Nos dias 28 e 29 de Abril, e a propósito do Dia Mundial da Dança, a REDE – Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea organizou um encontro sobre Sustentabilidade Económica e Políticas de Financiamento nas Artes Performativas.
O modelo inglês foi apresentado por Betsy Gregory, Directora Artística da Dance Umbrella, um dos mais importantes promotores de dança contemporânea no Reino Unido. Ao começar a sua comunicação, Betsy Gregory esclareceu que se sente desconfortável quando tem que falar da arte na linguagem dos negócios, que não gosta de falar de angariação de fundos, não gosta de ser confrontada com a agenda social do governo britânico. “Parece que nos esquecemos da arte”, afirmou. “Parece que só falamos da dança como uma forma de combater a obesidade na infância…”.
Fiquei a pensar nestas palavras, enquanto a oradora prosseguia com a sua comunicação. A questão do financiamento das artes e da cultura em geral – o porquê e o como – é um capítulo demasiado grande para ser brevemente comentado neste blog. E até em países como o Reino Unido, onde tudo parece ser mais linear, mais claro, não faltam as críticas relativamente ao apoio incondicional aos ‘grandes’ e a luta que tem que ser travada pelos ‘pequenos’ para conseguirem o precioso apoio. Portanto, não pretendo abrir aqui esta discussão, mas gostava de comentar as palavras de Betsy Gregory.
Concordo com ela que não podemos esquecer qual é o nosso core business. O que as artes sabem fazer melhor é maravilhar, inspirar, surpreender, entreter, fazer-nos olhar para o mundo, enfrentar os nossos problemas, esquecermo-nos deles... Acho que é por isso mesmo que não nos devemos sentir desconfortáveis quando temos que falar a linguagem dos negócios; ou quando nos são apresentados os objectivos de uma agenda social.
No Reino Unido, onde a atribuição de apoio financeiro pelo Estado é feita com base em objectivos, as estruturas culturais vêem-se obrigadas a negociar com os representantes do governo da forma como estão a negociar apoios financeiros junto de instituições privadas. Se pretendem ter sucesso na captação de fundos, têm que estudar a agenda do ‘patrocinador’ e saber adaptar o seu discurso. Como dizia no post Lugares de encontro, nós não somos nem assistentes sociais, nem terapeutas, nem forças de paz, nem políticos, nem advogados, nem padres. Mas somos relevantes. E temos que ser capazes de mostrar a nossa relevância, promover o nosso trabalho e... talk business.
“Temos que provar que somos bons naquilo que fazemos”, disse Betsy Gregory, “e pedem-nos para o provarmos apenas com números. Assim, até estruturas que promovem má arte podem receber financiamento, porque preenchem todos os pré-requisitos”. Penso que é neste ponto mesmo que surge muitas vezes um equívoco. A pergunta de um membro da audiência, “Como é que se pode avaliar a qualidade?”, veio demonstrá-lo. Museus e artistas mostram-se frequentemente incomodados por terem que dar provas do seu trabalho. No entanto, o que se pretende avaliar não é a qualidade do trabalho (boa/má exposição, boa/má interpretação), mas sim o impacto desse mesmo trabalho na comunidade, essa mesma comunidade de contribuintes que o financia. Nesse sentido, o que se deve reivindicar, na minha opinião, é que a avaliação seja feita com base em indicadores quantitativos e qualitativos. Os números são importantes, são bons indicadores, permitem-nos acompanhar as tendências, são fundamentais. No entanto, a interpretação daquilo que nos dizem ganha outro conteúdo, outra profundidade, quando são cruzados com dados sobre a qualidade da experiência. “Como se faz?”, pergunta-se muitas vezes.
Penso que uma das formas mais simples é o registo das reacções, emoções e opiniões dos membros do público. São eles os destinatários finais da nossa acção, portanto eles podem dar-nos feedback sobre a experiência que tiveram, a forma como os tocou, as questões que lhes levantou. Um simples vídeo do Dance Umbrella mostra a forma básica de o fazer, no âmbito de um projecto chamado Bodies in Urban Spaces (projecto esse apresentado ontem na cidade de Alcobaça, no âmbito das celebrações do Dia Mundial da Dança):
Uma outra forma, muito utilizada por museus, seria o registo das memórias das pessoas que assistem aos espectáculos, participam em eventos e actividades ou visitam exposições. Ir ao seu encontro meses ou anos depois e procurar saber o que ficou da experiência é também um indicador do impacto que a mesma teve nelas. Um livro muito interessante sobre a memória é o Dream spaces: memory and the museum, de Gaynor Kavanagh, para além da ampla bibliografia sobre estudos de público que incluem projectos e experiências ligados às memórias.
Por outro lado, em países onde os apoios financeiros do Estado são distribuídos sem pedir nada em troca, este financiamento parece ser um dado adquirido, não necessita de provas de desempenho. O Estado deve financiar porque a cultura faz bem. Porque a cultura é importante. Porque sim. Um “porque sim” que esconde às vezes alguma arrogância, assim como pouca compreensão e empenho.
