergunta “Qual a missão do nosso teatro?”.
Reclamo muitas vezes porque as instituições culturais não sabem distinguir a
sua missão (a razão porque existem, a razão porque fazem o que fazem) do que
fazem. </span><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2021/10/teatros-nacionais-missao-impossivel.html"><span style="line-height: 107%;"><b>Num encontro organizado pelo Teatro Nacional de S. João</b></span></a><span style="line-height: 107%;"> em Outubro passado, a maioria dos directores artísticos convidados
respondeu à pergunta informando-nos sobre o que os seus teatros fazem (que é
mais ou menos o mesmo…). Temos de conhecer o nosso propósito, quem somos, quais
os nossos valores. Depois poderemos responder à pergunta “Temos obrigação de
ser interventivos?” com consciência, com coerência e sem recorrermos a acções
oportunistas.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></span></p>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgP2Ri5HPXy4oi9VH3L9MggYGFBPbwvM2qMmaADJ3vc0TIgOGYy0smmCyJLSFWOzGdE__84UgkjDl3pW80q3trwZeG5sxCSdZPQ3Wr3XjPXUu4lFwONKhxGf6BZVR1x19Ve3P9oISPxuFdz-g53brz17mG84LkP-C6TnjLZViKZh-bx6B8Zw8mlVCyFsA/s500/artimagem%204_nuno%20_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgP2Ri5HPXy4oi9VH3L9MggYGFBPbwvM2qMmaADJ3vc0TIgOGYy0smmCyJLSFWOzGdE__84UgkjDl3pW80q3trwZeG5sxCSdZPQ3Wr3XjPXUu4lFwONKhxGf6BZVR1x19Ve3P9oISPxuFdz-g53brz17mG84LkP-C6TnjLZViKZh-bx6B8Zw8mlVCyFsA/s16000/artimagem%204_nuno%20_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto: Nuno Ribeiro</td></tr></tbody></table><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;">Abordámos
também os cursos de teatro. “Como lidar com uma aluna cega? Não sei… O que é
que vai acontecer se eu lhes disser ´Corram!’? Ficarão os restantes alunos
condicionados, a pensar na sua colega?”. Desconhecemos tantas coisas e isto
resulta em medo e desconforto. E se antes de dizer “Corram!” se fizesse o reconhecimento
da sala? E o que há de mal se outros alunos estiverem conscientes ou
preocupados com a presença e participação da sua colega cega? Não é isso que
deveríamos fazer lá fora também, na rua, na sociedade? Estarmos conscientes da
presença dos outros? Trabalharmos juntos a presença de cada um no espaço comum?</span><span style="font-family: verdana;"> </span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Hoje,
levantou-se a questão de “quem manda”, reclamou-se, mais uma vez, pelo papel
dos programadores. Mas sejamos claros: Quem programa de acordo com o seu gosto
pessoal, como foi aqui dito, não é um bom programador. Quem duplica programações
não é um bom programador. Quem é um (bom) programador? Quem programa em
determinado território consciente das pessoas que o habitam, questionando: O
que é útil, o que é relevante, o que é urgente para estas pessoas? Noutras
palavras, como vamos correr juntos?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Reagimos com risos
irónicos à afirmação que os teatros e cineteatros em Portugal são programados
por profissionais desta área (porque assim o declararam nas suas candidaturas à
Rede). Não quero insinuar que houve pessoas que mentiram quando assinaram essas
candidaturas. Antes, questiono: Quantas dessas pessoas saberão o que é,
realmente, ser director artístico ou o que é programar?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Ainda em
relação a este ponto, não me parece que o aluguer de um teatro em Lisboa (o
Teatro Armando Cortês) para a apresentação do trabalho de companhias de outras
cidades seja a resposta à necessidade e ao desejo do ver este trabalho circular
pelo país e ser visto na capital. Vejamos: quem irá ver uma peça porque a
companhia é de Braga ou de Évora? A “gente do teatro”, sejamos honestos. O
facto de ser uma companhia vinda de uma outra cidade não é motivo suficiente
para muitas outras pessoas quererem assistir. As peças dessas companhias devem
ser programadas pelos teatros de Lisboa porque fazem sentido, porque são
relevantes para a missão que esses teatros assumem perante o seu público.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Vejamos </span><a href="http://www.comediasdominho.com/apresentacao/"><span style="line-height: 107%;"><b>a
missão das Comédias do Minho</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, por exemplo:
“<span style="background: white; color: black; letter-spacing: 0.25pt; mso-color-alt: windowtext;">Dotar o vale do Minho de um projeto cultural próprio,
adaptado à sua realidade socioeconómica e, portanto, com um enfoque especial no
envolvimento das populações, a partir da construção de propostas de efetivo
valor participativo e simbólico, para as comunidades a que se dirigem.” O
festival Bons Sons foi criado, em primeiro lugar, para servir as necessidades
da população da aldeia de Cem Soldos. Lembrei-me de um artigo de Joana
Villaverde, de Agosto 2020, que se intitulava </span></span><a href="https://www.publico.pt/2020/08/21/culturaipsilon/noticia/vidas-interior-importam-1928572"><span style="background: white; letter-spacing: 0.25pt; line-height: 107%;"><b>“As vidas do interior importam!”</b></span></a><span style="background: white; color: black; letter-spacing: 0.25pt; line-height: 107%;"> e onde Joana dizia que não há “interior” em Portugal, há
pessoas “interiorizadas”.</span><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEihRJF2f9g-vEOsLtwomevJJPJzzFUHXZ1YfcDcxUlgIS6Wyb8hej0gQqQFmALMKEBCwDZ2R8uvJJXR8t0PT7SQfHkQ_UHWINYqccBNy6X6eMhpPDxdlEUSZaw7WLxGCJGOvQR_9lUZTfV7Vfk0KFa9naPJ0z5KVnnKENxCHJFn265f3kz-23HU1X-PVQ/s500/artimagem%202_nuno%20ribeiro_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEihRJF2f9g-vEOsLtwomevJJPJzzFUHXZ1YfcDcxUlgIS6Wyb8hej0gQqQFmALMKEBCwDZ2R8uvJJXR8t0PT7SQfHkQ_UHWINYqccBNy6X6eMhpPDxdlEUSZaw7WLxGCJGOvQR_9lUZTfV7Vfk0KFa9naPJ0z5KVnnKENxCHJFn265f3kz-23HU1X-PVQ/s16000/artimagem%202_nuno%20ribeiro_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Foto: Nuno Ribeiro</span></td></tr></tbody></table><p></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Referiu-se
também esta manhã aos estudos de público (o da Gulbenkian, o de Braga 2027),
aos seus resultados desanimadores, à necessidade de democratizar a cultura. A
ideia da democratização da cultura soa hoje paternalista. A nova estratégia do
Arts Council England para a década 2020-2030, </span><a href="https://www.artscouncil.org.uk/letscreate"><span style="line-height: 107%;"><b>Let’s Create</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, defende a necessidade de dar a oportunidade a qualquer cidadão,
independentemente de onde vive, de ser criativo e de participar. Perceberam,
através de um estudo de públicos, que as pessoas se sentem desconfortáveis com
a chamada “alta cultura”, mas que, ao mesmo tempo, têm vidas culturais activas.
Deborah Cullinan, ex-directora do Yerba Buena Center for the Arts, </span><a href="https://ssir.org/articles/entry/civic_engagement_why_cultural_institutions_must_lead_the_way"><span style="line-height: 107%;"><b>escrevia em 2017</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, também depois
da eleição de Trump: “A base da nossa democracia é a criatividade individual e
a imaginação colectiva”. Os ingleses levaram décadas para perceber que isto não
aconteceria se continuassem a financiar principalmente as grandes instituições
culturais <i>mainstream</i> da capital.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Neste último
painel, sobre “minorias” e teatro, pensei que deveríamos falar de pessoas “minorizadas”,
como falámos de pessoas racializadas. Falámos de representatividade: Que
histórias? Escritas por quem? Encenadas por quem? Interpretadas por quem?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Falou-se do
filme “Danish Girl”, interpretado por um actor cisgénero. “Pelo menos esses
papéis deveriam ser interpretados por actores trans”. Eu não diria “pelo menos esses
papéis”, diria quaisquer papéis que uma pessoa queira representar. No entanto,
que oportunidades existem para que artistas trans possam dar a conhecer o seu
trabalho? Ser chamadas para um casting? </span><a href="https://www.thestage.co.uk/news/national-theatre-to-host-casting-event-for-transgender-actors"><span style="line-height: 107%;"><b>O National Theatre em Londres fez um casting apenas com o objectivo
de conhecer actores trans</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Dizer que “Somos todos pessoas” é
verdade e ao mesmo tempo soa um pouco a “Eu não vejo cor”… Se não vejo cor, não
vejo também a ausência da cor. E, assim, posso questionar se “a voz tem cor”,
quando </span><a href="https://magg.sapo.pt/cultura/cinema/artigos/soul-e-sobre-um-artista-negro-mas-voz-e-dobrada-por-um-branco-atores-falam-em-racismo-estrutural"><span style="line-height: 107%;"><b>o actor Marco Mendonça critica o casting para a dobragem do filme
da Disney “Soul”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Somos todos pessoas, sim, mas não
estamos todos nos lugares onde queremos (e temos o direito de) estar. Quantos
artistas negros, trans, com deficiência conhecemos pelo nome?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Lembrei-me
também que na peça “Sempre que acordo”, de Lara Mesquita, que ganhou em 2021 o
Prémio de Dramaturgia Feminina da Cepa Torta, lemos que, numa entrevista para o
financiamento de um projecto de teatro, um programador, membro do júri,
pergunta à dramaturga negra: “A sua peça vai na mesma direcção que uma outra
peça que vimos recentemente?” (presume-se que se refere à “Aurora Negra”).
Alguma vez esta questão foi colocada a um dramaturgo branco? Bastou vermos uma
peça escrita por dramaturgas negras para não ser necessário vermos mais nenhuma?
Questionar se irão todas na “mesma direcção”?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Gostaria também de me referir a um debate que participei com Maral Bolouri, artista não-binárie do Irão, que agora vive em Paris. Maral falou-nos sobre a constante “performance da opressão”, que é suposto apresentar um certo tipo de opressão, caso contrário as pessoas podem ser silenciadas. Por exemplo, entre os refugiados LGBT, apenas os homens gay têm algo a dizer; ou mulheres que vêm de uma família opressiva. Estas são as únicas histórias de interesse. Existe uma exigência para que os artistas se reproduzam de uma certa forma, reforçando ideias feitas, sem liberdade para trabalhar os temas que desejarem da maneira que acharem melhor.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">José Leitão
disse ontem que as revoluções em Portugal acontecem (paradoxalmente) nos
teatros nacionais. Fiquei a pensar nisso, em alguns “momentos-revolução” que
considero que aconteceram no Teatro Nacional D. Maria II, que é o que conheço
melhor:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 35.4pt; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 0cm 0cm 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">2016: Apresentação da peça “Uma menina perdida
no seu século à procura do pai” pelo Teatro Crinabel, no ano em que celebrava
30 anos. No final de uma das récitas, um casal pede o livro de reclamações.
