Monday 9 September 2013

Blogger convidado: "Arte sitiada", por Chaymaa Ramzy El Dessouky (Egipto)

Existe um tipo especial de mulher em Alexandria: determinada, teimosa, confiante, cheia de energia, ideias e sonhos, e com uma enorme capacidade de trabalho. Chaymaa Ramzy é esse género de Alexandrina. Dadas todas estas características, não é uma pessoa que cede perante as dificuldades ou quando enfrenta controvérsia. Entre os vários projectos em que está envolvida, aquele que a tem mesmo cativado é o Marsam 301, um projecto com base em Belém, Palestina, que envolve pessoas de vários países árabes e cuja sede ela não pode visitar. Pelo menos por agora… mv

Eventos de rua (Foto: Marsam 301)

“Não me lembro quando li exactamente a minha primeira banda desenhada, mas lembro-me exactamente o quanto me senti libertado e subversivo, como resultado.”
― Edward W. Said, Palestine

Como é que se define o ‘sítio’? Trata-se de um cerco físico ou sobretudo psicológico? Somos capazes, como pessoas simples, de ultrapassar as suas barreiras? Será o sítio uma fronteira? Ou trata-se apenas de uma limitação numa determinada terra ou espaço que deveríamos estar constantemente a sonhar em como voar por cima dela?
Questões que podem ter respostas diferentes, que cada um de nós pode interpretar de acordo com a sua própria situação, local ou estilo de vida.
Palestina: as pessoas, o território, o país e a Terra Santa. A experiência antecipada por todos. Alguns de nós podem, outros não. Podemos sonhar com a beleza dos seus becos, a gentileza das suas pessoas e maravilhar-nos com as histórias sem fim das suas casas e ruas.
Quando Monther Jawabreh, um proeminente artista visual de Belém, começou a pensar em fundar um novo espaço cultural, “Marsam 301” (Estúdio 301), não pensou em promover a arte nos seus espaços tradicionais, mas noutros diferentes, onde uma pessoa pode ser tocada por uma história, ouvir um dialecto local, ouvir a vida em alta voz em espaços como casas, escolas, hospitais e talvez prisões.
Marsam 301 é um espaço cultural independente, localizado na cidade de Belém, Palestina. Um espaço que destaca o artista visual palestiniano e a arte visual palestiniana na região árabe e talvez no mundo! Uma visão partilhada com outros artistas, gestores culturais e apoiantes da Palestina e países árabes vizinhos.
O nome “301” advém do posto de controlo Kabr Rahil (Túmulo de Raquel), que se encontra entre Jerusalém e Belém. Um posto de controlo israelita conhecido como ‘Barrier 300’ (Barreira 300 – “Parar para inspecção”) bloqueia a passagem dos palestinianos para e de Jerusalém. Marsam 301 fica a 2 quilómetros do posto de controlo, mesmo no centro da cidade de Belém. Portanto, Marsam 301 tem esse nome procurando ser a segunda barreira que obrigará os palestinianos a pararem para ver arte. 301 é também o número do edifício.
Marsmam 301, o espaço (Foto: Marsam 301)
“Assaltar casas, raptar pessoas, bombardear cafés” pode soar perigoso! Mas quando ouvimos isso da equipa do Marsam 301, percebemos a sua missão e ansiedade em assaltar casas com Arte, raptar pessoas e mantê-las durante muito tempo em galerias de arte e bombardear todos os cafés do beco com cores. Uma visão que advém do seu contexto social e do seu dialecto diário, de transformar o actual estado de sítio social e político num sentimento de felicidade e apreciação pelas artes. Uma visão que possa libertar as mentes e sensibilizar sobre a verdadeira relação que deveria existir entre o artista e a sua comunidade.    
Os três programas principais do Marsam 301 incluem nesta fase a promoção da arte visual palestiniana e a capacitação de jovens artistas palestinianos. Um outro programa importante pretende trazer as artes para a rua e espaços não-tradicionais, e até de criar arte em formas não-tradicionais. Por fim, uma residência artística que recebe outros artistas dispostos a viver a experiência palestiniana de intercâmbio artístico, provenientes da região árabe ou de qualquer outra parte do mundo.
Através destes três  programas, a equipa do Marsam 301 deseja ter um papel importante na cena artística palestiniana, juntando um grande número de artistas emergentes com outros mais proeminentes e estabelecidos. Mas também, construir uma nova relação entre estes dois tipos de artistas que poderão beneficiar nesta fase da partilha de experiências e do debate de uma série de tópicos. Uma ideia que foi confirmada e apreciada por Tamam Al Akhal, um proeminente artista visual palestiniano, durante o último encontro da equipa em Amã, Jordânia. Al Akhal partilha a visão e objectivos do Marsam 301.
O recente encontro da equipa em Amã, Jordânia (Foto: Marsam 301)

Esta extraordinária experiência, na minha opinião (tendo eu o orgulho de ser um dos seus fundadores, juntamente com Iman Bachir do Líbano e Ahed Izhiman da Palestina), irá contribuir muito para a cena artística palestiniana e ter um impacto muito rico nas pessoas e na comunidade. Irá tornar as artes acessíveis em qualquer lugar e a qualquer hora. Fornecendo um melhor conhecimento das artes que reflectem sobre a realidade do país e apresentam as opiniões e emoções das pessoas aos de fora. Uma experiência que coloca os artistas no coração da sociedade.
O Marsam 301 continuará com a sua estratégia de ajudar no desenvolvimento da sociedade palestiniana, esperando que, um dia, as pessoas ganharão a sua própria liberdade e nunca mais irão parar para inspecção ou sentir-se sitiadas!
Para contactar o Marsam 301, por favor escrevam para marsam301(at)gmail.com ou visitem-nos no Facebook.

Chaymaa Ramzy El Dessouky é Program Officer da Fundação Anna Lindh em Alexandria, Egipto; International Fellow of Arts Management no Kennedy Center for Performing Arts, Washington DC; membro fundador de Marsam 301 em Belém, Palestina. Nascida em Alexandria, licenciou-se em Business Administration and Strategic Marketing na Faculdade de Comércio - Alexandria University. Com a sua experiência como formadora, apoia várias organizações da sociedade civil e outros projectos emergentes na região árabe, ajudando-os a criar estratégias que aumentam a sua capacidade na área do marketing, da publicidade e do planeamento estratégico. Durante o seu fellowship no Kennedy Center, quer concentrar-se no desenvolvimento de um plano de marketing que irá ajudar a envolver a imprensa e de incorporar plataformas de redes sociais para fortalecer a organização de eventos locais no Egipto. Com a Fundação Anna Lindh, organiza anualmente o Festival Intercultural de Alexandria “Farah El Bahr”. Está igualmente envolvida na criação do plano estratégico do Marsam 301 em Belém, Palestina, fazendo parte de uma equipa regional de pessoas de diferentes países árabes.

Contactos:
Chaymaa.ramzy(at)gmail.com
Chaymaa.ramzy(at)bibalex.org

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