O modelo inglês foi apresentado por Betsy Gregory, Directora Artística da Dance Umbrella, um dos mais importantes promotores de dança contemporânea no Reino Unido. Ao começar a sua comunicação, Betsy Gregory esclareceu que se sente desconfortável quando tem que falar da arte na linguagem dos negócios, que não gosta de falar de angariação de fundos, não gosta de ser confrontada com a agenda social do governo britânico. “Parece que nos esquecemos da arte”, afirmou. “Parece que só falamos da dança como uma forma de combater a obesidade na infância…”.
Fiquei a pensar nestas palavras, enquanto a oradora prosseguia com a sua comunicação. A questão do financiamento das artes e da cultura em geral – o porquê e o como – é um capítulo demasiado grande para ser brevemente comentado neste blog. E até em países como o Reino Unido, onde tudo parece ser mais linear, mais claro, não faltam as críticas relativamente ao apoio incondicional aos ‘grandes’ e a luta que tem que ser travada pelos ‘pequenos’ para conseguirem o precioso apoio. Portanto, não pretendo abrir aqui esta discussão, mas gostava de comentar as palavras de Betsy Gregory.
Concordo com ela que não podemos esquecer qual é o nosso core business. O que as artes sabem fazer melhor é maravilhar, inspirar, surpreender, entreter, fazer-nos olhar para o mundo, enfrentar os nossos problemas, esquecermo-nos deles... Acho que é por isso mesmo que não nos devemos sentir desconfortáveis quando temos que falar a linguagem dos negócios; ou quando nos são apresentados os objectivos de uma agenda social.
No Reino Unido, onde a atribuição de apoio financeiro pelo Estado é feita com base em objectivos, as estruturas culturais vêem-se obrigadas a negociar com os representantes do governo da forma como estão a negociar apoios financeiros junto de instituições privadas. Se pretendem ter sucesso na captação de fundos, têm que estudar a agenda do ‘patrocinador’ e saber adaptar o seu discurso. Como dizia no post Lugares de encontro, nós não somos nem assistentes sociais, nem terapeutas, nem forças de paz, nem políticos, nem advogados, nem padres. Mas somos relevantes. E temos que ser capazes de mostrar a nossa relevância, promover o nosso trabalho e... talk business.
“Temos que provar que somos bons naquilo que fazemos”, disse Betsy Gregory, “e pedem-nos para o provarmos apenas com números. Assim, até estruturas que promovem má arte podem receber financiamento, porque preenchem todos os pré-requisitos”. Penso que é neste ponto mesmo que surge muitas vezes um equívoco. A pergunta de um membro da audiência, “Como é que se pode avaliar a qualidade?”, veio demonstrá-lo. Museus e artistas mostram-se frequentemente incomodados por terem que dar provas do seu trabalho. No entanto, o que se pretende avaliar não é a qualidade do trabalho (boa/má exposição, boa/má interpretação), mas sim o impacto desse mesmo trabalho na comunidade, essa mesma comunidade de contribuintes que o financia. Nesse sentido, o que se deve reivindicar, na minha opinião, é que a avaliação seja feita com base em indicadores quantitativos e qualitativos. Os números são importantes, são bons indicadores, permitem-nos acompanhar as tendências, são fundamentais. No entanto, a interpretação daquilo que nos dizem ganha outro conteúdo, outra profundidade, quando são cruzados com dados sobre a qualidade da experiência. “Como se faz?”, pergunta-se muitas vezes.
Penso que uma das formas mais simples é o registo das reacções, emoções e opiniões dos membros do público. São eles os destinatários finais da nossa acção, portanto eles podem dar-nos feedback sobre a experiência que tiveram, a forma como os tocou, as questões que lhes levantou. Um simples vídeo do Dance Umbrella mostra a forma básica de o fazer, no âmbito de um projecto chamado Bodies in Urban Spaces (projecto esse apresentado ontem na cidade de Alcobaça, no âmbito das celebrações do Dia Mundial da Dança):
Uma outra forma, muito utilizada por museus, seria o registo das memórias das pessoas que assistem aos espectáculos, participam em eventos e actividades ou visitam exposições. Ir ao seu encontro meses ou anos depois e procurar saber o que ficou da experiência é também um indicador do impacto que a mesma teve nelas. Um livro muito interessante sobre a memória é o Dream spaces: memory and the museum, de Gaynor Kavanagh, para além da ampla bibliografia sobre estudos de público que incluem projectos e experiências ligados às memórias.
Por outro lado, em países onde os apoios financeiros do Estado são distribuídos sem pedir nada em troca, este financiamento parece ser um dado adquirido, não necessita de provas de desempenho. O Estado deve financiar porque a cultura faz bem. Porque a cultura é importante. Porque sim. Um “porque sim” que esconde às vezes alguma arrogância, assim como pouca compreensão e empenho.
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