É natural que a apresentação de um plano estratégico gera discussão. E o Planeamento Estratégico do IMC – Museus para o Século XXI (consultar aqui), não podia ser diferente. Foi já bastante debatido e comentado na comunicação social e em vários fóruns de profissionais de museus e de pessoas em geral que acompanham e participam na vida cultural do país.
Não quero repetir ou comentar sobre o que já foi dito. Gostaria de dar a minha opinião sobre alguns aspectos do plano que, parece-me, não foram ainda objecto de discussão.
Em primeiro lugar, gostaria de assinalar a ausência da declaração de uma visão. Qualquer plano estratégico, antes de apresentar objectivos e medidas concretas, deveria criar um contexto para os mesmos, dar a entender qual é a grande ideia e qual poderá ser a expectativa. Que lugar é que o Ministério da Cultura gostaria que os museus ocupassem na sociedade portuguesa do século XXI? Porque é que continua a investir o dinheiro dos contribuintes nos mesmos? O que é que a sociedade pode esperar e exigir? Que desafios se apresentam, a nível local, nacional e internacional? Quais os factores que irão determinar as prioridades?
Uma outra omissão que me preocupou bastante desde a primeira leitura do documento foi a total falta de referência ao(s) público(s). Se as pessoas são a raison d´être dos museus, os destinatários finais de toda a sua actividade - sejam eles profissionais de museus, investigadores, público 'iniciado' ou, e sobretudo, público 'não iniciado' -, como é possível que nunca sejam claramente e directamente mencionadas no documento estratégico? Quando o desempenho dos museus nacionais se mede sobretudo, pelo menos publicamente, pelo número de visitantes, quando em alguns museus existe uma preocupação permanente em atrair mais pessoas, em diversificar a oferta e melhorar a qualidade da mesma, é decepcionante que uma estratégia para os museus do século XXI ignore por completo um dos factores que definem, ou deveriam definir, as prioridades na sua acção. Enquanto o(s) público(s) não forem claramente identificados como um factor determinante no planeamento estratégico, os museus continuarão a ser visitados e desfrutados por uma minoria; as pessoas continuarão a pensar que os museus são, sim, importantes, mas não se dirigem a elas, não lhes são relevantes; continuará a faltar um envolvimento afectivo e intelectual, que em alguns países faz com que a sociedade (a sociedade local e não os turistas estrangeiros…) se movimenta sempre que necessário em defesa dos seus museus e não se abstém e deixa esta luta apenas aos profissionais e aos ‘entendidos’. Se não olharmos para fora, é inevitável que continuemos a olhar para o umbigo, atitude da qual a redacção do Eixo 5 é mais um sinal. Aqui, na introdução, aparece pela primeira, mas também pela última, vez a palavra “comunicação”. Nas linhas que se seguem entende-se claramente que é de “comunicação interna” que se fala.
Para não falar apenas das omissões, foi com muito agrado que li no documento estratégico que se pretende monitorizar e avaliar a estratégia (Eixo 2). No entanto, não se especifica aqui a forma como esta tarefa será realizada. A definição de indicadores, para a avaliação da estratégia, mas também do desempenho dos museus em geral, é uma necessidade e uma obrigação, que vai muito além da contagem do número de visitantes e que é específica para cada museu, com base nos objectivos que se propõe a atingir. Alguns, como é normal, são comuns, outros dizem respeito à realidade muito específica de cada instituição. Deveremos procurar consultar e aprender com os países que já testaram e implementaram modelos de avaliação e não cair na tentação de começar do zero.
Deixei para o fim os modelos de gestão. Nos vários comentários que já li sobre este ponto da estratégia parece que a questão se resume na escolha entre uma visão mais comercial e outra mais virada para o estudo das colecções. Como se devêssemos escolher. Como se pudéssemos escolher… Mais uma vez, não será necessário começarmos do zero. Vários modelos – alguns melhores, outros piores – foram já testados e implementados noutros países. Na minha opinião, é a própria profissão, a do museólogo, que pode e deve formar os seus gestores. Pessoas que, se não a têm já, ganharão a sensibilidade necessária para gerir e dirigir espaços culturais e, concretamente, museus. Poderão ser pessoas vindas da área da história de arte, da arqueologia, da história, da sociologia, da animação cultural, etc; são cada vez mais pessoas vindas da área da economia. A gestão de museus é, em alguns países, um módulo essencial e imprescindível nos curricula dos cursos de museologia. Os cursos de leadership dirigidos aos profissionais de museus multiplicam-se no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Austrália (se bem que não devemos confundir leadership com managment). Tanto o ICTOP (Comité Internacional do ICOM para a Formação do Pessoal), como o INTERCOM (Comité Internacional do ICOM para a Gestão) poderão orientar as nossas decisões e apoiar as nossas acções.