“Aquelas” pessoas não deveriam estar naquele palco…<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 35.4pt; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 0cm 0cm 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">2020: Estreia da “Aurora Negra” na
Sala-Estúdio. (2022: uma cara negra nas lonas da fachada do teatro).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 35.4pt; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 0cm 0cm 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">2021: Teresa Coutinho prepara o ciclo Caryl
Churchill. No anúncio do casting diz-se que estão à procura de actrizes, cis ou
trans. Na mesma altura, “Top Girls”, de Cristina Carvalhal, é apresentado na
Sala Garrett.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 35.4pt; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 0cm 0cm 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">2021: “Calígula morreu. Eu não”. No anúncio do
casting diz-se que estão à procura de actores, com ou sem deficiência. Em
Lisboa, aparecem cerca de 40 pessoas com deficiência.</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; text-indent: 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">2022: “Mãos a dentro”, curso de formação de artistas S/surdos.</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; text-indent: 35.4pt;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">“O que mudou? E
amanhã, depois desta conversa, o que vai mudar?”. Zia Soares questionou, com razão,
a sua presença no painel. Tem havido tantas conversas como esta. Têm-se
repetido as mesmas coisas, outra e outra vez. E depois?</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Estas não são
“modas”. E cada um de nós tem de fazer o seu percurso. Tem de procurar conhecer
o que não conhece, tem de se auto-educar. Há pessoas cansadas, exaustas, que
durante muito tempo procuraram “educar-nos” sobre uma série de temas. Não
querem ter mais esse papel, não querem ser elas a ter de explicar. Por um lado,
parece que concordámos que não se disse nada de novo neste último painel. Para
mim, não, não se disse nada de novo. Mas, se recuar cinco ou seis anos, muito
do que se disse aqui hoje era-me desconhecido. Por isso, acredito que, pelo
menos algumas coisas, possam ter sido uma novidade para algumas pessoas aqui. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Penso em tudo o
que não sabia há poucos anos e no tempo e dinheiro que tenho investido para me
auto-educar sobre uma série de assuntos. Podemos esperar que cada cidadão
queira e possa fazer o mesmo? E qual o nosso papel como profissionais da
cultura neste sentido? Haverá sempre necessidade de explicar, de nos
repetirmos. E quando um se cansa, outro toma o seu lugar. Isto diz respeito a
todos nós, esta é uma responsabilidade comum. Vamos correr juntos?</span><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-45686067997890651922022-05-07T22:49:00.011+01:002022-05-08T09:38:06.705+01:00De quem é a história para contar?<p></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEghluqnGCh45T9wmRkXcNsNPvBEHCv_mmQGAO1vnqn4gpHBGwcNlXrO_G69LNfKfM9p7REm8OAfla1ACqavVzcq32LnCTsDwSoDsEuxKLCDU0fBtn3gqAHIMRwZ8a9l5QWVCt7jP-p0-QWMFezOS71CJpDQkwfd7RFND0Pvl7MOlZiidrUJbxPjox4A6Q/s500/emmets%20coffin_Justin%20T%20Gellerson_NYT.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="307" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEghluqnGCh45T9wmRkXcNsNPvBEHCv_mmQGAO1vnqn4gpHBGwcNlXrO_G69LNfKfM9p7REm8OAfla1ACqavVzcq32LnCTsDwSoDsEuxKLCDU0fBtn3gqAHIMRwZ8a9l5QWVCt7jP-p0-QWMFezOS71CJpDQkwfd7RFND0Pvl7MOlZiidrUJbxPjox4A6Q/s16000/emmets%20coffin_Justin%20T%20Gellerson_NYT.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">National Museum of African-American History and Culture, Washington D.C. (Photo: Justin T. Gellerson / NYT)</td></tr></tbody></table><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A primeira vez que ouvi falar de Emmet Till foi em 2017,
quando o quadro “Open Casket” de Dana Schutz, exposto na Biennal do Whitney
Museum, provocou uma enorme controvérsia. Emmet Till foi brutalmente
assassinado, linchado, em 1955, após ter sido acusado de ter ofendido uma mulher
branca na sua mercearia. <span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">Este assassinato impulsionou o Movimento dos Direitos Civis
nos EUA. </span>A mãe de Emmet, Mamie Till, <span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">pediu que o caixão permanecesse
aberto durante o funeral do seu filho para as pessoas verem. As suas palavras
recebem os visitantes no National Museum of African American History and
Culture: “Deixem as pessoas ver o que eu vi. Penso que todas as pessoas
precisam de saber o que aconteceu a Emmet Till.”<span></span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white;"><o:p></o:p></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">No
passado, escrevi sobre este e outros casos num post intitulado </span><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2018/05/apropriacao-cultural-menos-guardioes.html"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>“Apropriação cultural: menos guardiões, mais pensadores
críticos”</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">. Em
2017, houve críticos que defenderam que Schutz, sendo branca, não deveria
abordar esta história, não era sua para contar. Activistas colocaram-se à
frente do quadro, para obstruir a visualização, e houve quem defendeu a
destruição da obra. Por outro lado, a historiadora de arte cubana, Coco Fusco,
alertava: “Presumir que os apelos pela censura e destruição constituem uma
resposta legítima ao que é considerado por alguns uma injustiça leva-nos por um
caminho muito sombrio. (…) A autoridade para falar por ou sobre a cultura negra
não é garantida pela cor da pele ou linhagem, e pode ser prejudicada por
inverdades. Os meus 25 anos a ensinar arte mostraram-me que uma combinação de
ignorância sobre a história e supremacia do formalismo na arte-educação - mais
do que o racismo - está por trás do fracasso da maioria dos artistas de
qualquer origem em lidar efectivamente com questões raciais.”</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Voltei
a cruzar-me com esta história ao ler o livro de Laura Raicovich <i>Culture
strike: Art and museums in an age of protest</i>. A autora cita diferentes
críticos. A artista Pastiche Lumumba defendeu que “É insensível e gratuito para
a artista, em primeiro lugar – e depois para os curadores e o museu – participar
voluntariamente na longa tradição de pessoas brancas a partilhar e fazer
circular imagens de violência anti-negra.” A artista Hannah Black afirmou que
“As pessoas não-negras devem aceitar que nunca vão encarnar nem poderão
compreender este gesto [o da Mamie Till pedir para o caixão ficar aberto]. (…)
Se as pessoas negras lhe dizem [à Dana Schutz] que o quadro causou uma mágoa
desnecessária, ela e vocês devem aceitar a verdade disto. A pintura deve ser
retirada.” Raicovich cita ainda Coco Fusco que, em resposta à Hannah Black,
disse: “Presume uma capacidade de falar por todas as pessoas negras que cheira
a um nacionalismo cultural que raramente serviu às mulheres negras, e que no
passado foi usado para manter os artistas negros britânicos fora de conversas
sobre a cultura negra nos Estados Unidos.” Raicovich alinha com os opositores
da exposição do quadro. À afirmação de Dana Schutz (“Não sei o que é ser negro
na América, mas sei o que é ser mãe. Emmet era o único filho de Mamie Till. A
ideia de que qualquer coisa possa acontecer à tua criança ultrapassa qualquer
compreensão. A dor deles é a tua dor. O meu envolvimento com esta imagem foi
através da empatia que senti pela sua mãe.”) Raicovich responde: “As objeções
a este sentimento são claras; como mulher branca, não tem qualquer ideia do que
significa ser mãe de uma criança negra.”</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiS2J9iMNVuHLZsdvQA4_pN4J0BiU-iif50z9gOH9IZlNlJBJRvNxhrepN7jfmXZLGxcY-ya68clU_yvTkLSyZ3CqnHsJWEU_zSrPdxkJdKuovCSaN1prESTcMtTyqdLhlmzxmTTwgkuct5Zikcl5VSf4RFUjJ69I5Zv1-UlWPDuRkVxZpPM4hkDbgiwA/s500/emmet.png" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="496" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiS2J9iMNVuHLZsdvQA4_pN4J0BiU-iif50z9gOH9IZlNlJBJRvNxhrepN7jfmXZLGxcY-ya68clU_yvTkLSyZ3CqnHsJWEU_zSrPdxkJdKuovCSaN1prESTcMtTyqdLhlmzxmTTwgkuct5Zikcl5VSf4RFUjJ69I5Zv1-UlWPDuRkVxZpPM4hkDbgiwA/s16000/emmet.png" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Protest at the Whitney Museum (Image taken from <a href="https://www.dazeddigital.com/artsandculture/article/35219/1/black-artists-protest-emmett-till-painting-by-white-artist" target="_blank">Dazed</a>) </td></tr></tbody></table><span style="background-color: white; font-family: verdana;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal"><span style="background-color: white; font-family: verdana;">Soube
através do livro de Raicovich que há quem defende que as histórias de violência
contra pessoas negras pertencem aos artistas negros; que os artistas brancos
devem retratar os agressores. Continuo a não concordar com a ideia que se pode
ditar os temas com os quais qualquer artista se possa envolver ou não. Por
isso, achei muito mais necessária e relevante a discussão à volta da obra em
si. Christina Sharpe, professora de English Literarature and Black Studies, diz
que a superfície abstracta da pintura anula, reprime ou abandona mesmo a violência
desobstruída transmitida pela fotografia que Mamie Till deu permissão para ser reproduzida.
O artista Lyle Ashton Harris disse que “Qualquer horror redentor que esteja na
fotografia original foi silenciado pelo que é, na verdade, uma representação
pictórica abstrata de uma imagem que, de uma forma perturbadora, não assume
qualquer compromisso.” Estas análises permitiram-me olhar de outra forma para o
trabalho de Schutz, de compreender de outra forma a dor e a raiva que esta
possa ter provocado, sem lhe retirar, no entanto, o direito de abordar esta
história.</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">A
história de Emmet Till foi alvo de uma nova controvérsia mais recentemente, quando
em Março uma petição assinada por milhares de pessoas exigiu o cancelamento de <i>Emmet
Till, A New American Opera</i> (ler </span><a href="https://www.newsweek.com/petition-calls-cancel-disgraceful-opera-based-murder-emmett-till-1689652"><span style="background: white; line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">). A ópera tem como base uma peça de 2013, <i>Down in My
Heart</i>, escrita pela dramaturga branca Clare Coss e a compositora negra Mary
D. Watkins. Mya Bishop, a estudante que iniciou a petição, escreveu: “Se vamos
contar a história de Emmett Till, deve ser apenas de uma perspectiva negra, um
escritor negro e a permissão e aprovação da família de Till. Clare Coss ultrapassa
os limites ao assumir a responsabilidade de transformar o trauma negro em
entretenimento e ao explorar uma tragédia negra para impulsionar a sua carreira
e sentir-se aliviada de sua culpa de branca.”</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Clare
Coss (86 anos) e Mary D. Watkins (83 anos) têm ambas memórias do linchamento de
Emmet Till. O envolvimento de Watkins na peça não é referido na petição, que se
centra no facto de haver uma criadora branca na equipa. Watkins emitiu um
comunicado em que se manifesta muito perturbada pelo facto das pessoas
condenarem a peça sem a ter visto ou ouvido (o que faz lembrar a forma como
muitas pessoas, em Portugal e noutros países, reagiram à apresentação de <i>Catarina
e a beleza de matar fascistas</i>, de Tiago Rodrigues). “Pegaram no facto de a
dramaturga ser branca e assumiram todo o tipo de coisas sobre o conteúdo da
peça. Embora haja muitos artistas de cor envolvidos neste projecto, os críticos
assumem que não tivemos nenhum impacto sobre a forma final da peça e que a
dramaturga de alguma forma nos forçou a todos a contar a sua história. É um
insulto para mim, como mulher negra, e para os membros da companhia que são
afro-americanos." Uma porta-voz da produtora referiu num comunicado que "A
ópera aborda também outros temas e personagens de cor, incluindo a coragem do
tio de Till, Mose Wright, o fracasso do sistema judicial e o dilema do
professor branco que representa os conceitos de silêncio branco e supremacia
branca."</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Olhamos
para as comunidades como se fossem homogéneas, como se todas as pessoas brancas
ou negras ou outras pensassem, sentissem e se posicionassem da mesma forma face
a diversos temas e dilemas. Precisamos de estar abertos a diferentes pontos de
vista, só assim teremos a oportunidade de conhecer e entender melhor as nuances
que estes assuntos e experiências de vida apresentam. Continuo a pensar que
isto não vai acontecer se procurarmos controlar as narrativas, definir sobre o
que é que um artista ou qualquer outra pessoa pode ou não falar e, pior, se
considerarmos legítimo impedir o acesso a uma obra ou pedir a sua destruição.</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Sugestões de leitura:</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Siddhartha Mitter, <a href="https://hyperallergic.com/368012/what-does-it-mean-to-be-black-and-look-at-this-a-scholar-reflects-on-the-dana-schutz-controversy/" target="_blank"><b>“What Does It Mean to Be Black and Look at This?” A Scholar Reflects on the Dana Schutz Controversy</b></a>, in <i>Hyperallergic</i>, 24.3.2017</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Coco Fusco, <b><a href="https://hyperallergic.com/368290/censorship-not-the-painting-must-go-on-dana-schutzs-image-of-emmett-till/" target="_blank">Censorship, not the painting, must go: On Dana Schutz's image of Emmet Till</a></b>, in <i>Hyperallergic</i>, 27.3.2017</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-42988373479977371952022-03-07T11:26:00.006+00:002022-04-18T16:24:08.377+01:00Mais algumas reflexões sobre o boicote cultural<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjJoLX-VLkhmLbuZ62rHGTtpbcZgi9GbCJIlnINp6B94wzLVQ0YjeTwL5DKpbNl2QbiDYhzPCB_W8MNjn_OOcjvVo7eRNV7x-8X4Xyrh-UzPwsrJP_RAsrn_K1IT34a3zAsyNreDRmW2md6FZFgvWI3MM5qkLUpbYdB0-GhoauEkSNkgvDigxet7JjpIg=s500" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjJoLX-VLkhmLbuZ62rHGTtpbcZgi9GbCJIlnINp6B94wzLVQ0YjeTwL5DKpbNl2QbiDYhzPCB_W8MNjn_OOcjvVo7eRNV7x-8X4Xyrh-UzPwsrJP_RAsrn_K1IT34a3zAsyNreDRmW2md6FZFgvWI3MM5qkLUpbYdB0-GhoauEkSNkgvDigxet7JjpIg=s16000" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">State Hermitage Museum.</td></tr></tbody></table><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><br />Tenho estado a acompanhar intensamente as notícias sobre a
invasão da Ucrânia, a pensar nas formas como poderemos contribuir e ser úteis,
tanto como indivíduos, como como profissionais do sector cultural. O meu ponto
de partida é que a Cultura é tudo menos apolítica e, neste contexto, um dos
temas mais controversos é o do boicote cultural.<o:p></o:p></span></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">As coisas estão se movendo rapidamente. <b><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.com/2022/03/boicote-cultural.html" target="_blank">Há apenas três dias, escrevi que não tinha conhecimento de nenhuma acção formal no sentido de cancelar artistas russos</a></b> apenas porque são russos ou de remover compositores russos dos programas
de concertos. No entanto, no Sábado passado, <b><a href="https://www.nytimes.com/2022/03/05/arts/music/russian-artists-putin.html" target="_blank">li o artigo de Javier C. Hernández no The New York Times</a></b> sobre a expectativa expressa por várias entidades culturais para que artistas
russos “esclareçam a sua posição”; sobre o cancelamento do concerto do jovem
pianista Alexander Malofeev em Vancouver “pela sua própria segurança”; ou sobre
a Ópera Nacional da Polónia ter desistido de uma produção de “Boris Godunov” de
Mussorgsky… Definitivamente, as coisas estão a ficar descontroladas. O próprio
Malofeev escreveu no Facebook que “A verdade é que todos os russos se sentirão
culpados durante décadas pela terrível e sangrenta decisão que nenhum de nós
poderia influenciar e prever”. Pergunto-me se terá sido “satisfatório” o
suficiente…<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Ao mesmo tempo, uma colega chamou a minha atenção para <b><a href="https://ucf.in.ua/en/news/boycott_russia" target="_blank">o apelo da Ukrainian Cultural Foundation</a></b>,
que nos pede, entre outras coisas, para “Cancelar qualquer cooperação com
artistas russos, não importa quão grandes ou famosos, desde que apoiem
abertamente o regime de Putin, silenciem os seus crimes ou não se oponham
pública e directamente a ele”. Não vou ser insensível ao sofrimento e à raiva
de todos os ucranianos, e especialmente de nossos colegas no campo da cultura.
