Monday, 25 September 2023

O que é a política e para que serve a cultura?

A onda de calor em Chicago em 1995
(imagem retirada da apresentação de Liva Kreislere)

No início de Agosto, tive a oportunidade de participar numa escola de verão organizada pelo Latvian Centre for Contemporary Art e dedicada ao tema “Care of Earth. Care of People” (Cuidar da terra. Cuidar das pessoas). Pouco antes de partir, tive a oportunidade de assistir a uma parte da apresentação da jovem arquitecta e urbanista, Liva Kreislere, sobre planeamento cultural. O planeamento cultural é uma abordagem ao desenvolvimento da cidade que olha para a cidade como um fenómeno cultural e concentra-se fortemente na população local, nos agentes culturais locais que são partes interessadas e no envolvimento municipal. É um método onde os artistas e as instituições culturais tomam cada vez mais uma posição central, com um contributo comprovado para o bem-estar social, bem como para a melhoria do envolvimento cívico dos cidadãos. “A cultura”, disse Liva, “está intimamente ligada à saúde, à economia e à política”. Um dos exemplos que mencionou foi o da onda de calor mortal, em 1995, em Chicago. Segundo um estudo, houve maior taxa de sobrevivência entre a população idosa em bairros com fortes ligações entre os seus membros. Comunidades estreitamente unidas cuidaram melhor dos seus idosos, especialmente vulneráveis dadas as circunstâncias.

Monday, 5 June 2023

Museus irrequietos

Chéri Samba, "Reorganisation". AfricaMuseum, Tervuren (Foto: Maria Vlachou)

Acompanhar o trabalho de museus que se questionam e que nos questionam é particularmente entusiasmante, motivador e inspirador. Num meio bastante conservador e pesado, estes museus são poucos, muito poucos ainda, e é refrescante poder identificar aquela liderança que mexe com o que for necessário e que ajuda a trazer mudanças necessárias, contaminado aos poucos todo o sector. É neste tipo de museus que eu vejo um esforço verdadeiro e honesto para serem úteis à sociedade, para fazerem parte dela, para serem relevantes.

Sunday, 14 May 2023

E amanhã, o que acontece?

 

Último dia do projecto "Esta Máquina Cerca o Ódio e Força-o a Render-se"
em Ovar (2022)

Em 2022, tive a felicidade de participar num projecto muito bonito da ondamarela, chamado ”Esta Máquina Cerca do Ódio e Força-o a Render-se. Era um projecto que propunha a pessoas de diferentes idades em diferentes localidades do país abordar as questões do ódio, do preconceito, da diferença e da liberdade através de novas criações artísticas, construídas com essas mesmas pessoas. No último dia do projecto, discutíamos o que tinha sido esta experiência para os diferentes participantes. Penso muitas vezes numa adolescente numa dessas rodas de conversa. Quando disse “Os artistas vão-se embora hoje, o projecto acaba. O que acontece amanhã?”, ela murmurou: “Amanhã vai ser um dia triste.”

Saturday, 15 April 2023

Liberdade para quê? Cultura para quê?

 


A minha palestra na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, no dia 13 de Abril de 2023, no âmbito do ciclo "Portugal - 50 anos (1973-2023): O que mudou? O que falta fazer?". Pode ser lida aqui.

Sunday, 1 January 2023

O ano do cuidado radical

Perdiz no Cabo Sounio, 2014 (Foto: Maria Vlachou)


Há pouco mais de dez anos, lembro-me da indignação que senti com um artigo de Clara Ferreira Alves no jornal Expresso, onde criticava os jovens gregos por se casarem quando o país atravessava uma grave crise económica. Considerava essa atitude irresponsável, reveladora de uma falta de noção. Fiquei com raiva porque, no meu ver, a esperança e a celebração são formas de resistir. A determinação de celebrar perante uma adversidade é um acto de amor, amor pela vida, amor próprio e amor pelos outros.

Pensei nisso em diversas outras ocasiões e também ontem à noite, quando vi o fogo de artifício da minha janela e em muitos outros lugares do mundo. Nunca gostei muito do fogo de artifício, sempre me pareceu uma extravagância desnecessária e, também, provocadora de um barulho angustiante para várias pessoas e animais. Mais recentemente, descobri os seus efeitos poluentes. Mas este ano, senti que o seu som “explosivo” era também uma expressão da nossa falta de empatia, pois os ucranianos, enquanto celebravam também a chegada do novo ano (um acto de amor, esperança e desafio), foram mais uma vez atacados e tiveram que correr para os abrigos.

Saturday, 3 December 2022

É mesmo tão difícil de compreender?

Foto: Justo Stop Oil via The New York Times

“Museus apertam vigilância preocupados com ações de ‘terrorismo’ ambientalista contra arte”. Não sei se foi a palavra “terrorismo” no título que me chocou mais ou as próprias respostas dadas ao jornalista por diferentes directores de museus portugueses. Respostas que revelam total distanciamento da questão da emergência climática e do papel e impacto que os museus têm sobre ela. Fiquei estupefacta quando o director de um museu nacional afirmou que tinha “alguma dificuldade em perceber o que os museus e as obras de arte têm a ver com este tipo de protesto ambientalista” e que “Está relacionado com a questão do petróleo e da poluição, mas as obras de arte não têm culpa nenhuma. São ações mediáticas, mas é difícil de perceber porque têm as obras de arte de pagar por isto.” Um outro director de um museu nacional disse que considera estas ações preocupantes porque os museus “guardam, restauram e exibem coleções únicas no mundo, [que] estes casos são ‘preocupantes’ para estes espaços culturais, porque "colocam em risco um património que é de todos" e que "deve ser protegido para as atuais e futuras gerações" (essas palavras não serviriam perfeitamente para discutir o nosso património natural e a nossa obrigação para com as gerações futuras?).

Sunday, 2 October 2022

A saúde mental dos profissionais dos museus em Portugal: quem se importa?

 

29 de agosto de 2022; Columbus, OH, EUA; Funcionários e apoiantes do Columbus Museum of Art reúnem-se à frente do museu, antes de entregarem uma carta à administração, solicitando o reconhecimento voluntário do sindicato CMA Workers United. Créditos: Adam Cairns-The Columbus Dispatch

“Nos últimos meses, a equipa de liderança do YBCA [Yerba Buena Center for the Arts] tem lidado com os impactos e a volatilidade sem precedentes causados pela pandemia do COVID-19.

(…) Hoje, devido a estes impactos, é com pesar que anuncio a eliminação de 27 postos de trabalho no YBCA. Isto representa mais de um terço da nossa equipa, principalmente em postos directamente ligados a eventos e actividades ao vivo, que não se realizarão no futuro próximo. Como uma organização que se preocupa profundamente com os seus funcionários, evitámos fazer estas mudanças enquanto as nossas finanças o permitiram. Também considerámos cuidadosamente a equidade em todas as nossas decisões.