Monday 30 March 2015

O que há num título?



Escolher o título de uma exposição, actividade ou evento não é algo fácil. Não quando o que se pretende é que possa transmitir algo sobre o conteúdo e ser curioso ou engraçado o suficiente para atrair a atenção das pessoas – e, também, ser eficaz quando aplicado em materiais promocionais. O que normalmente se encontra ao abrir uma agenda cultural são títulos que apresentam o óbvio (por exemplo, o nome de um artista que podemos ou não conhecer) ou que tentam descrever o conteúdo de uma forma algo seca, maçadora ou repetitiva - palavras como "lugar", "memória", "olhar", "tesouros" são das mais preferidas por museus. Outro caso que devemos considerar é o de peças de teatro e performances contemporâneas, cujos títulos podem ser de 2-3 linhas, para serem depois abreviados para "uso diário" pela própria equipa artística e pelo público, levando ao que, provavelmente, deveria ter sido o título em primeiro lugar...

Tentei lembrar-me de títulos que funcionaram bem para mim e ocorreram-me logo dois:

"Unter 10" no Wien Museum (Foto: Maria Vlachou)
"Unter 10 - Wertvolles en miniatura" (Abaixo de 10 - Tesouros em miniatura), no Wien Museum, foi uma exposição de 2013 que apresentava objectos da colecção do museu escolhidos com base no critério rígido que nenhum deles podia ter mais de 10 cm de largura, altura, profundidade ou diâmetro. Desde objectos que procuravam “simplesmente” responder ao desafio da miniaturização, a utensílios do bébé, frascos de cheiro ou panfletos políticos ilegais, esta exposição fez-nos olhar (também com a ajuda de lupas ...), e olhar melhor, de maneira diferente, para a colecção. O museu não estava na minha lista de visitas, mas não pude resistir ao título.

Entrada da exposição "Disobedient Objects", V&A (Foto: Maria Vlachou)
Mais recentemente, "Disobedient Objects” (Objectos Desobedientes) foi outro título de exposição que chamou a minha atenção. Apareceu pela primeira vez no meu “feed” de notícias no verão passado, entre dezenas de diferentes títulos de notícias. Parei e abri o artigo. Citando o site do Victoria & Albert Museum, "Desde bules das Sufragistas a robots de protesto, esta exposição foi a primeira a examinar o papel poderoso de objectos em movimentos de mudança social. Demonstrou como o activismo político impulsiona uma riqueza de engenho no design e de criatividade colectiva que desafiam definições-padrão de arte e design." Tive a oportunidade de visitar a exposição em Novembro passado e correspondeu às minhas expectativas. O objecto que mais me tocou foi uma nota líbia desfigurada (o rosto rabiscado sendo o de Gaddafi). Lembrou-me de um líbio a ser entrevistado após ter visto o cadáver de Gaddafi: "Nós sempre pensámos que ele era um homem grande. Ele é pequeno, ele é tão pequeno."

Nota líbia desfigurada na exposição "Disobedient Objects", V&A (Foto: Maria Vlachou)

Vale a pena falar também de alguns exemplos refrescantes que surgiram recentemente em Portugal.


"Vivinha a saltar!" é uma exposição no Museu Bordalo Pinheiro que apresenta dois símbolos da cidade de Lisboa: a varina, uma figura popular na obra de Rafael Bordalo Pinheiro; e a sardinha, que se tornou num ícone da cidade e numa fonte de inspiração para artistas contemporâneos. O nome da exposição, "Vivinha a saltar!", um dos pregões mais famosos das varinas, tinha sido título de uma crónica sobre política e a sociedade portuguesa publicada no jornal "A Paródia", fundado por Bordalo Pinheiro.



Na semana passada, o Museu Municipal de Penafiel celebrou o Dia Mundial da Poesia, a 21 de Março, com "Dois garfos de conversa", uma conferência sobre os poetas da cidade, seguida de um jantar no museu. Conforme me explicou a directora do museu, título e cartaz foram criados pela equipa do Museu.



No mesmo dia, o colectivo de jovens Faz 15-25 celebrou o seu primeiro ano de existência no Museu Arpad Szenes - Vieira da Silva com filmes, poesia, palestras, oficinas e comida, inspirados na exposição temporária do museu "Sonnabend | Paris - New York" e dirigidos a públicos jovens. O título da iniciativa: "Faz-Tá POP!".




Por fim, a Fundação Calouste Gulbenkian surpreendeu-nos em Dezembro passado com um convite "P'ra Rir", um ciclo de cinema (agora na sua segunda edição), que dá às pessoas a oportunidade de ver cinema numa sala grande, o recentemente renovado Grande Auditório da Fundação. De acordo com João Mário Grilo, responsável pela programação, o riso pareceu-lhe ser um bom gesto inaugural. "E será errado pensar que se trata de (mais) um 'ciclo de comédias', porque no cinema, como na vida, se ri de muitos modos diferentes, e até nos dramas."


Retirado da página de Facebook da Fundação Calouste Gulbenkian.

Tanto nas instituições culturais grandes como nas pequenas, o processo de escolha de um título pode envolver diferentes pessoas e departamentos: curadores, directores, assessores de imprensa, as equipas de educação e de comunicação. Recentemente, a Fundação Gulbenkian decidiu envolver o público na escolha do título de uma exposição de 2016 no Museu Gulbenkian. Como mencionado no início do post, o objectivo ao escolher um título é que este possa transmitir algo sobre o conteúdo, atrair a atenção das pessoas, ser eficaz quando aplicado nos materiais promocionais (neste caso, um bom design gráfico é definitivamente uma vantagem). Um último conselho, dos nossos colegas do Australian Museum: "Assegure-se que os funcionários da recepção / frente-de-casa estão confortáveis ​​ao dizer o título em voz alta, pois muitas vezes são eles que vendem a exposição aos visitantes." E têm razão!


Agradecimentos: Elisabete Caramelo, Isabel Aguilar, Maria José Santos, Rui Belo, Sara Pais.


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