Mas precisamos procurar formas de pressionar que não atinjam
indiscriminadamente “qualquer coisa russa”. Isto não seria justo, respeitoso ou
eficaz. Também não devemos exigir de outras pessoas, profissionais da cultura e
todas os outros, que façam coisas que nós próprios não fazemos, ou seja, denunciarmos
políticos maus, corruptos ou inúteis - todos nós os temos e, se o fizéssemos,
não enfrentaríamos o tipo de repressão que os russos enfrentam.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Outro ponto levantado pela minha colega é que, na altura da
guerra na Jugoslávia, nada terá reforçado mais Milosevic e o seu louco frenesim
de guerra quanto o boicote cultural e o isolamento total da Sérvia. "Isso
alimentou e encorajou o nacionalismo e fez com que pessoas normais simplesmente
odiassem, tivessem medo e desconfiassem de qualquer coisa que viesse do
Ocidente, até hoje." Essa é uma possibilidade real, é claro, especialmente
se considerarmos que o regime de Putin exerce um controlo absoluto sobre os
meios de comunicação. Muitos, mesmo muitos russos não têm ideia do que está a acontecer,
porque “não o disseram na TV” e eu li mais que uma reportagem sobre pessoas
mais velhas chateadas com os seus filhos que lhes contam uma história
diferente. Ao mesmo tempo, mesmo neste momento, antes que as consequências do
BDS (Boicote, Desinvestimento, Sanções) sejam realmente sentidas pelos russos
comuns e antes que os corpos de soldados russos comecem a ser entregues às suas
famílias para serem enterrados, alimentando a raiva contra os ucranianos,
muitos, mesmo muitos russos saem em defesa das decisões de seu presidente e afirmam
confiar na sua opinião. <b><a href="https://www.aljazeera.com/news/2022/3/7/russia-kuliak-faces- disciplinary-action-after-showing-z-symbol" target="_blank">Fiquei indignada ao ler<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>que o ginasta russo Ivan Kuliak colocou
a letra “ Z” na frente da sua roupa</a></b> (símbolo de apoio à invasão da Rússia) estando
no pódio, ao lado do ucraniano Illia Kovtun, que ganhou a medalha de ouro.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Assim, precisamos de pensar cuidadosamente sobre formas de
não ostracizar indiscriminadamente artistas russos e outros profissionais da
cultura só porque são russos, de manter abertos os canais de colaboração e
apoio, de ajudar a divulgar as notícias e também de pressionar o regime de todas
as maneiras que estiverem ao nosso alcance. E uma opção é o BDS (Boicote,
Desinvestimento, Sanções), actualmente usado contra Israel e antes disso na
África do Sul. Os objectivos do BDS devem ser explicados publicamente e
amplamente, da maneira mais clara possível. No ano passado, o jornalista Chris
McGreal, que trabalhou tanto na África do Sul como em Israel, <b><a href="https://www.theguardian.com/world/2021/may/23/israel-apartheid-boycotts-sanctions-south-africa" target="_blank">escreveu no The Guardian</a></b> sobre o como o BDS ajudou a aumentar a consciencialização em todo o mundo e a
pressionar o regime de Apartheid, até que os sul-africanos conseguiram se
livrar dele.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Alguns colegas acreditam que, perante um movimento BDS
forte e generalizado contra o regime de Putin, a cultura, e especialmente as
artes, são uma excepcão. Dizem que cultura é colaboração, respeito, valores e
compreensão entre as pessoas. Jacques Marquis, da Cliburn Foundation, <b><a href="https://www.nytimes.com/2022/03/05/arts/music/russian-artists-putin.html" target="_blank">foi citado no artigo do New York Times</a></b>,
dizendo que a sua organização achava que era importante manifestar-se ao ver
artistas russos sob escrutínio. “Podemos ajudar o mundo mantendo a nossa
posição e concentrando na música e nos artistas”, disse ele. Pergunto-me, não é
isso que temos feito o tempo todo? Jacques Marquis está a sugerir que devemos continuar
como se nada tivesse acontecido? Está disposto a colaborar com uma organização
financiada pelo regime de Putin como se tudo isso fosse muito civilizado, em
prol da arte e dos artistas? E que tipo de arte seria essa, quando os artistas
e todos os outros russos não têm permissão para falar a favor da paz ou
mencionar a palavra “guerra”?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Houve mais um ponto no artigo de Hernández no New York
Times que me lembrou do quão pouco preparados estamos para reconhecer que a
cultura e as artes têm um papel e um discurso políticos, mesmo quando
reivindicam neutralidade. Lê-se que “As tensões colocam um dilema para as
instituições culturais e para aqueles que as apoiam. Muitos têm tentado posicionar-se
acima dos acontecimentos da actualidade e acreditam profundamente no papel que
as artes podem desempenhar na superação das divisões. Neste momento, os gestores
culturais, que têm pouca experiência geopolítica, encontram-se no meio de uma
das questões mais politicamente carregadas das últimas décadas, com pouca
experiência prévia na qual se pudessem apoiar.” Então, os gestores culturais
não são também cidadãos? Vivem numa ilha remota, isolados do mundo? Para que
servem, então, as suas organizações?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Outro ponto que não devemos esquecer é que a Cultura sempre
foi importante para ditadores e autocratas. Eles usam-na na sua propaganda de
normalidade e civilidade. No seu artigo <b><a href="https://hyperallergic.com/715271/how-the-hermitage-museum-artwashes-russian-aggression/" target="_blank">How the Hermitage Museum Artwashes Russian Aggression</a></b>,
Rachel Spence lembra-nos que “muito antes da invasão na Ucrânia, havia razões
para questionar parcerias de entidades estrangeiras, a maioria das quais totalmente
acrítica, com instituições estatais russas”. Refere-se especificamente à colecção
Morozov, actualmente em exposição na Fundação Louis Vuitton, apresentando obras
emprestadas do <span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">State Hermitage Museum, e também do State Tretyakov Museum e do Pushkin
State Museum of Fine Arts</span>. Embora esta seja uma fundação privada, Macron
e Putin contribuem com textos para o catálogo e Putin escreve eloquentemente
sobre o poder da diplomacia cultural. O director do Hermitage, Mikhail
Piotrovski, orgulha-se de ser o homem de Putin nesta “ofensiva cultural”
(palavras de Putin) e vice-versa.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Onde me posiciono e o que sugiro neste momento?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"></p><ul style="text-align: left;"><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Acredito que todos nós temos de ser muito cuidadosos e
vigilantes e não permitir nenhum acto de discriminação contra profissionais da
cultura ou artistas russos (vivos ou mortos) com base na sua nacionalidade.<br /><br /></span></span></li><li><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Os profissionais da cultura russos não devem ser forçados a
expressar as suas opiniões políticas ou a clarificar a sua posição para
participar em projectos internacionais.<br /><br /></span></span></li><li><span style="font-family: verdana;">Neste momento, não devemos colaborar com organizações
culturais estatais russas ou apresentar obras que tenham recebido financiamento
estatal. Não se trata de penalizar indivíduos, embora eles venham a ser afectados
(como muitas outras pessoas boas noutras áreas profissionais). Trata-se de ter
consciência sobre quem essas organizações representam, de quem recebem financiamento;
trata-se de ter consciência da maneira como usam a cultura para minimizar ou
até mesmo encobrir os seus actos de brutalidade, tanto na Rússia como na
Ucrânia.</span></li></ul><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Isto não pode ser irrelevante para nós, senão, de que
cultura estamos a falar? E de que valores? Onde é que traçamos a linha vermelha?
E o que devemos dizer aos artistas e profissionais da cultura ucranianos que tão
cedo não participarão em nenhuma conferência ou residência artística porque
estão a defender o seu país, seja porque foram recrutados ou porque se
voluntariaram?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O BDS pode ajudar a consciencializar todo o mundo e os russos.
Pode enviar uma mensagem de apoio e solidariedade aos russos que encontram
coragem para enfrentar um regime que pune a dissidência. Pode enviar uma
mensagem de apoio e solidariedade ao povo ucraniano, que trava uma guerra
brutal defendendo o seu país. E, finalmente, pode enviar uma mensagem e talvez
pressionar a maioria silenciosa, que muitas vezes se sente impotente e compreensivelmente
assustada ao lidar com um regime autoritário. Ninguém está numa posição de
pedir ou esperar actos heróicos, não seria decente. Mas todos nós precisamos de
entender que, embora não sejamos culpados pelos actos brutais ou imorais dos
nossos governantes, temos uma responsabilidade para com o nosso país, os nossos
co-cidadãos e para com o mundo.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Ler também</b></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Pjotr Sauer and Andrew Roth, <a href="https://www.theguardian.com/world/2022/apr/17/ges-2-moscow-empty-gallery-fleeing-artist-russia-cultural-uncoupling-from-west" target="_blank"><b>Empty galleries and fleeing artists: Russia’s cultural uncoupling from the west</b></a>. In The Guardian, 17.4.2022 </span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Mais neste blog sobre o papel político das organizações
culturais:</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2021/04/o-poder-de-agir.html" target="_blank">O poder de agir</a></b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/09/os-nossos-valores-cha-e-simpatia.html" target="_blank">Os nossos valores “chá e simpatia”</a></b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2013/07/apenas-um-museu-apenas-uma-artista.html " target="_blank">“Apenas” um museu, “apenas” uma artista?</a></b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span lang="EN-GB" style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2014/03/ser-apenas.html" target="_blank">Ser “apenas”</a></b><o:p></o:p></span></span></p><br /><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-17238743268203855102022-03-04T16:59:00.007+00:002022-04-18T16:20:12.634+01:00Boicote cultural<p> </p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiyCtN_cMt16zLoFaI6-IQh50wYTsKLKShgbTm90K5pleEhy2XESyXkn6wARi85yQhVD2H2jY0mdkANZsTB2hZggItq0tk0uuu3oPlhc_L9gJThEtktUkNHqRtoEe0N2K5_llYhxBixz2-mL4obS8lwQmlnbfSU7tzMebOM9N0uXmKVazTNd19r6o1L7w=s500" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiyCtN_cMt16zLoFaI6-IQh50wYTsKLKShgbTm90K5pleEhy2XESyXkn6wARi85yQhVD2H2jY0mdkANZsTB2hZggItq0tk0uuu3oPlhc_L9gJThEtktUkNHqRtoEe0N2K5_llYhxBixz2-mL4obS8lwQmlnbfSU7tzMebOM9N0uXmKVazTNd19r6o1L7w=s16000" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Elena Kovalskaya. Screenshot do Facebook.</td></tr></tbody></table><br /><p></p><p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;">Há alguns dias, <b><a href="https://hyperallergic.com/714636/thousands-of-russian-artists-denounce-invasion-in-open-letter/" target="_blank">milhares de artistas russos assinaram uma carta aberta</a></b></span><span style="font-family: verdana;"> denunciando a invasão na Ucrânia. “Em nome da nossa comunidade profissional, é
importante dizer que uma maior escalada da guerra resultará em consequências
irreversíveis para os trabalhadores da cultura e das artes. O envolvimento com
a cultura e as artes será quase impossível nessas condições.”</span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">É impossível, para pessoas de ambos os lados e para muitas
outras, para todos nós. É impossível no sentido de que o <i>show can’t simply go
on</i> e não pode ser <i>business as usual</i>. Simplesmente não pode.<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Algumas pessoas, colegas no sector cultural e outros
cidadãos preocupados, começaram a expressar o seu desacordo no que diz respeito
ao que chamam de “cancelamento de artistas russos” ou “censura” ou… ou…. Pelo
que tenho visto, os únicos dois artistas que podemos dizer que foram,
pessoalmente, “cancelados” são o maestro Valery Gergiev (um grande e
desavergonhado aliado de Putin) e a cantora de ópera Anna Netrebko (que eu considero
uma cidadã bastante inconsciente e para mim, apesar de sua excelência, uma
artista bastante irrelevante). Pelo que sei, não houve uma exigência para que
“todo e qualquer russo repudie Putin antes de poder apresentar-se na América ou
na Europa”, como afirma <b><a href="https://www.newyorker.com/culture/cultural-comment/valery-gergiev-and-the-nightmare-of-music-under-putin" target="_blank">Alex Ross num muito bom artigo no The New Yorker</a></b>.
Também não tenho conhecimento de qualquer “conversa sobre a remoção de
compositores russos dos programas”. Talvez ainda não sejam propostas formais,
mas apenas “conversas”, por isso devemos garantir que não se transformem em
propostas ou práticas oficiais. Cancelar um artista russo, vivo ou morto, por
ser russo seria absurdo e inaceitável. Mas será isso que está a acontecer neste
momento?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O <b><a href="https://www.festival-cannes.com/en/infos-communiques/communique/articles/statement-from-the-festival-de-cannes-on-the-situation-in-ukraine" target="_blank">Festival de Cinema de Cannes emitiu um comunicado</a></b> dizendo que “a menos que a guerra de invasão
termine em condições que satisfaçam o povo ucraniano, foi decidido que não
receberemos delegações oficiais russas nem aceitaremos a presença de qualquer
pessoa ligada ao governo russo”. Ao mesmo tempo, saudou “a coragem de todos
aqueles na Rússia que correram riscos para protestar contra o assalto e a
invasão da Ucrânia. Entre eles estão artistas e profissionais do cinema que
nunca deixaram de lutar contra o regime contemporâneo, que não podem ser
associados a essas acções insuportáveis e aqueles que estão a bombardear a
Ucrânia”. E acrescentou: “Fiel à sua história que começou em 1939 com a
resistência à ditadura fascista e nazi, o Festival de Cannes irá sempre servir
artistas e profissionais da indústria que levantam a voz para denunciar a
violência, a repressão e as injustiças, com o objectivo principal de defender a
paz e a liberdade”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O maestro russo <b><a href="https://www.semyonbychkov.com/news/withdrawal-from-russian-engagements/" target="_blank">Semyon Bychkov cancelou os seus concertos</a></b> deste
verão com a Russian Youth Orchestra.
