Nos últimos anos, temos sido testemunhas da solidariedade que se gera a nível mundial quando um desastre se abate sobre um país, mesmo distante do nosso, afectando as vidas de milhares de pessoas. Poderia referir o tsunami na Indochina, o terramoto no Haiti, as cheias no Paquistão e, mais recentemente, a crise humanitária no Corno de África. Pessoas com mais ou menos dinheiro, sensíveis à dor humana, procuram contribuir, dentro das suas possibilidades, para aliviar essa dor, mas, também, para se sentirem elas próprias bem, para se sentirem humanas, úteis, solidárias. Nas últimas semanas tenho acompanhado de perto os esforços do World Food Programme (WFP) das Nações Unidas para a sensibilização da opinião pública relativamente à situação que se vive no Corno de África e para a angariação de fundos. E tenho estado a pensar que o sector cultural tem muito a aprender com o social.
Nos últimos anos, apoiei o WFP em várias ocasiões. Poucos dias depois da minha última contribuição recebi este email. Não se tratava apenas de um email de agradecimento. Era algo mais. O WFP queria informar-me sobre o impacto que a minha contribuição tinha tido no terreno; trazia-me notícias; partilhava comigo histórias pessoais; explicava-me quais os próximos passos. Tudo isto de uma forma muito pessoal, informal, clara, que pretendia, obviamente, dar ao destinatário provas tanto do empenho e eficiência da instituição apoiada, como da importância da própria pessoa que apoia este processo.
Ao mesmo tempo, o WFP comunicava com o público através do seu website e também através de posts regulares no Facebook. Partilhava notícias, boas e más; mostrava fotografias e vídeos das zonas afectadas; lembrava às pessoas de que forma poderiam ajudar (não só com dinheiro); e, em finais de Julho e durante uma semana, tiveram um colaborador em Dadaab, o maior campo de refugiados no Quénia, que fazia reportagens e entrevistas, mas também respondia a perguntas e dúvidas do público enviadas através do Facebook (veja aqui o vídeo do primeiro dia e siga depois os restantes no You Tube). Foi também nessa altura que Josette Sheeran, a responsável pelo WFP, fez uma TED Talk poderosa e profundamente inspiradora, intitulada Ending hunger now, que foi vista por milhares de pessoas.
Durante esta campanha, infelizmente longe de estar terminada, o WFP:
- lembrava constantemente e através de todos os meios e canais que tinha à sua disposição a sua missão (“O World Food Programme combate a fome em todo o mundo, salvando vidas durante emergências, enquanto constrói um futuro melhor para a próxima geração. O WFP é financiado apenas com contribuições voluntárias.”);
- partilhava a sua visão, objectivos, próximos passos;
- contava histórias do terreno;
- apresentava provas do seu trabalho e das suas intervenções;
- tinha um discurso directo, coloquial, compreensível;
- disponibilzava em todos os suportes digitais o botão “Donate” (um dos grandes objectivos), facilitando ao máximo o processo;
- não se esquecia de agradecer e… de pedir mais.
- disponibilzava em todos os suportes digitais o botão “Donate” (um dos grandes objectivos), facilitando ao máximo o processo;
- não se esquecia de agradecer e… de pedir mais.
Fotos da série "Uma família chega a Dadaab", retiradas do website do WFP. |
- Quantas instituições culturais em Portugal têm uma missão que seja algo mais emocionante do que “X é uma instituição cultural de âmbito europeu ao serviço da comunidade nacional” ou “Y é gerida por uma Fundação de direito privado e utilidade pública, que tem por fins a promoção da cultura”?
- Quantas instituições culturais usam os meios à sua disposição para, em permanência, afirmarem e partilharem com as pessoas essa missão? Ou a sua visão?
- Quantas instituições culturais comprometem-se partilhando publicamente objectivos concretos e dão feedback sobre o processo para a realização dos mesmos?
- Quantas instituições culturais contam histórias sobre o seu dia-a-dia, as pessoas que nelas trabalham ou que as frequentam, desmistificando o que se passa dentro das suas paredes e demonstrando o seu impacto?
- Quantas instituições culturais têm um rosto humano?
- Quantas instituições culturais falam uma língua compreensível?
Quem conseguiu resumir tudo isto com muita perspicácia e sentido de humor foi Adam Thurman, fundador da organização Mission Paradox e Director de Comunicação do Court Theatre em Chicago, num discurso intitulado Power and the Arts, que tive a oportunidade de ver na semana passada. Na verdade, uma palestra inspiradora sobre o poder da comunicação na forma como nos relacionamos com outras pessoas, com os nossos ‘públicos’. Na forma como criamos a nossa ‘família’ e fazemo-la crescer.
Foi também na semana passada que a Casa Conveniente tomou uma iniciativa que, pelo que sei, é inovadora em Portugal (mas acredito que o futuro das nossas instituições culturais passe mesmo por aqui): lançou no Facebook a campanha Ser mecenas da Casa Conveniente por €12. Os amigos da Casa Conveniente reagiram imediatamente e, como seria de esperar, muito positivamente. Vão apoiar com esta pequena quantia (ou mais até) e vão espalhar a palavra. Porque acreditam no projecto; porque é algo que os move; porque querem que continue a proporcionar-lhes momentos únicos, inesquecíveis; e porque querem fazer parte dele. Penso que o próximo passo para a Casa Conveniente deveria ser comunicar com aqueles que não a conhecem: partilhar a sua visão; mostrar a sua acção; e demonstrar o seu impacto. E para isso, penso que seria uma boa ideia ‘usar’ também os seus amigos, mais e também menos conhecidos, registando e partilhando os seus pensamentos e os seus sentimentos sobre o projecto. Pessoas (e não instituições) a partilhar com outras pessoas aquilo que as move. E assim a família vai crescendo.
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