“It's too easy to blame the organization and the system and the bottom line for decisions that a person would never be willing to take responsibility for. Whenever you can, work with people who take it personally.” Seth Godin no seu blog
Wangari Maathai (Foto retirada do site The Green Belt Movement) |
Foi com muita curiosidade que comecei a ler no outro dia o artigo Good bosses are the same today as they were in 1992, porque penso muitas vezes naquilo que faz de uma pessoa um bom líder (independentemente da escala). O autor do artigo, Robert Sutton, afirma que muitas coisas podem estar a mudar, podem ter que ser reinventadas, mas não a definição de um grande líder (ou chefe ou gestor ou director). E passo a citar: “(…) Nós, humanos, ansiamos por seguir outros que são competentes o suficiente para trazer recursos, ensinar-nos novas competências e gerar atenção e prestígio perante pessoas influentes (…) Queremos também líderes justos, que nos protejam, que nos façam sentir acarinhados e respeitados, que injectem humanidade (…) Conforme mostra a investigação de mais de cinquenta anos, tratar as pessoas com respeito, encorajá-las a participar e a fazer sugestões, ouvi-las é tão importante como sempre foi. O mesmo é verdade quanto ao estabelecer um caminho claro, tomar decisões e assumir a responsabilidade (…)”.
Encontro nestas palavras muitas das coisas sobre as quais tenho reflectido ao ler as biografias de pessoas que considero que foram bons líderes, ao pensar em pessoas que foram meus superiores, ao avaliar-me a mim própria como chefe de equipas ou ao analisar, ultimamente, os casos de organizações que têm enfrentado grandes desafios e as atitudes e opções tomadas pelas pessoas que as dirigem. Um líder reúne qualidades que lhe permitem traçar e seguir um caminho, mas ao mesmo tempo inspirar, juntar e guiar muitas outras pessoas, que são essenciais para a concretização da sua visão e o cumprimento da missão. E algo em que penso muitas vezes é que, ao longo deste percurso – muitas vezes difícil, complicado, desanimador, esgotante e até solitário - uma das coisas que distinguem um líder é o facto de saber dizer “não”, quando seria muito mais fácil e cómodo dizer “sim”.
Isto leva-me ao caso do Penumbra Theatre, que recentemente uma amiga trouxe à minha atenção. Aberto desde 1976 na cidade de St. Paul (Minnesota, EUA), assume como missão promover o respeito e a tolerância através do diálogo sobre questões de raça e racismo. O teatro é conhecido por assumir riscos, esticar os limites e introduzir novas vozes no teatro americano. No entanto, o Penumbra Theatre passou por um momento particularmente difícil no início dos anos 2000. Um subsídio estatal considerável, que lhes deu segurança para poderem investir na construção de um novo teatro, acabou por ser vetado, deixando-os seriamente endividados. As consequências foram as esperadas: funcionários desmotivados e frustrados, membros do board que deixaram de confiar na missão do teatro, doadores (ou seja, mecenas, patrocinadores e membros) que começaram a questionar a gestão financeira da estrutura e o encerramento a tornar-se quase realidade. Foi criada uma comissão de reestruturação e, com o objectivo de começar por reconstruir a confiança dos doadores, contratou uma gestora experiente e persistente, Chris Widdess, que, por sua vez, destacou três áreas-chave: reassumir o compromisso relativamente à missão do teatro, àquilo que o torna único e essencial; construir relações a longo prazo, interna e externamente; e criar um plano a longo prazo. Vale mesmo a pena ler aqui tudo sobre este estudo de caso, no entanto, aquilo que, de modo particular, chamou a minha atenção foi a afirmação de Widdess que dizer "não" foi fundamental no processo de reestruturação. Acredito que assim tenha sido, e que tenha acontecido porque tanto Widdess como Lou Bellamy, fundador e director artístico do Penumbra Theater, têm uma ideia clara sobre a missão do teatro e o futuro que querem traçar para ele. Foi essa missão, essa visão, que quiseram partilhar tanto com os doadores como com os espectadores. E fizeram o que foi necessário para a defender, incluindo dizer “não”. Quatro anos depois, em 2007, o Penumbra Theatre tinha recuperado.
Foi também no 'saber-dizer-não' que pensei quando vi o programa do Câmara Clara sobre o “Como funcionam os dinheiros para a cultura”, com António Gomes de Pinho e Pedro Gadanho. O programa preparou uma reportagem sobre o modelo de financiamento americano na qual o jornalista responsável afirmava que todos os anos a Metropolitan Opera apresenta as mesmas obras populares, porque é isso que os mecenas querem (terá sido esta uma afirmação baseada em informações dadas por fontes seguras?). No mesmo programa, foi feita referência ao apoio público como garantia essencial para a autonomia na programação. Pedro Gadanho – curador no MOMA – foi rápido em esclarecer que não sente nenhuma pressão no exercício das suas funções por parte dos mecenas e que actua com perfeita autonomia. No entanto, eu diria que esta questão não está propriamente relacionada com o dilema “apoio público ou apoio privado?”. Tanto pode haver governantes como mecenas que se possam sentir no direito de ditar escolhas em troca do seu apoio. E há. A partir daí, tudo depende do interlocutor deles: do seu sentido de missão e responsabilidade; da sua determinação em defendê-las e em agir em conformidade com as mesmas; da sua isenção; da sua capacidade de dizer “não”. Tudo depende do facto de haver do outro lado um líder ou não.
Visão, sentido de missão, perseverança, rigor, sentido de responsabilidade; uma atitude que inspira e motiva outros, tornando-os aliados, companheiros; uma vida dedicada a uma causa; fazer a diferença. Quando o que vemos à nossa volta são sobretudo aquelas pessoas que só sabem dizer "sim" - aquelas que estão mais que dispostas a passar por cima de questões como a missão e a responsabilidade, que facilmente culpam o sistema e o status quo para justificarem o seu único desejo, que é manterem os seus lugares e os seus pequenos ou grandes poderes - penso novamente numa senhora cuja autobiografia li em Agosto passado. Wangari Maathai foi fundadora do The Green Belt Movement no Quénia. Lutou pelo ambiente e lutou pela democracia no seu país. Sabia dizer “não”. E sabia também dizer “Darei o meu melhor”. Morreu em Setembro de 2011.
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