“Quero que o espírito desta decisão seja inequivocamente claro: não é de forma
alguma dirigido à orquestra ou ao seu público. O sofrimento emocional do povo
russo neste momento, o sentimento de vergonha e as perdas económicas que ele sofre
são reais. Assim como a sensação de desamparo perante a repressão infligida
pelo regime. Aqueles indivíduos que se atrevem a opor-se a esta guerra colocam as
suas próprias vidas em perigo. Precisam de nós, que somos livres para nos
posicionarmos e dizermos: ‘As armas devem calar-se, para que possamos celebrar
a vida sobre a morte’”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mais casos de apresentações e colaborações canceladas foram
relatados pelo <b><a href="https://www.theguardian.com/world/2022/mar/01/the-show-cant-go-on-russian-arts-cancelled-worldwide" target="_blank">The Guardian</a></b> e outros meios de comunicação (<b><a href="https://www.artsprofessional.co.uk/news/pressure-arts-sector-cut-russian-ties" target="_blank">aqui</a></b> e <b><a href="https://www.nytimes.com/2022/03/04/movies/film-boycott-russia-ukraine.html" target="_blank">aqui</a></b>).
Pelo que tenho visto, referem-se a um boicote às relações profissionais com organizações culturais financiadas pelo Estado ou obras
financiadas por este. Isso não é novo. Tem acontecido várias vezes no
passado em relação a organizações culturais e obras de arte financiadas pelo
Estado de Israel (mais sobre <b><a href="https://bdsmovement.net/cultural-boycott" target="_blank">Cultural BDS</a></b>).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Aqueles que se opõem ao boicote <b><a href="https://c7nema.net/producoes/item/110449-apos-criticas-de-sergei-loznitsa-academia-europeia-de-cinema-junta-se-no-boicote-ao-cinema-russo.html" target="_blank">expressam a sua preocupação</a></b>
de que “Ao banir essas pessoas de eventos internacionais, a Europa está a
silenciar a voz de protesto russa, isolando as pessoas que querem parar a
guerra no meio daquelas que querem intensificá-la”. Dizem que “entenas e
milhares de trabalhadores culturais russos discordaram abertamente da decisão
do governo de iniciar uma guerra: eles condenam as suas ações, vão a protestos,
apoiam a Ucrânia, e correm o risco de serem condenados por traição. Quase todos
eles não votaram em Putin”.
A minha boa amiga e colega Marta Porto questiona https://exame.com/colunistas/cultura-e-sociedade/cancelar-artistas-e-atletas-russos-nao-leva-a-lugar-nenhum/:
“Se as instituições culturais em momentos de crise não são capazes de proteger
artistas e defender a liberdade de criação, mobilidade e trabalhos artísticos,
qual é a essência do seu trabalho?” Fez até uma pergunta mais difícil ainda no
Facebook: “Afinal, eles [os artistas] devem ser punidos [ou responsabilizados]
pelas decisões extremas de seus governantes?”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">É sobre este ponto que acredito que precisamos de pensar um
pouco melhor.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">As pessoas (e não apenas os artistas) devem ser punidas
pelas decisões e acções extremas de seus governantes? Não, não devem. As
pessoas (incluindo os artistas) são responsáveis pelas decisões e ações dos
seus governantes? Acho que sim, todos somos responsáveis e a questão aqui é
se e como entendemos essa responsabilidade e o que fazemos a respeito. Nesse
sentido, a cultura, a meu ver, não é excepcional, as pessoas que trabalham
neste sector (artistas e outros) não são excepcionais.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Em todas as actividades económicas que serão atingidas pelo
Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), encontraremos pessoas que se
manifestam contra Putin e condenam as suas acções, vão a protestos, apoiam a
Ucrânia e arriscam a sua liberdade ou até mesmo sua integridade física. Ao
mesmo tempo, na Cultura e em todos os outros campos, encontraremos pessoas que permanecem
caladas, por vários motivos. Não desejo julgar ninguém nem exigir nenhum acto
de heroísmo. É o que é. O que quero sobretudo dizer é que a Cultura não é excepcional.
Em momentos de crise e de dilemas éticos, as pessoas no sector cultural ou que têm
negócios com o sector cultural não são diferentes.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Então, o que devemos fazer?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A cultura não é apolítica. Assim, é natural que em graves momentos
políticos, como o que estamos a viver, a Cultura esteja envolvida. Como já
disse, cancelar artistas por serem russos é absurdo e inaceitável. Boicotar
organizações culturais estatais e obras financiadas pelo Estado, no entanto, é
uma questão totalmente diferente. O movimento BDS mostrou que é uma forma de
pressão e também de quebrar o silêncio e de consciecializar. Não é um movimento
contra artistas individuais e profissionais da cultura (embora isso os afecte),
mas contra o que essas organizações representam, de quem elas recebem dinheiro
e para fazer o quê.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Isso leva-me a um segundo ponto: no primeiro dia da guerra,
a directora artística do Meyerhold Theatre
and Cultural Centre, <b><a href="https://www.theatermania.com/new-york-city-theater/news/artistic-director-of-moscows-meyerhold-theatre-res_93409.html" target="_blank">Elena Kovalskaya, apresentou a sua demissão em protesto contra a invasão na Ucrânia</a></b> dizendo que “É impossível trabalhar para um
assassino e receber um salário dele”.
Mais directores artísticos, artistas e profissionais da cultura russos demitiram-se
dos seus cargos ou abandonaram projectos e muitos mais assinaram a carta aberta
mencionada no início deste post. Estas são as pessoas do lado russo que deveriam ser de maior
preocupação para nós agora. Estas são as pessoas (e <b><a href="https://www.newyorker.com/news/q-and-a/how-russias-nobel-winning-newspaper-is-covering-ukraine" target="_blank">não devemos esquecer tambémos jornalistas</a></b> e muitos outros) que formam, geralmente,
a minoria que não tem medo de falar, de correr riscos e que acaba por ser
responsável por mudanças tão desejadas. Estas são as pessoas que, como diria
Marta Porto, devemos proteger e apoiar. Mas isso não vai acontecer, não deve
acontecer, continuando o <i>business as usual</i> com certas organizações
culturais. Penso que isto não seria responsável ou respeitoso, simplesmente
cancelaria os seus actos de coragem e decência.</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-34040784353916553562022-02-23T10:27:00.003+00:002022-02-23T13:04:59.555+00:00Os hábitos culturais… das organizações culturais portuguesas<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiG7XTZ9ZzEOa_9tJj2PktNh4KkeYO8GkfIOnzlEjpKBj7c5GRrhl0dlo_RrxpGGux4rmP65v3vpqrz9mqOqDcSfP3fgpiPC-YjW6sacPI7n0zEx39P_ujEGS4Ky_sr6kjb-jWNfpLeNTpfRiIVvlqRiPmDv3ryX-dwqVstlX5gnnrDxnd4Zk-586dgAQ=s500" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiG7XTZ9ZzEOa_9tJj2PktNh4KkeYO8GkfIOnzlEjpKBj7c5GRrhl0dlo_RrxpGGux4rmP65v3vpqrz9mqOqDcSfP3fgpiPC-YjW6sacPI7n0zEx39P_ujEGS4Ky_sr6kjb-jWNfpLeNTpfRiIVvlqRiPmDv3ryX-dwqVstlX5gnnrDxnd4Zk-586dgAQ=s16000" /></a></div><br /><p></p><p></p><p class="MsoNormal"><span style="background: white; font-family: verdana; line-height: 107%;">“Muitas pessoas sentem-se desconfortáveis com o rótulo 'as artes' e
associam-no apenas às artes visuais ou à 'alta cultura', como o bailado ou a
ópera. (…) Ao mesmo tempo, a maioria das pessoas neste país tem vidas culturais
activas e valoriza oportunidades para ser criativa.” As frases não foram
retiradas da publicação do estudo da Fundação Gulbenkian sobre os hábitos
culturais dos portugueses. Foram retiradas do documento do Arts Council England
<b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/02/onde-estao-as-oportunidades-proposito.html" target="_blank"><i>Let’s Create</i>, que apresenta a sua estratégia para a década 2020-2030</a></b></span><span style="background: white; font-family: verdana; line-height: 107%;">. No
contexto português, a primeira frase soa muito familiar; o estudo português não
confirma a segunda, mas poderia ser um desejo. Será…?<span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">No Reino Unido, e especificamente na Inglaterra, não se ficou pelo
desejo. Nos anos 1950, o académico Raymond Williams, ao defender um maior
investimento nas artes (e também na aprendizagem ao longo da vida), esclarecia que
este não deveria servir apenas para apoiar as grandes instituições nacionais,
mas também para acolher, encorajar e fomentar as tendências regionais de
recreação, que começavam a manifestar-se, “pois, a cultura é comum, uma pessoa
não deveria ter de ir a Londres para a encontrar”. Muitos anos mais tarde, já
no século 21, são desenvolvidos projectos culturais que colocam o foco no
cidadão, qualquer cidadão, onde quer que esteja. O <b><a href="https://www.creativepeopleplaces.org.uk/" target="_blank">Creative People and Places</a></b></span><span style="background: white; color: #444444; line-height: 107%;"> </span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">(apoiado pelo Arts Council England)
pretende criar condições para que as pessoas possam escolher, criar e
participar em experiências artísticas brilhantes nos lugares onde vivem. O <b><a href="https://funpalaces.co.uk/" target="_blank">Fun Palaces</a></b></span><span style="background: white; color: #444444; line-height: 107%;"> </span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">(cuja fundadora Stella Duffy tivemos
a oportunidade de ouvir no <i>Isto é Partis</i> da Fundação Gulbenkian em 2020)
trabalha no terreno para que todos possam ter uma opinião sobre o que conta
como cultura, onde acontece, quem a faz e quem usufrui dela. Foi precisamente o
que defendia em 2017 o estudo do King’s College London</span> <i><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"><b><a href="https://www.kcl.ac.uk/cultural/resources/reports/towards-cultural-democracy-2017-kcl.pdf" target="_blank">Towards cultural democracy: promoting cultural capabilities for everyone</a></b></span></i><i><span style="background: white; color: #444444; line-height: 107%;">:</span></i><span style="background: white; color: #444444; line-height: 107%;"> </span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">“uma liberdade social
substancial para criar versões de cultura; (...) liberdades reais e concretas
para escolher que cultura fazer, bem como que cultura valorizar. (…) Oportunidades
para ver e ouvir coisas; coisas novas, coisas velhas, coisas estranhas, coisas
bonitas, coisas divertidas e coisas ferozes; coisas que mobilizam, confundem e
movem; coisas que confortam e coisas que inspiram.”</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Chegámos assim ao ano 2020, para o Arts Council England assumir como um
dos objectivos da sua estratégia para a próxima década “</span>v<span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">alorizar o
potencial criativo de cada um de nós, proporcionar às comunidades de todos os
cantos do país mais oportunidades para apreciar a cultura e celebrar a grandeza
de qualquer tipo.” Levou muito tempo (muito mesmo) e ainda temos de esperar
para ver qual será a sua concretização. Mas o país, o seu sector cultural,
entendeu a necessidade de ir além da “democratização da cultura” para se focar
numa cultura mais democrática.</span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Gosto e fazem-me falta os estudos de público no nosso trabalho.
Costumamos guiar-nos pelas nossas intuições, convicções empíricas, trocas de
opiniões com colegas. Não desvalorizo estes factores, mas são também
necessários dados mais concretos e objectivos, mais detalhados, cruzados em
função de vários parâmetros, que permitam pensar melhor o nosso trabalho e
tomar decisões mais informadas. Nesse sentido, sinto-me muito contente com o <b><a href="https://gulbenkian.pt/publication/inquerito-as-praticas-culturais-dos-portugueses/" target="_blank">estudo encomendado pela Fundação Calouste Gulbenkian sobre os hábitos culturais dos portugueses</a></b></span><span style="background: white; color: #444444; line-height: 107%;">. </span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Não me trouxe surpresas,
no entanto; infelizmente, nem no que diz respeito a muitas das primeiras
reacções aos resultados apresentados. </span><span style="background: white; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;">Em 2013, a situação foi muito parecida quando saíram os resultados do
Eurobarómetro sobre o acesso e participação cultural dos cidadãos nos países da
EU (escrevi na altura <b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2013/11/auto-barometro.html" target="_blank">aqui</a></b></span><span style="color: #404040; line-height: 107%;">). </span><span style="line-height: 107%;">Senti que algumas das nossas reacções, reacções de quem trabalha no
sector, foram tão ou mais preocupantes que os resultados em si. Agora, está a
acontecer o mesmo.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Alguns comentadores, desiludidos ou mesmo
zangados com os portugueses incultos, desinteressados ou ignorantes, questionam
se deveremos, então, ir à rua buscar as pessoas e trazê-las para dentro. Outros
defendem o contrário, que devemos levar o que temos e sair para a rua. Poucos
questionam o que é que queremos, realmente, partilhar? Porquê? Que relevância
vêem nele os Portugueses? Aliás, a palavra “relevância” aparece duas vezes no estudo da Gulbenkian, mas nunca associada à oferta cultural (aparece uma vez
associada à educação e outra à sociabilidade). No entanto, deveria ser uma questão
central na análise dos resultados do estudo (e para quem tem dificuldade em
definir “relevância”, o livro <i>The art of relevance, </i>de Nina Simon, é um
bom ponto de partida).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Fico com a sensação que queremos impingir algo
aos portugueses. Não interessa quem são, onde vivem, em que pensam, o que
anseiam por fazer ou discutir. Planeamos, e programamos, “apesar” deles.
Amuamos quando afirmam não ter interesse no que propomos (ou, pior, não ter
conhecimentos para apreciar o que propomos…). A questão do preço dos bilhetes
aparece como tábua de salvação (“não vêm porque é caro”). Tudo menos
questionarmos o que fazemos, como e porquê. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">A comunicação social faz as suas interpretações
e escolhe títulos como <b><a href="https://www.publico.pt/2022/02/16/culturaipsilon/noticia/televisao-telemovel-livros-museus-1995624" target="_blank">“Muita televisão e telemóvel, poucos livros e museus”</a></b>.
