Monday, 18 February 2013

De Thomas P. Campbell para mim



Há algum tempo, vi uma apresentação do jovem especialista em redes sociais Jasper Visser, intitulada The future of museums is about attitude, not technology (O futuro dos museus tem a ver com atitude, não com tecnologia). Mesmo antes de a ver, o título ecoou na minha cabeça. É verdade, que impacto é que a tecnologia pode ter só por si se não sabe utilizá-la, se não se entende ou não se está interessado em explorar as possibilidades que oferece e usá-las com visão e imaginação? Isto requer atitude, realmente; ou melhor, requer a atitude ‘certa’.

Há umas duas semanas, recebi um email de Thomas P. Campbell, director do Metropolitan Museum of Art. Informava-me de um novo projecto, chamado 82nd and 5th,uma nova série de vídeos, onde um curador do Met fala de uma obra específica da colecção do museu que o inspirou ou mudou a sua vida ou a sua forma de pensar. Thomas P. Campbell informou-me que poderia inscrever-me para passar a receber todos os vídeos novos por email e sugeriu que informasse também os meus amigos.

Não é sobre os vídeos que quero falar aqui (a qualidade e interesse dos quais pode ser verificada no website do museu), mas sim, sobre os detalhes da comunicação desta nova iniciativa. Como devem imaginar, não foi o próprio Thomas P. Campbell que me mandou o email e eu recebi-o porque faço parte da mailing list do museu.  O Met poderia ter feito facilmente aquilo que a maioria dos museus faz: enviar um email a todos os inscritos na sua mailing list através do seu endereço de email geral. Em vez de optar por esta forma de comunicação impessoal, criou um endereço de email específico, onde figura como remetente o director do museu. É ele que se dirige a nós e apresenta esta nova iniciativa, convidando-nos a usá-la, a abraçá-la, a ajudar o museu a promovê-la. E este pequeno detalhe faz muita diferença. Demonstra atitude.

Indhu Rubasingham, Directora Artística do Tricycle Theatre (Foto: Alastair Muir para The Guardian)
Tinha tido um outro ‘encontro especial’ com a directora de uma instituição cultural uns meses antes, quando telefonei para o Tricycle Theatre em Londres para marcar bilhetes para uma peça. O telefone tocou e, antes da chamada ser atendida pela bilheteira, ouvi uma resposta automática. Era uma mensagem da directora artística do teatro, Indhu Rubasingham, que me agradeceu por ter entrado em contacto para comprar bilhetes e pôs à minha consideração a hipótese de pagar uma libra extra por bilhete para apoiar o teatro no seu trabalho. Era uma mensagem simples, directa, simpática à qual não fui capaz de resistir. Acabei por apoiar um teatro onde não tinha estado nunca, algo que nunca fiz por aqueles teatros que costumo frequentar. Talvez porque nunca ninguém me pediu para o fazer. Indhu Rubasingham e o Tricycle Theatre têm atitude.

Nenhum dos exemplos acima envolveu um investimento enorme. Aliás, não envolveram investimento nenhum. A falta de dinheiro ou de meios sofisticados não pode servir de desculpa para a falta de atitude. Além disso, a falta de atitude quando se tem os meios, mas não se aproveita ao máximo o seu potencial, indica ainda falta de visão.

Uma das preocupações mais comuns dos profissionais da cultura quando dou formação em diversos pontos do país em comunicação cultural é a impossibilidade de usarem a tecnologia e os meios disponíveis autonomamente a fim de promoverem os seus espaços, o seu trabalho, as suas actividades. Refiro-me especificamente a organizações tuteladas por câmaras municipais ou fundações às quais não é permitido terem os seus próprios websites (são um item num sub-sub-menu) ou de gerirem as suas próprias páginas no Facebook. A informação é gerida centralmente e não por quem tem melhor conhecimento do tema e está mais interessado que qualquer outra pessoa em promovê-lo. E por quem o faria melhor, se tivesse formação adequada.

Sejamos os clientes por um momento. Estamos interessados em saber se o Museu da Electricidade em Lisboa organiza festas de aniversário? Começamos por pesquisar no Google, como eu fiz. O primeiro link leva-vos ao website da Fundação EDP, onde o museu figura como um item no menu. Ao chegar à página do museu, parece que chegámos a um portal com notícias encaixadas. Cada caixa é um link para uma página com descrições da exposição temporária; da exposição permanente; das últimas estatísticas ou de outras notícias. O museu em si não tem um menu próprio (endereço: www.fundacaoedp.pt/museu-da-electricidade).



Desejam visitar o Museu de Cerâmica de Sacavém? Uma pesquisa no Google leva-vos para (por ordem de aparição): uma inserção no website do antigo IMC sobre o edifício do museu; o Turismo Lisboa e Vale do Tejo; a Wikipedia; Lifecooler; ijogo; TSF… Se por intuição optarmos por procurar em Câmara Municipal de Loures, encontraremos um link para uma página com uma descrição geral do museu em Câmara Municipal de Loures / Conhecer / Turismo, Cultura, Lazer / Museus (endereço:
http://www.cm-loures.pt/Ligacao.aspx?DisplayId=2#topo)



Escolhi dois exemplos de museus que gosto. Porque isto faz-me pensar no quão diferente e melhor, dadas as ferramentas disponíveis, seria a minha relação online e a distância com eles (para não falar da relação desses museus com as pessoas que não os conhecem e que poderiam estar interessadas). Como estes, há muitos outros. Como é que um museu ou outro equipamento cultural pode estabelecer uma relação com actuais e potenciais visitantes/utilizadores quando está tão bem escondido (vejamos só os endereços online)? Ou quando a informação que pode disponibilizar é tão estática (e aborrecida e incompleta)? Quando não existe um diálogo aberto, directo, constante, informal?

Um profissional da área da comunicação, como eu, entende perfeitamente a necessidade de coerência e acredito que é esta a principal preocupação das câmaras municipais e das fundações que gerem diversos espaços e projectos. Mesmo assim, a solução não é controlá-los ao ponto de os estrangular.  O público desenvolve relações com as organizações que visita, com os projectos dos quais gosta e não com as entidades que os gerem. Nenhum gabinete central de comunicação de um município irá alguma vez conversar com as pessoas no Facebook sobre o dia-a-dia da vida de um museu municipal, os objectos na sua colecção, as actividades que tem para oferecer da forma como uma pessoa que trabalha nesse museu o iria fazer. Sem dúvida, há necessidade de directivas, formação, orientação. Mas as pessoas estão ansiosas para as receber para as poderem usar da melhor forma, a fim de promover melhor o que fazem e chegar às pessoas com quem pretendem comunicar. Não é boa ideia deixar isto com quem sabe menos, quem está – inevitavelmente – menos apaixonado, quem não tem um envolvimento real – como é o caso da Wikipedia do Turismo ou do Lifecooler. Isso demonstra  falta de visão que condena à falta de atitude. E nisto não há futuro.

Sempre que penso em todos aqueles profissionais frustrados cujo único desejo é comunicar (e penso muito neles), oiço na minha cabeça a canção de Sting:

When you love somebody
Set them free…
Free… free….
Set them free…

(Quando amas alguém, deixa-o livre…)



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