Monday, 23 May 2011

Rostos

Nuno Santos (Frente de Casa), Cidalina Ramos (Assistente de Bilheteira), Sérgio Joaquim (Técnico de Luz), Tiza Gonçalves (Directora de Produção), Rui Lopes (Técnico de Som). Fotos: Steve Stoer
Estes são os rostos de alguns dos meus colegas no São Luiz. Colegas de várias áreas (comunicação, técnica, produção). Uns cruzam-se com o nosso público, e são até seus conhecidos, outros nem por isso. Mas são todas pessoas, estas e muitas outras, que trabalham para que o produto final chegue aos nossos espectadores.

Estas fotografias foram inseridas no livro e no folheto da programação da Temporada 2010-2011, disponíveis ao público, acompanhadas pelas sugestões dos nossos colegas relativamente a essa mesma programação e também por umas palavras sobre aquilo que mais prazer lhes dá no seu trabalho no São Luiz. Encontram-se também nos janelões da fachada do teatro. E assim, a nossa instituição ganha um, ou melhor, vários rostos. Pelo menos era essa a nossa intenção: dar um primeiro passo para tornar o abstracto, concreto; o desconhecido, conhecido; o impessoal, pessoal, ou seja, o institucional, humano. Procurámos uma forma de apresentar ao público uma outra dimensão daquilo que envolve a apresentação de um espectáculo, aquela de que menos se fala. O único indicador que temos para a avaliação desta ideia são os comentários positivos que amigos e conhecidos partilharam connosco, mas, sobretudo, aqueles espectadores que, ao dirigirem-se à bilheteira, reconhecerem a nossa colega cuja fotografia estava no livro. (Quando chego a este ponto, penso sempre que o que deveríamos ter feito era organizar um focus group e procurar obter feedback qualitativo por parte de alguns membros do público. Mas parece que há sempre outras prioridades. Os estudos de público deveriam ser uma delas.)

É um facto que, em geral, as instituições culturais procuram comunicar o objecto (a exposição ou o espectáculo) e os artistas que o criaram ou que o interpretam. No entanto, existe esta outra vertente, a das pessoas que trabalham no teatro ou no museu ou na instituição cultural, que, no meu ver, deveria ser mais ‘explorada’ na relação com o público. Porque é através delas, e graças a elas, que se cria a relação permanente, duradoura. E é importante que esta relação ganhe um rosto, se torne pessoal e concreta.

Risto Nieminen, Director do Serviço de Música da Fundação Calouste Gulbenkian,
durante a apresentação da temporada ao público em 2010. (Foto: Márcia Lessa)
Achei fantástica a opção do director do serviço de música da Gulbenkian, Risto Nieminen, de ter marcado no ano passado um encontro com o público para apresentar a programação da temporada (que, se não me engano, era, na verdade, a sua primeira) e, através dela, a sua visão sobre o caminho que este serviço iria seguir sob a sua direcção. Não consegui estar presente na sessão, mas soube que esteve esgotada. E imagino que tenha sido muito gratificante para as pessoas que estiveram presentes conhecer o novo director - o seu rosto, a sua voz -, saber através dele o que tinha escolhido para lhes apresentar e porquê. Ou seja, aquela relação que normalmente se tem, e que se valoriza muito, com os meios de comunicação, que depois transmitem as notícias ao público, criou-se aqui com esse mesmo público. Uma relação privilegiada, na primeira pessoa. Estou curiosa em saber se houve a seguir outros momentos de encontro entre Risto Nieminen e o público, se se deu continuidade àquele primeiro passo. E, sobretudo, estou curiosa em saber se o novo director se encontrou, no espaço da Gulbenkian ou fora dele, com aqueles públicos que desde o início disse que gostaria que viessem assistir à sua programação. Como terá sido esse encontro? Como estará a correr essa relação?

A presença do director, da pessoa que dirige a equipa e que faz as escolhas, é algo fascinante para muitas das pessoas que frequentam instituições culturais. São encontros relativamente raros (o que é pena), às vezes muito gratificantes, e também fundamentais para a construção de pontes. São, entre outras coisas, uma forma de transmitir às pessoas a importância que têm para a nossa instituição, ou melhor, para as pessoas que nela trabalham. Em algumas ocasiões, poucas, presenciei o encontro de directores de museus com membros do público nas salas de exposições, a conversa informal - como se de amigos se tratasse -, a alegria no rosto dos visitantes por esse encontro inesperado, atreveria-me a dizer o privilégio que o mesmo parece ter sido para essas pessoas. Numa pesquisa que fiz recentemente para uma aula, encontrei fotografias do director do centro de ciência finlandês Heureka, Per-Edvin Persson - que conheci há muitos anos atrás, quando trabalhava nessa área - com membros do público: no primeiro caso, com os voluntários do centro, que completavam 10 anos de serviço nele, e no segundo, na recepção do visitante 6.000.000. Breves encontros que podem fazer toda a diferença numa relação.

Foto: Saila Puranen/Heureka

No entanto, e para voltar ao início, as nossas instituições não são feitas só de artistas nem só de directores. A verdade é que existem muitas outras pessoas, que trabalhar em diferentes áreas nos bastidores, que podem igualmente fascinar o público e contribuir na criação de uma relação diferente, mais pessoal, de maior compreensão e entendimento. Várias vezes, quando o público aplaude os intérpretes de um espectáculo, estes agradecem aos técnicos de som e de luz, apontando na direcção deles e aplaudindo. E eu várias vezes pensei quantas pessoas entre os espectadores entenderão o significado deste gesto, perceberão a quem se dirige e porquê.

É raro promovermos encontros entre os frequentadores dos nossos espaços e as pessoas que neles trabalham, nas mais variadas áreas. Mas nos casos em que presenciei estes encontros - que normalmente acontecem quando um funcionário dá uma visita guiada a um familiar ou amigo -, garanto-vos que senti a existência do mesmo fascínio, do mesmo sentimento de ‘privilégio’, como quando se está perante um artista ou um director. É algo especial, diferente. É uma forma de uma pessoa se sentir como parte daquele espaço, porque fica a conhecer o que se passa por trás, como é que se faz e quem é a pessoa que o faz. Esta é uma relação. Não entre um edifício e o público, mas entre as pessoas que nele trabalham e as pessoas que o frequentam ou possam vir a frequentá-lo. Penso que esta deveria ser uma vertente a explorar.

Agradecimentos: Elisabete Caramelo, Mikko Myllykoski

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