Tão preconceituoso, tão limitador e com tanto impacto nas conclusões
simplificadas que muitas pessoas vão tirar dos resultados. Lembro-me da Acesso
Cultura organizar em 2020 um debate com colegas, profissionais da cultura, que
cresceram em meios rurais. Todos eles falaram da importância da televisão nas
suas vidas, em tudo o que ficaram a conhecer, em tudo o que puderam imaginar. O
problema não é o meio em si (o mesmo em relação ao telemóvel). O nosso
questionamento tem de ir um pouco além.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Os autores do estudo afirmam que, para perceber
as raízes da fraca adesão às práticas culturais, o estudo inquiriu também os
entrevistados sobre as razões que os levam a ignorá-las. No entanto, a “falta
de tempo”, a “falta de dinheiro”, a “falta de interesse”, só por si, não revelam
o que muitas vezes está por trás destas afirmações. O “é caro” pode esconder
algo como “é tão grande, tão bonito, não é para mim” (estou a citar uma pessoa
real). O “não tenho interesse” ou “não tenho conhecimentos para entender” são
referências que devem ser aprofundadas, isto é, se tivermos a coragem de nos confrontarmos
com o que revelam sobre a forma como comunicamos. O “não estou bem vestida para
ir visitar a exposição” é um factor real, muito real. Temos ainda a “falta de
tempo”, invocada também por quem trabalha na Cultura. Uma realidade que a
pandemia nos permitiu questionar de forma intensa, mas… já passou. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mais uma vez, fica claro para mim que não
estamos dispostos a questionar-nos, a pôr-nos em causa. Para quê fazer estudos,
se não estamos preparados para actuar sobre eles? Para quê fazer estudos, se
vamos passar uns dias indignados, para voltarmos ao que sempre fizemos, como
sempre o fizemos, culpando os portugueses, o Salazar (inevitável referência
nestas discussões), a escola…? <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">“Toda a política cultural é centrada na oferta,
ou seja nos artistas e nas estruturas que os mantêm. Mas não conhecíamos a
consequência disso ao nível da procura”, disse Miguel Lobo Antunes na
conferência de imprensa. Pois é, mas eu acho que conhecíamos também a
consequência disto. Aliás, essa mesma política cultural, quando pensa nos
“destinatários” da oferta, não vai além do “digital” e das entradas gratuitas,
da tal “democratização” - ou “impingimento” (<b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2016/06/reflexoes-governamentais-sobre-o-acesso_24.html" target="_blank">neste post de 2016</a></b> reflectia sobre
o programa do governo para a cultura</span>). <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Um dia antes do estudo ser apresentado, a nossa colega brasileira
Marta Porto partilhou comigo o artigo de um jornal do seu país intitulado <i><b><a href="https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/opiniao/colunistas/lira-neto/volta-pra-tua-terra-nossa-cor-e-a-branca-dizem-os-racistas-em-portugal-1.3192677" target="_blank">“Volta pra tua terra”, “nossa cor é a branca”, dizem os racistas em Portugal</a></b></i>,
que começava com uma referência ao espancamento de uma aluna brasileira de 11
anos no pátio da sua escola em Portugal. A Marta perguntou-me: <span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">"Como os
museus e os programas portugueses estão lidando com a xenofobia crescente em
Portugal?" A minha resposta foi directa e curta: não lidam. Como não lidam
com vários outros assuntos, pequenos e grandes, graves, mas também felizes. Aqui
não se trata de dizer “Mas não conheces o projecto a, b, c…?”. Conheço alguns
e, com certeza, desconheço outros tantos. Mas o que está aqui em causa é o
posicionamento de um sector inteiro em relação à vida e às pessoas, esta terra
e o mundo. Se quisermos questionar a relação dos portugueses com “a Cultura”,
devemos começar por um honesto auto-questionamento. Tentar responder à pergunta
desconfortável “Porque é que fazemos o que fazemos?”; e, ainda, “Qual a nossa
relevância?”. O que seria mesmo preciso agora era um estudo sobre os hábitos
culturais das próprias organizações culturais. O que é que os portugueses podem
esperar delas? De nós?</span><span style="background: white;"><o:p></o:p></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="color: #404040; line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Mais leituras</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><a href="https://www.publico.pt/2021/02/06/culturaipsilon/noticia/curadoria-desconforto-1949349"><b>A
curadoria do desconforto</b></a><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b>Ainda neste blog</b><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/02/onde-estao-as-oportunidades-proposito.html">Onde
estão as oportunidades? A propósito da nova estratégia do Arts Council England</a><o:p></o:p></b></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2013/11/auto-barometro.html"><span style="line-height: 107%;">Auto-barómetro</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2017/02/terreno-arenoso.html"><span style="line-height: 107%;">Terreno arenoso</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2016/06/reflexoes-governamentais-sobre-o-acesso_24.html"><span style="line-height: 107%;">Reflexões governamentais sobre o acesso à cultura</span></a><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><span style="color: black; line-height: 107%;"><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2017/06/uma-tragedia-nacional-o-que-e-que.html">Uma
tragédia nacional: o que é que “a Cultura” tem a ver com ela?</a></span><span style="line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></b></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2013/10/o-louvre-o-meu-filho-e-eu.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">O Louvre, o meu filho e eu</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2013/09/opera-e-cidade.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Ópera e a Cidade</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2013/01/nao-me-mandem-calar.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Não me mandem calar</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2012/09/sobre-o-nosso-valor-publico.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Sobre o nosso valor público</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2012/05/somos-para-as-pessoas-sera-mesmo.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Somos para as pessoas... Será
mesmo?</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2012/04/ministerio-da-cultura-qual-cultura-e-de.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Ministério da Cultura: qual
cultura e de quem?</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2012/01/o-que-pode-fazer-diferenca.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">O que pode fazer a diferença?</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2011/10/ser-ou-nao-ser-gratuito-nao-e-essa.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">Ser ou não ser (gratuito aos
Domingos)? Não é essa a questão</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: white;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><span style="color: black; mso-color-alt: windowtext;"><a href="http://musingonculture-pt.blogspot.pt/2011/06/diferenca-entre-mais-e-diversos.html" target="_blank"><b><span style="color: #666666; line-height: 107%;">A diferença entre ‘mais’ e
‘diversos’</span></b></a></span><span style="color: #444444; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></p><br /><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-32797167790334542492022-02-10T00:12:00.013+00:002022-02-13T09:01:56.753+00:00Ter tempo, dar tempo<p> </p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiSVAhIuKxijkG6OrkhlpME8QwBqxOxwySj9oudwRHqqV4JQ5nLQCdjX8Tc8ocFufxS__sKlQVml6egXsolGXfhjSHZQlg7xal186uHYugeFlNtLPPMAL2b6B5WABZ0P-KF6S7MeltAIsLHSAG3FjfQCp90NsxARBSVlaoESETEllXYFHkUUK7G7OpqWA=s500" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiSVAhIuKxijkG6OrkhlpME8QwBqxOxwySj9oudwRHqqV4JQ5nLQCdjX8Tc8ocFufxS__sKlQVml6egXsolGXfhjSHZQlg7xal186uHYugeFlNtLPPMAL2b6B5WABZ0P-KF6S7MeltAIsLHSAG3FjfQCp90NsxARBSVlaoESETEllXYFHkUUK7G7OpqWA=s16000" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">S. Miguel, Açores (Foto: Maria Vlachou)</td></tr></tbody></table><br /><p></p><p></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Há dias, li uma <b><a href="https://www.kathimerini.gr/k/k-magazine/561695314/" target="_blank">entrevista do realizador grego Sotiris Tsafoulias</a></b>, em que dizia: “Ser artista não é uma profissão. Uma mulher que tem
cinco filhos, não tem marido, limpa escadas e ainda põe uma tigela com água
para um cão vadio ou olha para nós e diz ‘bom dia’, para mim, ela é uma
artista. Uma pessoa não se torna artista quando pega num microfone, num pincel
ou numa caneta. A forma como uma pessoa lida com a feiura, a forma como a
metaboliza e a devolve como bondade ou como luz, a forma como se posiciona nos
momentos sombrios da sua vida, para mim, é isto que faz de uma pessoa artista,
independentemente da profissão.”<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Partilhei este excerto da entrevista num encontro com
colegas da <b><a href="https://www.redecultura2027.pt/pt" target="_blank">Rede Cultura 2027</a></b>,
responsável pela candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura, porque
temos a tendência de fazer coincidir os termos “cultura” e “arte” e Tsafoulias reorienta-nos.
<span style="background: white; color: black; mso-color-alt: windowtext;">Marta Porto
tem também insistido bastante sobre este ponto. No seu livro <b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2020/02/a-beleza-ha-de-vencer.html" target="_blank">“Imaginação: reinventando a cultura”</a></b></span></span><span style="background: white; color: black; line-height: 107%;"> lembra-nos que as
políticas que dão corpo à cultura devem “estimular mentalidades sensíveis e
capazes de estruturar sociedades onde o cumprimento de direitos não é ato de
misericórdia, mas ato consciente que responde a um imperativo democrático.” E
acrescenta: “Quando os exemplos são exceções, podemos falar de falta ou de
necessidade de educação. Quando são maioria, falamos de cultura social, de um
imaginário </span><span style="line-height: 107%;">de como nos manifestamos, percebemos e agimos como corpo
social.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como construir uma maioria de pessoas capaz de dizer “bom
dia”, menos desconfiada do outro, mais disponível para cuidar do comum, com
mais tempo para reflectir e conversar, sem medo de amar? <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Antes do encontro em Leiria, tive o privilégio de realizar
formações em quatro pontos diferentes do país e replectir sobre as barreiras à
participação cultural. Foi no âmbito da nova edição do Projecto <b><a href="https://gulbenkian.pt/partisartforchange/" target="_blank">PARTIS &
Art for Change</a></b>,
promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian e a Fundação La Caixa. Estivemos em
Beja, Espinho, Ponta Delgada e Guarda e foi bom: porque estivemos juntos, entre
colegas já conhecidos e outros novos; porque houve tempo para conversarmos,
encontrarmos inspiração e imaginarmos possibilidades; porque ficámos mais
conscientes das diferentes realidades vividas no terreno. Continuo a pensar e a
tentar arrumar ideias depois da experiência intensa que tivemos.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Voltei a verificar que nos conhecemos pouco, mesmo quando
trabalhamos próximo uns dos outros. Algo que se constatou também em 2017,
quando a Acesso Cultura realizou as jornadas <b><a href="https://acessocultura.org/relatorio-alem-do-fisico/" target="_blank">Além do físico: barreiras à participação cultural</a></b></span><span style="line-height: 107%;">.
Depois chegam estes momentos das formações, passamos algumas horas juntos,
cria-se cumplicidade, manifesta-se vontade (necessidade mesmo) de manter o contacto.
E depois… cada um regressa ao seu dia-a-dia, sem fazer o esforço de dar mais
tempo a esses momentos, de dar mais tempo a si próprio para uma pausa, um
encontro, uma conversa, uma leitura, uma reflexão em conjunto. Assim, fica cada
um no seu “canto”, fazendo coisas boas e bonitas, enfrentando dificuldades e
angústias (muitas comuns e conhecidas). Espera-se e desespera-se, e há um
sentimento de isolamento e, às vezes, mesmo de solidão. Estaremos, realmente,
tão sós? Teremos tempo para descobrir que… talvez não?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Ao mesmo tempo, existem factores que nos obrigam a aterragens
abruptas e que não podemos ignorar. Como quando colegas do chamado “interior”
(um “interior” que, neste caso, inclui também o Algarve) dizem que nas suas
regiões só pode fazer ou participar em projectos quem tem carro… O que dizer
sobre isto? À procura de orientação, volto ao artigo de 2020 da Joana Villaverde <b><a href="https://www.publico.pt/2020/08/21/culturaipsilon/noticia/vidas-interior-importam-1928572" target="_blank">“As vidas do interior importam”</a></b></span><span style="line-height: 107%;">, em
que nos interpelava: “O que é que realmente delimita e denomina essa
interioridade? Não será a distância até ao mar, com certeza, porque essa é
curta. O que delimita e denomina o interior são as políticas implementadas há
séculos, e há séculos sem grandes mudanças. Este país não tem interior. Este
país tem pessoas interiorizadas e empurradas para o esquecimento.”<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Numa das formações, tive a oportunidade de almoçar com uma
jovem colega. As suas intervenções durante a sessão transmitiam curiosidade e
uma agradável inquietação. Então, ao almoço, contou-nos que saiu do sítio “seguro”
e “prestigiado” onde trabalhou nos últimos anos. Disse que aprendeu muito,
cresceu, mas que, em determinado momento, sentiu que já não estava a fazer nada
de relevante e que não tinha vida privada. Demitiu-se. O seu desejo é conhecer
o país, os seus diversos cantos, e ser útil. A sua confiança e optimismo foram contagiantes.
