Tanto quanto sei, as decisões de cobrar ou não cobrar entrada nos museus nacionais nunca se baseiam em estudos. Aqueles que defendem a entrada livre fazem-no em nome da "democratização" e da "acessibilidade" e afirmam que a perda de receita não é significativa (nunca mencionando, no entanto, valores concretos). Aqueles que defendem a entrada paga geralmente falam da necessidade de gerar alguma receita.
Embora a pesquisa prévia e a avaliação sumativa não façam
parte da nossa prática em Portugal, tal não é o caso noutros países. E mesmo
que não tenhamos os nossos dados específicos sobre estas matérias, podemos
sempre aprender com a experiência e o conhecimento partilhado dos outros.
Taking charge – Evaluating the Evidence: The impact of charging or not for admissions on museums, publicado em Agosto passado pela Association of Independent Museums (Reino
Unido), estava na minha lista "a ler" há algum tempo. Entre as principais
conclusões, há pontos que não constituem de todo uma surpresa e que devem ser
sempre levados em consideração por aqueles que decidem sobre o valor das
entradas ou sobre a entrada gratuita. Irei referir duas que me parece que se
relacionam directamente com os argumentos habitualmente utilizados em Portugal:
1. Não há uma ligação directa entre a diversidade dos públicos
e se um museu cobra ou não entrada, sendo o padrão em termos de perfis sociais
muito semelhante.
2. Não há uma relação consistente entre os gastos
secundários (por exemplo, na loja) e se um museu cobra entrada.
Como disse, não há nenhuma surpresa aqui. Nem no facto de
que os museus de entrada livre apresentarem uma taxa maior de visitas repetidas
(p.17). Esta é a experiência de todos nós, em qualquer país, que trabalhamos mais
próximo dos visitantes. As relações das pessoas com os museus não são assim tão
diferentes de um lugar para outro (como mostram vários estudos).
Ao mesmo tempo, houve algumas surpresas que gostaria de
mencionar:
1. Dentro da amostra da AIM, as pessoas com rendimentos mais
baixos (classes sociais C2 e DE do sistema britânico) representam 25% dos
visitantes em museus com entrada paga e 20% dos visitantes em museus com
entrada livre. É igualmente referido no relatório que, a nível nacional, estes
grupos representam 47% dos visitantes dos museus. Representam ainda 22% da
população do Reino Unido (página 16).
2. Os gastos secundários são ligeiramente mais elevados nos
museus que cobram entrada (p.17).
3. As pessoas tendem a ficar mais tempo em museus que
cobram entrada (p.17).
Vale a pena ler o relatório inteiro (37 páginas), pois
também inclui as lições aprendidas de vinte museus que: a) tinha entrada livre
e passaram a cobrar; ou b) tinham entrada paga e passaram para entrada livre; ou
c) já estavam a cobrar e aumentaram o valor das entradas. Na publicação Success Guide: Successfully Setting Admission Policy and Pricing, também da AIM, são dados conselhos, com base nos resultados do relatório, aos
museus que desejam seguir qualquer uma destas direcções.
Mais duas coisas que devemos destacar e que ficam claras
neste relatório:
1. "Cobrar ou não cobrar entrada e, em caso afirmativo,
a estratégia de preçário a implementar são decisões-chave, que exigem uma
consideração cuidadosa."
2. "Ao fazer qualquer alteração, é especialmente
importante comunicar claramente às partes interessadas e à comunidade local as
razões das mesmas e garantir que a equipa é positiva e confiante ao explicá-las
aos visitantes."
Algumas lições importantes aqui, tanto para os nossos
governos (actual, passados e futuros), bem como para os profissionais dos museus.
As decisões devem ser informadas e não baseadas em desejos ilusórios,
"demanda popular" ou declarações populistas. Não é suficiente (e não
estamos a ser honestos com nós próprios e com os outros) continuarmos a agitar
as bandeiras de "democratização" e do "acesso" ou de
"criação de receita". Todos nós já sabemos que a abolição ou reinstauração
das entradas gratuitas não resolve nenhuma dessas questões. Precisamos ser ver
estas questões com maior seriedade e precisamos de trabalhar mais, de uma forma
diferente, se queremos mesmo que nossa cultura se torne mais democrática e as que
pessoas que têm acesso a ela se tornem mais diversas.
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