Não quero repetir ou comentar sobre o que já foi dito. Gostaria de dar a minha opinião sobre alguns aspectos do plano que, parece-me, não foram ainda objecto de discussão.
Em primeiro lugar, gostaria de assinalar a ausência da declaração de uma visão. Qualquer plano estratégico, antes de apresentar objectivos e medidas concretas, deveria criar um contexto para os mesmos, dar a entender qual é a grande ideia e qual poderá ser a expectativa. Que lugar é que o Ministério da Cultura gostaria que os museus ocupassem na sociedade portuguesa do século XXI? Porque é que continua a investir o dinheiro dos contribuintes nos mesmos? O que é que a sociedade pode esperar e exigir? Que desafios se apresentam, a nível local, nacional e internacional? Quais os factores que irão determinar as prioridades?
Uma outra omissão que me preocupou bastante desde a primeira leitura do documento foi a total falta de referência ao(s) público(s). Se as pessoas são a raison d´être dos museus, os destinatários finais de toda a sua actividade - sejam eles profissionais de museus, investigadores, público 'iniciado' ou, e sobretudo, público 'não iniciado' -, como é possível que nunca sejam claramente e directamente mencionadas no documento estratégico? Quando o desempenho dos museus nacionais se mede sobretudo, pelo menos publicamente, pelo número de visitantes, quando em alguns museus existe uma preocupação permanente em atrair mais pessoas, em diversificar a oferta e melhorar a qualidade da mesma, é decepcionante que uma estratégia para os museus do século XXI ignore por completo um dos factores que definem, ou deveriam definir, as prioridades na sua acção. Enquanto o(s) público(s) não forem claramente identificados como um factor determinante no planeamento estratégico, os museus continuarão a ser visitados e desfrutados por uma minoria; as pessoas continuarão a pensar que os museus são, sim, importantes, mas não se dirigem a elas, não lhes são relevantes; continuará a faltar um envolvimento afectivo e intelectual, que em alguns países faz com que a sociedade (a sociedade local e não os turistas estrangeiros…) se movimenta sempre que necessário em defesa dos seus museus e não se abstém e deixa esta luta apenas aos profissionais e aos ‘entendidos’. Se não olharmos para fora, é inevitável que continuemos a olhar para o umbigo, atitude da qual a redacção do Eixo 5 é mais um sinal. Aqui, na introdução, aparece pela primeira, mas também pela última, vez a palavra “comunicação”. Nas linhas que se seguem entende-se claramente que é de “comunicação interna” que se fala.
Para não falar apenas das omissões, foi com muito agrado que li no documento estratégico que se pretende monitorizar e avaliar a estratégia (Eixo 2). No entanto, não se especifica aqui a forma como esta tarefa será realizada. A definição de indicadores, para a avaliação da estratégia, mas também do desempenho dos museus em geral, é uma necessidade e uma obrigação, que vai muito além da contagem do número de visitantes e que é específica para cada museu, com base nos objectivos que se propõe a atingir. Alguns, como é normal, são comuns, outros dizem respeito à realidade muito específica de cada instituição. Deveremos procurar consultar e aprender com os países que já testaram e implementaram modelos de avaliação e não cair na tentação de começar do zero.
Deixei para o fim os modelos de gestão. Nos vários comentários que já li sobre este ponto da estratégia parece que a questão se resume na escolha entre uma visão mais comercial e outra mais virada para o estudo das colecções. Como se devêssemos escolher. Como se pudéssemos escolher… Mais uma vez, não será necessário começarmos do zero. Vários modelos – alguns melhores, outros piores – foram já testados e implementados noutros países. Na minha opinião, é a própria profissão, a do museólogo, que pode e deve formar os seus gestores. Pessoas que, se não a têm já, ganharão a sensibilidade necessária para gerir e dirigir espaços culturais e, concretamente, museus. Poderão ser pessoas vindas da área da história de arte, da arqueologia, da história, da sociologia, da animação cultural, etc; são cada vez mais pessoas vindas da área da economia. A gestão de museus é, em alguns países, um módulo essencial e imprescindível nos curricula dos cursos de museologia. Os cursos de leadership dirigidos aos profissionais de museus multiplicam-se no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Austrália (se bem que não devemos confundir leadership com managment). Tanto o ICTOP (Comité Internacional do ICOM para a Formação do Pessoal), como o INTERCOM (Comité Internacional do ICOM para a Gestão) poderão orientar as nossas decisões e apoiar as nossas acções.