Uma nova janela de esperança.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Depois das formações, tivemos mais um fim-de-semana “Isto é
PARTIS & Art for Change”. Fiquei a pensar: o que é que me faz sentir tão cheia,
tão leve, tão em paz, tão esperançosa quando acaba esse fim-de-semana? Talvez o
facto de estarmos num ambiente onde se sente amor e humanidade; num espaço onde
nos cruzamos com pessoas até há pouco desconhecidas, mas que acabam por se
tornar próximas de tantas formas diferentes; num momento em que temos tempo,
damos tempo. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Esse fim-de-semana é como
um grande e forte abraço dado por muitas pessoas. <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><o:p><span style="font-family: verdana;"> </span></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">Ler ainda neste blog:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;"><b><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2018/01/ts-elliot-um-terrivel-artista-hip-hop.html" target="_blank">TS Elliot, um terrível artista hip hop</a></b> (escrito depois do fim-de-semana “Isto é PARTIS” em 2018).</span></span></p><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-61937811619236839762021-10-31T19:50:00.012+00:002021-11-07T10:25:41.913+00:00Teatros nacionais: missão (im)possível?<p><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-zQom-bDAnTk/YX7yia9iARI/AAAAAAAAZ0k/4AMocrxW2VsqfhgUNknSACFSVDf_uYYbwCLcBGAsYHQ/s500/tnsj_pt_500.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="264" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-zQom-bDAnTk/YX7yia9iARI/AAAAAAAAZ0k/4AMocrxW2VsqfhgUNknSACFSVDf_uYYbwCLcBGAsYHQ/s16000/tnsj_pt_500.png" /></a></span></div><span style="font-family: verdana; line-height: 107%;"><p><span style="line-height: 107%;">Por ocasião da sua reabertura ao público, depois de obras
de requalificação, o Teatro Nacional S. João (TNSJ) organizou um promissor
colóquio internacional com o tema “Teatros Nacionais: missões, tensões,
transformações”. </span><a href="https://www.tnsj.pt/pt/espetaculos/6269/teatros-nacionais-missoes-tensoes-transformacoes"><span style="line-height: 107%;"><b>Nas
suas próprias palavras</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, este seria um “gesto de reflexão e de
autoquestionamento (…), em que se fará o diagnóstico <i>inter pares</i> de uma
instituição já um tanto vetusta, mas não menos viva.”</span></p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Com o seu discurso de abertura, Pedro Sobrado, Presidente
do Conselho de Administração, reforçou as nossas expectativas através de um
extenso questionamento:<span></span></span></span></p><a name='more'></a><span style="font-family: verdana;"><o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Pode o repertório ser mais do que um chavão, ou
um catálogo acanhado das mesmas peças dos mesmíssimos autores? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Qual o lugar ainda da proclamada “excelência”
nos Teatros Nacionais, um bordão a que, por vezes, nos agarramos como náufragos
quando a embarcação se despedaçou? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como conciliar o princípio da exigência e o
imperativo da acessibilidade? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">E como garantir que a acessibilidade
intelectual não resvala para a condescendência, um vírus fatal para a arte? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">É possível que o palco continue a ser um lugar
para tomadas de posição políticas sem o reconvertermos numa escola de moral e
civilidade, segundo a velha e relha fórmula romântica de Teatro Nacional? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como conciliar a aposta na experimentação e no
risco artístico e os princípios de eficácia e eficiência a que uma organização
pública está necessariamente obrigada? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como compatibilizar a flexibilidade que a
criação artística requer com procedimentos legais e administrativos rígidos,
próprios de um organismo de Estado? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Haverá forma de garantir que os custos fixos de
estrutura que envolvem a política interna de remunerações não retiram fôlego à
criação artística? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como conferir condições financeiras, técnicas e
logísticas excepcionais a companhias e outras estruturas sem que tal implique
viabilizar um número menor de projectos de co-produção?<o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">É possível estabelecer uma verdadeira política
da língua num Teatro Nacional? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como manter o charme transgressivo ou a
insubmissão congenial do Teatro, garantindo a credibilidade institucional junto
de mecenas e investidores? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Qual o papel de um Teatro Nacional na validação
internacional da cultura de um país e dos seus artistas? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Como captar e formar um público para o teatro,
respondendo a interesses culturalmente tão diversos? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<p class="MsoNormal"><i><span style="line-height: 107%;"></span></i></p><blockquote><i><span style="font-family: verdana;">Quantas frentes de trabalho pode um Teatro
Nacional abrir – projecto educativo e ligação à comunidade, programa editorial
e documental, gestão e divulgação de património classificado, programação
digital, ligação às universidades e centros de investigação, parceria
estruturada com as escolas artísticas, programa de acessibilidade –, quantas
frentes de trabalho pode um Teatro Nacional abrir sem deixar de ser, antes de
mais e depois de tudo, um palco, isto é, um lugar que aprofunda e exorbita o
seu próprio talento? <o:p></o:p></span></i></blockquote><p></p>
<blockquote style="border: none; margin: 0px 0px 0px 40px; padding: 0px;"><p class="MsoNormal" style="text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana; font-size: x-small;">(texto gentilmente cedido pelo autor)</span></span></p></blockquote>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Pensando no colóquio no seu todo, infelizmente, não veio
“favorecer e ampliar” este questionamento, como se esperava. As principais
razões são, no meu ver, duas:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Em primeiro lugar, a grande maioria dos convidados
falou-nos, essencialmente, do que o seu teatro faz, independentemente do tema
do painel ser missões, tensões ou transformações. Ou seja, não houve
propriamente um questionamento, uma reflexão crítica, que permitiria olhar para
a o “o quê” em função do tema-chapéu da sessão. Este é um problema bastante
comum no nosso meio, ou seja, a incapacidade de irmos além de “o quê” e pensar
no “porquê”.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Depois, em dois dos três painéis, as pessoas que fizeram a
moderação foram jornalistas. Tendo reconhecidamente, pela profissão que
exercem, capacidades para moderar um debate que se quer eficaz e dinâmico, não
têm necessariamente os conhecimentos específicos necessários para insistir e
tentar aprofundar referências que ficam pela superfície ou confrontá-las com o
actual contexto da discussão destes temas no próprio sector, a nível nacional e
internacional. De referir ainda que o segundo painel não teve moderação, tendo
sido permitido ao segundo orador falar cerca de uma hora sobre vários temas (que
não consigo dizer quais foram) e ao terceiro, falar meia hora sobre a
indiferença e ingratidão dos jovens no seu país – o meu desespero e desconforto
levaram-me a sair antes do painel se concluir, quando estávamos próximo já das
três horas de duração…<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-AB7X0SCKUyk/YX7y7Deyi2I/AAAAAAAAZ0s/WeFdhn7EfzoQ9-kL10BQK6UcrsJsPV21QCLcBGAsYHQ/s500/20211023_114941_500.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="310" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-AB7X0SCKUyk/YX7y7Deyi2I/AAAAAAAAZ0s/WeFdhn7EfzoQ9-kL10BQK6UcrsJsPV21QCLcBGAsYHQ/s16000/20211023_114941_500.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto: Maria Vlachou</td></tr></tbody></table><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Dito isto, houve duas comunicações que se destacaram e que
determinaram a minha opinião global positiva sobre o colóquio:<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Mark O´Brien, co-director e director executivo do </span><a href="https://www.abbeytheatre.ie/"><span style="line-height: 107%;"><b>Abbey Theatre</b></span></a><span style="line-height: 107%;">
(Irlanda), participou no primeiro painel, que discutiu as missões dos teatros
nacionais. Estiveram com ele mais dois directores, Cláudio Longhi (</span><a href="https://www.piccoloteatro.org/en/"><span style="line-height: 107%;"><b>Piccolo Teatro di Milano</b></span></a><span style="line-height: 107%;">) e
Sebastián Blutrach (</span><a href="https://www.teatrocervantes.gob.ar/"><span style="line-height: 107%;"><b>Teatro
Nacional Cervantes</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, onde exerce funções de assessor artístico e
de produção, sendo ainda director do </span><a href="https://www.teatropicadero.com.ar/"><span style="line-height: 107%;"><b>Teatro Picadero</b></span></a><span style="line-height: 107%;">), e
ainda Ricardo Pais, antigo director do TNSJ (e, no meu ver, um pequeno erro de
casting neste painel).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Enquanto ouvia os oradores, procurei nos websites das
instituições que representavam as missões das mesmas. Sem grande surpresa,
descobri que os teatros italiano e argentino não têm uma missão definida e
comunicada publicamente. Talvez tenha sido também por isso que os oradores não
foram além de uma descrição de funções e que tenham confundido estas funções
com a missão ou a missão com afirmações do género “um teatro para todos”.
Ricardo Pais veio reforçar esta confusão quando disse que a missão/função do
TNSJ está na lei e que o resto depende da personalidade de quem está a dirigir
o teatro… Valeria a pena pensar: a lei diz o mesmo em relação ao TNSJ e o
Teatro Nacional D. Maria II, mas a sua actividade (o quê) não aparenta a mesma
missão (porquê); não será algo mais do que aquilo que se descreve na lei?
Deveremos, ao mesmo tempo, concluir que o director do Piccolo Teatro vai todos
os dias trabalhar sem propósito porque a lei italiana não define, como ele
gostaria, a missão do teatro que dirige?<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Por outro lado, Mark O´Brien disse-nos que a ambição do
Abbey Theatre é trazer para o palco os pensamentos mais profundos da Irlanda;
confrontar o seu próprio paradigma; fazer as pessoas reflectirem sobre a sua relação
com o <i>status quo</i> (“se achas que não existe, provavelmente fazes parte
dele”) e questionarem a normalidade. Com o ano de 2021 a assinalar os 100 anos da partição da Irlanda, Mark disse-nos ainda que o Abbey Theatre não
nasceu para reflectir o Estado, mas para fazer o Estado; criticou as “ditaduras
democráticas” em que alguns teatros se tornaram; questionou quem está no palco
(referiu-se ainda à </span><a href="https://www.irishtimes.com/culture/stage/abbey-theatre-uproar-300-actors-and-directors-complain-to-minister-1.3750135"><span style="line-height: 107%;"><b>carta aberta
contra o modelo de produção adoptado pelo teatro</b></span></a><span style="line-height: 107%;">,
assinada em 2019 por mais de 300 profissionais do teatro, como a maior carta de
amor); destacou a relevância não apenas do passado, mas do contemporâneo, do
presente e do futuro (“quem escreve o futuro?”); desenhou a imagem de um lugar
onde as pessoas são convidadas para construir algo em conjunto (“proibir o outreach”) e afirmou que deveremos tentar juntar as pessoas com base nos seus
valores em vez das suas convicções. Em tudo o que Mark disse vemos reflectida
aquela que o Abbey Theatre </span><a href="https://www.abbeytheatre.ie/about/about-the-abbey/"><span style="line-height: 107%;"><b>assume
ser a sua missão</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. <o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-UAZapGS8TM4/YX7zK0SzRxI/AAAAAAAAZ00/yES0aRYy1-oqPZ_eedPI5UWcLi1eRZ1zgCLcBGAsYHQ/s500/abbey_mission_500.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="380" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-UAZapGS8TM4/YX7zK0SzRxI/AAAAAAAAZ00/yES0aRYy1-oqPZ_eedPI5UWcLi1eRZ1zgCLcBGAsYHQ/s16000/abbey_mission_500.png" /></a></span></div><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Jackie Wylie é directora artística e executiva do </span><a href="https://www.nationaltheatrescotland.com/"><span style="line-height: 107%;"><b>National Theatre of Scotland</b></span></a><span style="line-height: 107%;">. Participou
no painel sobre transformações, juntamente com Anna Bergman (directora do </span><a href="https://www.staatstheater.karlsruhe.de/"><span style="line-height: 107%;"><b>Badisches Staatstheater
Karlshrue</b></span></a><span style="line-height: 107%;"><b>)</b> e Michael de Cock (director artístico do </span><a href="https://www.kvs.be/en/"><span style="line-height: 107%;"><b>KVS</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, Bruxelas). A comunicação da
Jackie destacou-se por várias razões. Primeiro, porque o Teatro Nacional da
Escócia é um teatro sem paredes (“um passo natural no processo”) e apresenta a
sua programação noutros teatros, pubs, nas montanhas, em submarinos; não cria
hierarquias entre diferentes formas de teatro (profissional, comunitário, etc.),
procura possibilitar a ambição de qualquer pessoa e não põe a excelência em
primeiro lugar (“definida pelo privilégio de homens cis brancos”).O Teatro
Nacional da Escócia considera que não existe ume identidade nacional estável e
acompanha as mudanças nos valores assumidos como “escoceses”, destacando neste
momento a tolerância, o cuidar e o bem-estar (especialmente, face ao Brexit, ao
qual a maioria dos Escoceses se opôs). “Não és nacional porque o adjectivo
faz parte do teu nome”, disse Jackie. Trata-se de um projecto em constante
desenvolvimento, diário. Questionou de que forma um teatro nacional reflecte a
nação hoje e, sobretudo, aquilo que será o seu futuro, e não apenas identidades
passadas. “Experimentemos uma versão utópica do que o futuro poderá ser e
assumamos a responsabilidade de levar a nação a ter este debate. Procuremos
as histórias que não são contadas ou que são pouco contadas.” Mais uma vez,
vale a pena confrontar este posicionamento com aquela que </span><a href="https://www.nationaltheatrescotland.com/about/who-we-are"><span style="line-height: 107%;"><b>o
National Theatre of Scotland assume ser a sua identidade</b></span></a><span style="line-height: 107%;">.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-NP0oGX0w730/YX7zW-1jnCI/AAAAAAAAZ04/ZAcuteTRrYk9vpEffhRea-s4fhDHo9XjACLcBGAsYHQ/s644/nns_.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="644" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-NP0oGX0w730/YX7zW-1jnCI/AAAAAAAAZ04/ZAcuteTRrYk9vpEffhRea-s4fhDHo9XjACLcBGAsYHQ/s16000/nns_.png" /></a></span></div><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">O que distinguiu estas duas comunicações foi a clareza do
pensamento e do propósito; uma acção consciente, ancorada na missão e em
valores específicos; uma noção concreta do que constitui “comunidade” e o
serviço que a ela se deve prestar. A gestão da maioria dos espaços culturais
continua a falhar neste aspecto. Sem missão definida, e muitas vezes
confundindo-a com funções ou actividades concretas, falta a orientação e
consistência que este instrumento traz a uma organização. E falta também
“accountability” (prestar contas em função do que dizemos ser a nossa missão e
objectivos). Será que é mesmo por isso que evitamos defini-la…?</span><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mais leituras:</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Mark Fisher, <a href="https://www.theguardian.com/stage/2019/jan/15/national-theatre-england-scotland-wales-ireland" target="_blank"><b>Stage of the nation: what does it mean to be a national theatre?</b></a>, in The Guardian, 15.1.2019</span></span></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-34838717051181984412021-10-17T18:33:00.004+01:002021-10-19T09:36:46.101+01:00Visões do Império<p><span style="font-family: verdana;"><i></i></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><span style="font-family: verdana;"><i><a href="https://1.bp.blogspot.com/-yoHpBlYZJuI/YWxbedMuvsI/AAAAAAAAZnA/-ZNXek96MLY0YHjdZ3yM8vh9YyqywFTTQCLcBGAsYHQ/s500/cover.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-yoHpBlYZJuI/YWxbedMuvsI/AAAAAAAAZnA/-ZNXek96MLY0YHjdZ3yM8vh9YyqywFTTQCLcBGAsYHQ/s16000/cover.jpg" /></a></i></span></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><i style="font-family: verdana; text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><br /></span></i></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><i style="font-family: verdana; text-align: left;"><span style="line-height: 107%;">Visões do Império</span></i><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-align: left;"> é uma
exposição de fotografia e sobre a fotografia. Mais uma exposição na programação
do Padrão dos Descobrimentos, que é uma das instituições culturais que mais se
(e nos) questiona sobre o passado colonial do país e sobre a escravatura. </span><a href="https://padraodosdescobrimentos.pt/evento/visoes-do-imperio/" style="font-family: verdana; text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><b>No
website do Padrão dos Descobrimentos</b></span></a><span style="font-family: verdana; line-height: 107%; text-align: left;">, lê-se que “As imagens
fotográficas foram encenadas e comercializadas, com diferentes fins. Passaram
de mão em mão, oficial e clandestinamente, ou foram esquecidas ou destruídas.
Documentaram sonhos e memórias individuais e colectivos. Alimentaram a
imaginação da dominação colonial, associando-se aos esforços da sua
concretização. Contribuíram para uma visão do ‘outro’ como essencialmente
diferente - nos seus modos de vida, costumes e mentalidade -, concorrendo para
o estabelecimento e manutenção de leis e práticas de discriminação política,
social, económica e cultural, que foram desenhadas ao longo de linhas raciais. Estas
imagens serviram também para denunciar a iniquidade e a violência da
colonização, acalentando aspirações de um futuro mais humano e igualitário -
sonhos esses com diferentes matizes e orientações políticas. Os seus usos no
passado e os seus legados no presente foram e são vastos, heterogéneos e
duradouros.”</span></div><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;"><a name='more'></a></span></span><p></p><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Começo por dizer que acho muito significativo, do ponto de
vista simbólico, que seja neste monumento, que </span><a href="https://padraodosdescobrimentos.pt/padrao-dos-descobrimentos/"><span style="line-height: 107%;"><b>“evoca
a expansão ultramarina portuguesa, sintetiza um passado glorioso e simboliza a
grandeza da obra do Infante D. Henrique, o impulsionador das descobertas”</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, que
nos é proposta não uma revisão da história, mas sim, uma revisitação crítica
(como diria Álvaro Laborinho Lúcio).<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Nos últimos anos, tive a oportunidade de visitar <i>Retornar
– Traços de Memória</i> em 2016 (escrevi sobre ela </span><a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2016/03/passado-recente.html"><span style="line-height: 107%;"><b>aqui</b></span></a><span style="line-height: 107%;">), <i>Racismo
e Cidadania</i> e <i>Atlântico Vermelho</i> em 2017, <i>Contar Áfricas</i> em
2018. O que senti com esta última exposição, <i>Visões do Império</i>, é que,
mesmo sem corresponder completamente às minhas expectativas, vem reforçar a
intenção consciente, empenhada e coerente de aprofundar o debate, de ir cada
vez mais longe.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">A leitura de uma </span><a href="https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2540/html/revista-e/culturas/uma-bandeira-nao-veste-um-pais"><span style="line-height: 107%;"><b>reportagem
no Expresso</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, já depois de visitar a exposição, levanta
para mim algumas questões. Joana Pontes, uma das coordenadoras, “faz questão de
sublinhar que ‘o objetivo da mostra não era criticar o modelo colonialista
adotado por Portugal”, até porque ambos [os coordenadores – Miguel Bandeira
Jerónimo e Joana Pontes] discordam da forma ‘polarizada e moral’ como o debate
tem sido travado. O que é urgente é informar, dizem. ‘Esta exposição tenta
mostrar que é possível pensar para lá da acusação ou da colaboração. Não houve
o filtro da crítica, mas a intenção de mostrar a diversidade de pontos de vista
das fotografias e os usos que esta teve.’” <o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Toda a exposição é uma crítica ao modelo colonialista
adoptado por Portugal. Poderia não o ser? (nem questiono, claro, se seria
desejável…). Os coordenadores consideram que o resultado é uma proposta
“neutra” ou “equilibrada”? Alguns exemplos concretos que me ocorreram ao ler a
entrevista no Expresso:<o:p></o:p></span></span></p>
<blockquote style="border: none; margin: 0px 0px 0px 40px; padding: 0px;"><p class="MsoNormal" style="text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como é que o visitante deverá interpretar o uso extenso de
aspas em palavras e expressões incluídas nos textos? (fotos 1 e 2 em
baixo). Eu interpretei grande parte como crítica. </span></span></p></blockquote>
<blockquote style="border: none; margin: 0px 0px 0px 40px; padding: 0px;"><p class="MsoNormal" style="text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Como é que o visitante deverá interpretar a frase “A
‘obrigação moral de trabalhar’, aplicável apenas a africanos, por vezes ‘em
condições análogas à escravatura’, predominou nos discursos políticos, nos
textos legislativos, nas práticas administrativas.” (foto 1)? Podemos atribuir a
primeira, sobre a “obrigação moral de trabalhar, à administração colonial, mas
quem está a ser citado na segunda (em condições análogas à escravatura”)? Não é
claro nem nos permite entendermos melhor que fontes foram consultadas.</span></span></p></blockquote><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-W4TGNNGG2Zg/YWxcphZkqyI/AAAAAAAAZnc/x3f5XN5076UoTstCM636wpy0cx3XToxYgCLcBGAsYHQ/s500/foto%2B1_pt.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="302" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-W4TGNNGG2Zg/YWxcphZkqyI/AAAAAAAAZnc/x3f5XN5076UoTstCM636wpy0cx3XToxYgCLcBGAsYHQ/s16000/foto%2B1_pt.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 1</td></tr></tbody></table><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-MiEqngLMt4Y/YWxcuxk1GSI/AAAAAAAAZnk/DJsOpNvozd0SaRBzR36Tt5T7m6RDdixSQCLcBGAsYHQ/s500/foto%2B2_pt.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="347" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-MiEqngLMt4Y/YWxcuxk1GSI/AAAAAAAAZnk/DJsOpNvozd0SaRBzR36Tt5T7m6RDdixSQCLcBGAsYHQ/s16000/foto%2B2_pt.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 2</td></tr></tbody></table><div style="text-align: center;"><br /></div><blockquote style="border: none; margin: 0px 0px 0px 40px; padding: 0px;"><p style="text-align: left;"><span style="font-family: verdana;">Numa parte da exposição intitulada “As oficinas da alma”,
vemos a fotografia 3 (em baixo) e lemos na legenda que é um “Estudante a
aprender a ser professor” e que pertence à colecção “Missionários Metodistas
Fotografam Angola”. A imagem levantou diversas questões para mim, tratando-se
de um estudante negro a ensinar uma turma de crianças brancas. Não há qualquer
outra informação sobre a mesma e as minhas questões não são de todo
respondidas. Mais à frente, numa secção sobre a propaganda do Estado Novo,
vemos uma outra fotografia parecida (Foto 4), de “Uma portuguesa de cor ensinando
uma portuguesa branca” (legenda na própria fotografia). Aqui, lê-se na legenda
da exposição que é uma “Foto enviada por angolanos para o Secretário Geral das
Nações Unidas”. Portanto, aqui entendemos que nos é proposto ver esta
fotografia no âmbito da propaganda; e ficámos perplexos, sem perceber quem
foram, neste contexto, os “angolanos” que a enviaram para as Nações Unidas.</span></p></blockquote><p style="text-align: center;"></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-QqlRNTwRqrI/YWxdB00lniI/AAAAAAAAZnw/7-5kzGpG7FAehIFnINgylSiI_mZGaxrEgCLcBGAsYHQ/s500/foto%2B3.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="309" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-QqlRNTwRqrI/YWxdB00lniI/AAAAAAAAZnw/7-5kzGpG7FAehIFnINgylSiI_mZGaxrEgCLcBGAsYHQ/s16000/foto%2B3.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 3</td></tr></tbody></table><p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-74rlGQzuBgA/YWxdG0_NgwI/AAAAAAAAZn0/WsPaFO4q1yQ_k7jtT_v-vp8M_5ThRP2pwCLcBGAsYHQ/s500/Foto%2B4.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-74rlGQzuBgA/YWxdG0_NgwI/AAAAAAAAZn0/WsPaFO4q1yQ_k7jtT_v-vp8M_5ThRP2pwCLcBGAsYHQ/s16000/Foto%2B4.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 4</td></tr></tbody></table><p></p>
<blockquote style="border: none; margin: 0px 0px 0px 40px; padding: 0px;"><p class="MsoNormal" style="text-align: left;"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Ainda nesta secção da propaganda, e numa exposição cujos
coordenadores dizem que “Não houve o filtro da crítica, mas a intenção de mostrar
a diversidade de pontos de vista das fotografias e os usos que esta teve”: de
que forma está integrada na exposição a voz do senhor que disse, a propósito da
fotografia no autocarro (Foto 5), “Eu vivi lá, era mesmo assim, isto não é
propaganda nenhuma!”?</span></span></p></blockquote><p style="text-align: center;"></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-SVmrhFDeekQ/YWxdU5fl4tI/AAAAAAAAZn8/xo4nPtDh20wyAFY59eLFARCqqonWXyFvQCLcBGAsYHQ/s500/foto%2B5.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-SVmrhFDeekQ/YWxdU5fl4tI/AAAAAAAAZn8/xo4nPtDh20wyAFY59eLFARCqqonWXyFvQCLcBGAsYHQ/s16000/foto%2B5.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 5</td></tr></tbody></table> <p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Dados estes exemplos (que me fazem questionar a falta de
crítica, mas também o cruzamento de vozes e experiência diversas na exposição),
devo dizer também que gostei do facto dos textos serem assumidos. Com isto,
quero dizer textos assinados por alguém (imagino que investigadores ligados à
exposição?), cujo nome vemos no topo do painel, ao contrário da prática comum
em museus e exposições em apresentar opiniões sem as assinar. Da mesma forma,
gostei dos painéis intitulados “Do meu ponto de vista” (Foto 6), que parecem
trazer outras vozes, mas fiquei sempre a pensar: Quem são estas pessoas? Qual o
contexto a partir do qual nos dão a sua visão? Porque é que foi incluído na
exposição o seu ponto de vista?</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-Eo4VftvxDJo/YWxdjLjeN4I/AAAAAAAAZoE/zMCEbM2dKRUFJZggIf0bpb5V_LtJMOZZQCLcBGAsYHQ/s500/foto%2B6.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-Eo4VftvxDJo/YWxdjLjeN4I/AAAAAAAAZoE/zMCEbM2dKRUFJZggIf0bpb5V_LtJMOZZQCLcBGAsYHQ/s16000/foto%2B6.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 6</td></tr></tbody></table><p></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;">Um último comentário que gostaria de fazer tem a ver com
diversas referências nas tabelas que, se não houvesse a tradução para o inglês,
não saberia o que significavam (foto 7). Numa exposição, aberta ao público em
geral, não se devem assumir conhecimentos prévios.</span></p><p class="MsoNormal"></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-Z4Q2c3WrvzE/YWxdq_cGSvI/AAAAAAAAZoM/frQbD3V_IrgtdC3hOTU-ntoW6KXuV2iTgCLcBGAsYHQ/s541/Foto%2B7.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="541" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-Z4Q2c3WrvzE/YWxdq_cGSvI/AAAAAAAAZoM/frQbD3V_IrgtdC3hOTU-ntoW6KXuV2iTgCLcBGAsYHQ/s16000/Foto%2B7.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Foto 7</td></tr></tbody></table><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;"><span style="line-height: 107%;">Em suma, diria que gostei a exposição, trouxe-me informações
e imagens que não conhecia e um olhar crítico que me permitiu questionar e reflectir
melhor sobre o que esperarei da próxima exposição do Padrão dos Descobrimentos,
considerando o caminho que tem traçado. A exposição <i>Visões do Império</i>
continua até dia 30 de Dezembro. É acompanhada de um programa de eventos e
actividades, nos quais destaco o ciclo de cinema </span><a href="https://padraodosdescobrimentos.pt/evento/ciclo-de-cinema-outros-imperios-outras-visoes/"><span style="line-height: 107%;"><b>Outros
Impérios, Outras Visões</b></span></a><span style="line-height: 107%;">, que começou no dia 13 de Outubro e que
se prolonga até o dia 26 de Novembro.</span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;">Não é preciso dizer o quão necessário e urgente é este
questionamento, esta reflexão. Ou será? Olhando para outras iniciativas de
algumas instituições culturais e tendo assistido a diversos debates nos últimos
meses, constata-se repetidamente o atraso neste debate em Portugal. Na
conferência anual da Acesso Cultura, no dia 11 de Outubro, algumas colegas
negras voltaram a partilhar connosco a sua impaciência em relação ao estado das
coisas ou exaustão provocada pelo mesmo (gravações disponíveis </span><a href="https://www.youtube.com/watch?v=-FuWWtqzVs4&list=PLFD7mwBKVOdVcZVefTnA-zV2-A9VbCAJg" style="font-family: verdana;"><b>aqui</b></a><span style="font-family: verdana;">).