5 comments:
Maria,
Parabéns ela tua iniciativa.
E parabéns também pela escolha do teu primeiro comentário.
Partilho das tuas opiniões em quase tudo: necessidade de uma visão mais global e verdadeiramente estratégica, centralidade dos públicos, importância dos instrumentos de avaliação, modelos de gestão e tipos de gestores. A ideia do gestor "puro e duro" constitui um equívoco em museus, amenos que seja "apenas" um subalterno, como acontece em alguns grandes museus da Europa e até no ICOM (o actual secretário-geral é um gestor que anets se ocupava do departamento de marqueting do Museu do Louvre).
Mas o centro de qalquer museu são os saberes que se geram a partir das sua scolecções, Ou seja, é a dinâmica criativa que possa estebelecer-se entre colecções e utilizadores (melhor do que públicos, porque mais abrangente).
Luís Raposo
Cara Maria,
Deixo um primeiro comentário sem sequer ter lido o post. Sacrilégio!!!
Apenas para te desejar as maiores felicidades com este blogue.
Beijo.
José Vale
(Tomar a palavra neste mundo dos museus sem ser 'dos museus' é arriscado, mas cá vai. Confio que a minha 'evangelização' no sector (feita por ti, Maria) me garante esse espaço. Também me é garantido enquanto público-de-museu.)
Pois então, os Museus e as estratégias, os Museus e o séc XXI.
Também eu li as 'estratégias' e acompanhei o ir e vir das direcções e respectiva discussão dos perfis. Tal como a Maria também eu (ainda que de uma perspectiva diferente e mais alargada) reclamo uma visão, quero saber para onde vamos, o que queremos que os Museus sejam.
Acima refere-se como central a ausência dos públicos das 'estratégias', 'raison d'être' dos museus... são mesmo? A discussão tem estado extremamente centrada em coleccções, acervos, edifícios e perfis, os públicos, na prática e no diálogo do dia a dia parecem-me um pouco esquecidos.
Depois, o papel ou perfil, de quem está à frente de um Museu. Esta questão está-me mais próxima pois também ela se coloca no âmbito das Artes Performativas. A questão do perfil e das funções necessárias é colocada porque se assume que há competências díspares (mas não irreconciliáveis) que deverão estar presentes na cabeça do Museu, competências que são exigidas contemporaneamente. No fundo falamos de capacidades de gestão e de 'direcção artística'. Penso que, à semelhança do que acredito poder acontecer nas Artes Performativas é possível uma direcção bicéfala em que nenhum dos 'directores' seja secundarizado... ié, desde que haja uma visão comum a cumprir e essa visão é a do próprio museu, é o museu e o seu projecto que dão substância a qualquer visão, prosseguida pela direcção (aliás, um projecto de museu não se pode extinguir no mandato do seu director, tem de ser mais sólido que isso). Diz-me a Maria e eu acredito, que a função de museólogo tem estas duas 'cabeças' integradas; serve, ainda assim, toda esta discussão de perfis e de modelos de gestão para, na minha perspectiva, nos desviar o olhar do que é o essencial: que museus temos e que museus queremos.
Eu cá... eu cá só quero os de arte e os 'divertidos'. Quero museus onde possa ir uma e outra e outra vez e aprender sempre, com igual prazer.
Permita-me, como visitante de museus, saudar o aparecimento do seu blog, que será mais um espaço de atenção e opinião sobre este campo. Entretanto, queria recomendar-lhe a leitura do "discurso" proferido pela ministra no momento da apresentação do Plano Estratégico (ver http://www.portaldacultura.gov.pt/imprensa/intervencoes/Pages/20100120_Int_EstrategiaMuseus.aspx ), onde encontra decerto uma "visão", um contexto para as medidas propostas, e uma resposta (ou um começo de resposta) para várias das suas preocupações. Se o documento divulgado pretendeu ser um enunciado conceptual e programático com um carácter sintético a desenvolver através da acção, a sessão foi longa, contou com três intervenções que aprofundaram o tema e continuou com as respostas às numerosos questões colocadas por uma Imprensa particularmente interventiva. Foi uma ocasião cujo conteúdo não se esgota nas escassas páginas do documento que refere, e que terá gerado legítimas expectativas a uma alargada audiência. Alexandre Pomar
Gostei de leer o primeiro texto do teu Blogue...
Bom preludio de trabalho onde, mais uma vez, se revela o teu espíritu de fada da cultura museológica.
Aos públicos... passem e entrem!!
O museu precissa de voz, e seus patrimónios de aprender a falar.
Lorena S. Querol
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