Têm razão, e nós temos de assumir as nossas responsabilidades por esta
impaciência e exaustão. Temos de fazer a nossa parte. Nos últimos anos tenho
investido muito (tempo e dinheiro) em leituras e debates para me auto-educar em
relação àquilo que nunca fez parte do meu percurso (escolar e não só).</span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: verdana;">Tenho sorte em trabalhar neste sector, onde estou exposta a
diferentes referências, posso ouvir os colegas na primeira pessoa. Mas nem
todas as pessoas terão tempo e dinheiro para o fazer. E para muitas mais não é
um assunto ou uma prioridade entre os vários assuntos. O ensino formal será
fundamental, a longo prazo, para a educação de quem irá entrar para a escola
primária. Mas para quem já está mais avançado no percurso escolar (tal como o é
agora) e para os adultos, por onde passará essa auto-educação? Pelos museus,
pelos teatros, pelas bibliotecas, pelos cinemas. Por nós, profissionais da
cultura; se fizermos parte da vida das pessoas. Esta nossa relação com as
pessoas é todo um outro capítulo, diversas vezes abordado neste blog.</span></p><p class="MsoNormal"><o:p></o:p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3116280098221668264.post-49883575958557778322021-10-10T16:48:00.003+01:002021-10-10T17:43:42.066+01:00Provocar o suspiro<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-tSIPbxutklM/YWMKETbXsaI/AAAAAAAAZgM/9tlFoCY8qQ0rKOjKF4c6uB8E03h4J76uACLcBGAsYHQ/s500/20211007_102632.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-tSIPbxutklM/YWMKETbXsaI/AAAAAAAAZgM/9tlFoCY8qQ0rKOjKF4c6uB8E03h4J76uACLcBGAsYHQ/s16000/20211007_102632.jpg" /></a></div><span style="font-family: verdana;"><p>Esta semana, estive nos <a href="https://www.23milhas.pt/ciclo/territorios-publicos-2021/"><b>Territórios Públicos</b></a>,
o encontro nacional de serviços educativos e mediação organizado pelo 23 Milhas,
o projecto cultural do Município de Ílhavo. Gosto do nome desta iniciativa, que
me leva a pensar em palavras como “comunidade” e “comunicação” – comunicação que
cria comunidade – a ligação criada por uma tarefa partilhada (para lembrar o discurso
“O que é amar um país” de Tolentino Mendonça).</p></span><p></p><p><span style="font-family: verdana;">O início do encontro ficou marcado pela participação de
Álvaro Laborinho Lúcio, pelo mundo que ele traz e partilha generosamente, com um
misto de charmosa seriedade e cativante leveza, nas suas intervenções públicas.
Poderia destacar vários pontos, mas, considerando o tema deste post, o que me
parece mais relevante é referir aqui a forma como nos encorajou a seguir o
impulso da nossa constante ignorância, que nos leva do estereótipo, para a
interrogação, o questionamento, a dúvida…<span></span></span></p><a name='more'></a><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Nessa mesma tarde, tivemos a oportunidade de ouvir Nuno
Faria (Director Artístico) e Marta Bernardes (Gestora de Projectos Educativos)
do Museu da Cidade do Porto. Apresentaram uma ideia de museu de cidade que
intriga, uma intensão de questionar, de ir a fundo, de olhar para o museu-instituição
como uma instituição também em crise, com necessidade de olhar para si própria,
de se questionar e de mudar. <o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-So7jPLuzgqs/YWMKVBaKpWI/AAAAAAAAZgU/zjCemm33pHQ9EiwVG5TbcAK9P2gpkp8qACLcBGAsYHQ/s500/20211002_113541.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="375" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-So7jPLuzgqs/YWMKVBaKpWI/AAAAAAAAZgU/zjCemm33pHQ9EiwVG5TbcAK9P2gpkp8qACLcBGAsYHQ/s16000/20211002_113541.jpg" /></a></div><span style="font-family: verdana;"><p class="MsoNormal">Com as palavras de Laborinho Lúcio sobre a nossa constante
ignorância a ecoar ainda na minha cabeça, senti que este projecto foi
apresentado tendo como base demasiadas certezas, demasiadas convicções sobre o
que as pessoas podem ou não sentir, podem ou não desejar, podem ou não
precisar. Penso também que a apresentação não foi além da teoria, não houve
intenção ou capacidade de concretizar. Senti, aliás, alguma arrogância na
postura, que se tornou mais forte (para mim, desconfortável até) quando um
jovem colega perguntou como é que as pessoas chegam ao museu. Pareceu-me ser
uma pergunta no sentido literal (como sabem, como se informam, como chegam),
mas foi encarada também num sentido metafórico: como é que as pessoas chegam
aos conteúdos, como é que se relacionam com eles.</p><p class="MsoNormal">Marta Bernardes falou da falta de educação artística das
pessoas; das falhas da escola nesse sentido; da forma como as pessoas exigem
compreender e exigem compreender da forma que elas querem. Fez uma comparação
com as crianças que entram na primária para aprender a ler e a escrever e para
quem aquilo que no início parece ser rabiscos incompreensíveis começa, com a
prática, a ganhar significado. Comparou ainda à sua própria ignorância, e consequente
falta de compreensão, do jogo de rugby, até que um amigo com mais conhecimentos
lhe explicou algumas regras básicas. Para voltar à falta de educação artística.</p><p class="MsoNormal">Visitei o ex-Museu Romântico (espaço agora chamado Extensão
do Romantismo) há poucos dias. No passado, tinha-o visitado apenas duas vezes,
ambas antes da remodelação de 2017. Lembro-me que não me disse algo especial,
achei o nome (principal factor de atracção aquando da primeira visita – a
primeira também à cidade do Porto) mais interessante do que o conteúdo em si.
Devo dizer que fiquei muito incomodada com a violência das recentes críticas feitas
nas redes sociais ao novo projecto. A maioria baseava-se em fotografias e em
convicções, não revelava qualquer curiosidade, sentia-se sobretudo raiva. Fiquei
a pensar no que poderiam ser os motivos desta raiva e também nos critérios dos
profissionais do sector quando certos museus ou colecções desaparecem (pensei
concretamente no continuado <a href="https://musingonculture-pt.blogspot.com/2017/06/o-que-esta-acontecer-ao-museu-dos.html"><b>silêncio
em relação ao que se passa no Museu dos Transportes e Comunicações na mesma
cidade</b></a>).</p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-cN4U3zzGUGs/YWMKhJSzbmI/AAAAAAAAZgY/OkOusrfcmUs2kgpZ6e4-OY2vla5wRP4PgCLcBGAsYHQ/s2048/20211002_Museu%2BRomantico%2Bintro%2Bpt.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2048" data-original-width="1025" height="640" src="https://1.bp.blogspot.com/-cN4U3zzGUGs/YWMKhJSzbmI/AAAAAAAAZgY/OkOusrfcmUs2kgpZ6e4-OY2vla5wRP4PgCLcBGAsYHQ/w320-h640/20211002_Museu%2BRomantico%2Bintro%2Bpt.jpg" width="320" /></a></div><p class="MsoNormal">Não sentindo nenhuma ligação especial ao ex-Museu
Romântico, sem raiva ou mágoa e com alguma curiosidade, quis conhecer a nova
proposta; que não comunicou comigo: um texto de introdução sem informação relevante,
que parte de vários pressupostos em relação a conhecimentos prévios dos visitantes;
e, depois, vários objectos e obras expostas, sem qualquer contexto ou
informação, a não ser um folheto dado na entrada através do qual o visitante
pode fazer uma simples correspondência entre o que vê exposto e o esquema
apresentado no folheto. O <a href="https://museudacidadeporto.pt/"><b>website do
Museu da Cidade</b></a> prepara o visitante mais experiente para este tipo de
experiência que desorienta e desespera: confuso, nada intuitivo, um exercício estético
em detrimento da funcionalidade, que resulta num website inacessível.</p></span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">De que forma terá sido feita a avaliação da proposta do
ex-Museu Romântico? O que pensavam dele os profissionais dos museus e também os
visitantes? Como terá sido tomada esta decisão de mudança radical? Com que
propósito? Qual a necessidade identificada? Quais as referências do projecto no que diz respeito à educação e à mediação? São algumas das perguntas que
espero poder ver esclarecidas.<o:p></o:p></span></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Antes da visita à Extensão do Romantismo, passei pela
Galeria Municipal, onde está patente a exposição <a href="https://www.galeriamunicipaldoporto.pt/pt/exposicao/os-novos-babiloniosatravessar-a-fronteirapedro-g-romero-2021/"><b>“Os
Novos Babilónios”</b></a>. Cerca de 10 minutos depois estava de saída. Mais uma
vez, fui confrontada com um texto introdutório que não me disse nada; textos
melhores, mas muito extensos, nas paredes (que depois pude levar comigo e ler,
sentada e com calma, numa brochura fornecida pela galeria) e um cruzamento
constante de sons de vídeos que cansa profundamente.<o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-MjOZbGwMIAw/YWMKzvHCZwI/AAAAAAAAZgk/jYzNtauIqGs16Z9l65d4Bo3hGVxT9CMpACLcBGAsYHQ/s1200/20211002_Galeria%2BMunicipal%2BPorto_Novos%2BBabil%25C3%25B3nios.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="900" data-original-width="1200" height="300" src="https://1.bp.blogspot.com/-MjOZbGwMIAw/YWMKzvHCZwI/AAAAAAAAZgk/jYzNtauIqGs16Z9l65d4Bo3hGVxT9CMpACLcBGAsYHQ/w400-h300/20211002_Galeria%2BMunicipal%2BPorto_Novos%2BBabil%25C3%25B3nios.jpg" width="400" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-WF9nLJX5kbY/YWMK4WrH-AI/AAAAAAAAZgo/sqo9282CZmkX1PaFRfF5Au3iJnBYdotpgCLcBGAsYHQ/s1600/20211002_Galeria%2BMunicipal%2BPorto_Novos%2BBabil%25C3%25B3nios%2B2.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1200" height="400" src="https://1.bp.blogspot.com/-WF9nLJX5kbY/YWMK4WrH-AI/AAAAAAAAZgo/sqo9282CZmkX1PaFRfF5Au3iJnBYdotpgCLcBGAsYHQ/w300-h400/20211002_Galeria%2BMunicipal%2BPorto_Novos%2BBabil%25C3%25B3nios%2B2.jpg" width="300" /></a></div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><span style="font-family: verdana;">Em momentos como estes, lembro-me sempre da museóloga
canadiana Gail Lord que nos disse, quando visitou Portugal há uns anos, que o
que é bom nos museus é que não temos de fazer um exame para entrar e outro para
sair… Mas parece que, em certos museus, é mesmo isto que é esperado de nós. Somos
culpados pela nossa ignorância, quando os responsáveis pelos mesmos não sabem,
claramente, se querem comunicar, com quem e porquê. Visito diferentes tipos de
museu (de arte, de história, de ciência, de arqueologia) e sinto que alguns dos
seus curadores ou comissários esperam que eu tenha os seus conhecimentos ou,
talvez, que consulte antecipadamente alguma bibliografia para poder ter uma
visita com significado, relevante. Os curadores sabem navegar neles de olhos
fechados, mas atiram o visitante para dentro sem qualquer orientação ou mapa. Isto
não é um museu (na definição actual, e talvez na futura também). Não é fácil
comunicar com pessoas que não sabem (que é a maioria de nós, pessoas que
visitamos museus). Mas há profissionais capazes de reconhecer a sua “constante ignorância”
e com um genuíno e honesto interesse e capacidade para comunicar: pelo prazer
da partilha, da comunhão, da comunicação, da comunidade.</span><p></p>
<p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"><span style="font-family: verdana;">Queria acabar fazendo referência a uma pessoa que conheci
ontem, no <a href="https://2021.materiaisdiversos.com/como-comunicamos-quando-queremos-falar-de-cultura/"><b>Festival
Materiais Diversos</b></a>, e a quem roubei o título para este post. Filipa Morgado,
arquitecta e artista plástica, está a desenvolver, com o apoio da Direcção-Geral
das Artes, o projecto CAU – Cortém Aldeia Urbana, na sua aldeia de Cortém, próximo
das Caldas da Rainha. Voltou para Portugal por causa da pandemia, para passar
mais tempo com o pai. Quis fazer algo na sua aldeia, para e com os habitantes. Uma
aldeia construída dos dois lados de uma estrada, sem praça central. Falou com
as pessoas, que manifestaram a sua satisfação pelo que têm, pelo seu modo de
vida. Envolve-as no projecto batendo à porta, deixando informação na caixa de
correio, telefonando. Qual o desejo da Filipa Morgado, também habitante da aldeia?
Que as pessoas possam ser surpreendidas. “O meu objectivo é provocar o suspiro…”.
Foi o que me ficou da conversa de ontem.</span><span face="Arial, sans-serif" style="font-size: 10pt;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal"><span style="line-height: 107%;"></span></p><table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><tbody><tr><td style="text-align: center;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-p_I6M-b21Vs/YWMLDBRxA5I/AAAAAAAAZgw/aBML1vYXe4g4u9LvFMKkdgL3yhMbkDyJQCLcBGAsYHQ/s500/materiais_luisa%2Bbaeta.jpg" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" data-original-height="333" data-original-width="500" src="https://1.bp.blogspot.com/-p_I6M-b21Vs/YWMLDBRxA5I/AAAAAAAAZgw/aBML1vYXe4g4u9LvFMKkdgL3yhMbkDyJQCLcBGAsYHQ/s16000/materiais_luisa%2Bbaeta.jpg" /></a></td></tr><tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: x-small;">Foto: Luísa Baeta | Materiais Diversos</span></td></tr></tbody></table><span style="line-height: 107%;"><br /><span style="font-family: verdana;"><br /></span></span><p></p>Maria Vlachouhttp://www.blogger.com/profile/00554995071039470430noreply@blogger.com0