Monday, 16 July 2012

Blogger convidado: "Bayimba: um catalisador num sector cultural que enfrenta grandes desafios", por Faisal Kiwewa (Uganda)

Faisal Kiwewa é um homem calmo, mas cheio de energia e determinação. Tem estado a trabalhar arduamente para colocar as artes e a cultura no mapa do seu país natal, o Uganda, mas tem expandido o seu impacto em toda a África de Leste e o resto do continente africano. Está constantemente a pensar e a planear o próximo passo para levar a causa mais longe. Neste post conta-nos a história, em forma de conto de fadas, da sua Bayimba Cultural Foundation. Mas a equipa de Bayimba trabalha para que o conto se torne e permaneça uma realidade. mv

Bayimba International Festival of the Arts (Foto: Bayimba Cultural Foundation)

Era uma vez …

… um rapaz (eu) que se interessou por estudar e observar o estado das artes e da cultura no seu país, o Uganda. Não foi difícil notar que havia falta de boas e relevantes oportunidades de formação(informal) e de instituições; falta de criatividade e das capacidades artísticas e profissionais necessárias entre artistas, organizações culturais e outras partes interessadas; falta de produção adequada e de instalações para a realização de espectáculos; e falta de plataformas de exposição e interacção. Ao cavar mais a fundo, apercebi-me que as principais causas eram três: primeiro, a falta de reconhecimento e apreciação do papel das artes e da cultura em moldar a sociedade; segundo, a falta de investimento nas artes e na cultura; e, terceiro, a falta de interacção e colaboração entre as partes que compõem o sector das artes e da cultura.

Como é o caso em muitos países em desenvolvimento, a cultura não é uma prioridade para o governo. É vista como uma questão subsidiária ao combate à pobreza. O apoio financeiro ao sector é, por isso, mínimo e as políticas e estratégias culturais fazem uma abordagem algo estática relativamente à cultura em vez de olharem para ela como uma força dinâmica, inovadora e criativa na construção da sociedade. O apoio do sector privado tem sido também limitado e necessariamente selectivo. Os investidores privados têm focado sub-sectores onde o risco pode ser gerido e o lucro pode ser maximizado. Ao mesmo tempo, outras partes interessadas no sector não se têm organizado no sentido de mudarem o status quo, enquanto a maioria dos projectos e das actividades é implementada em isolamento e sem uma visão a longo prazo, sem falar da visão para o sector cultural e das artes no seu todo.

Cheguei à conclusão que o potencial das artes e da cultura como contribuintes eficazes  ao desenvolvimento social e económico estava a ser altamente negligenciado e subutilizado. Era altura de provocar alguma mudança! Foi, assim, fundada a Bayimba Cultural Foundation, com o objectivo de se tornar num catalisador para essa mudança!

… Bayimba começou a sua viagem …

Confrontado com estes múltiplos desafios e a enorme tabula rasa – a todos os níveis, estava tudo por fazer -, Bayimba, com a experiência que tinha, começou a desenvolver o seu primeiro programa. Apesar de vários obstáculos, o primeiro Bayimba International Festival of the Arts foi organizado em combinação com três workshops de formação para artistas, com o objectivo de reforçar as capacidades e estimular colaborações artísticas. Isto aconteceu em 2008 e ali foram semeadas as primeiras sementes. Nos anos que se seguiram, Bayimba cresceu e conseguiu desenvolver um programa abrangente e ambicioso que procura dar resposta a muitos dos desafios identificados.

Para reforçar o perfil e a posição das artes e do sector cultural como um todo, Bayimba decidiu envolver-se em actividades de lobbying, para além das actividades de formação e da plataforma que criou para apresentar o talento artístico. Em 2009, Bayimba começou com os primeiros debates sobre o papel das artes e da cultura na sociedade e despertou o sector. Um ano depois, teve lugar no Uganda a primeira Conferência sobre Artes e Cultura, como uma plataforma de discussão e acção conjunta. Bayimba tem sido instrumental em juntar as partes interessadas e organizar o sector das artes e da cultura, tudo isto com o objectivo de nos juntarmos para trazermos a mudança.

Para fornecer mais plataformas de exposição do talento artístico, para assegurar que um púbico mais amplo possa usufruir de uma variedade de expressões culturais e para ajudar a desenvolver o sector das artes e da cultura em todo o país, em 2010 acrescentou-se ao programa festivais de um dia, juntamente com actividades de formação para ajudar a desenvolver o talento local e um programa de intercâmbio de artistas entre as regiões. Os festivais Bayimba realizam-se hoje em dia em cinco regiões, fornecendo uma plataforma aos artistas locais e oportunidades de digressão a artistas já estabelecidos, o que culmina no Bayimba International Festival of the Arts, que no próximo mês de Setembro irá celebrar a sua 5ª edição.

Ao mesmo tempo, Bayimba tem continuado a investir no desenvolvimento de talento artístico. Foram realizados workshops de formação para introduzir novas disciplinas artísticas  no Uganda, como a fotografia, o teatro de rua, as instalações ou espectáculos de poesia. Alguns dos seus programas, como a formação em música, estão a tornar-se num programa de formação mais estruturado e duradouro. Paralelamente, Bayimba apercebeu-se da necessidade de formar outros elementos do sector que não artistas e em 2011 começou a oferecer cursos para gestores culturais e jornalistas da cultura, uma vez que eles são igualmente importantes para o sector crescer e prosperar.

Graças à sua crescente relevância e reputação no Uganda, Bayimba tornou-se também num catalisador importante na região da África de Leste e no continente africano. É um membro respeitado de várias redes regionais e continentais. Mais recentemente, em Maio 2011, Bayimba tomou ainda a iniciativa de lançar DOADOA, como uma plataforma profissional de trabalho em rede e de aprendizagem conjunta, que junta as partes interessadas – pessoas, organizações, negócios, conhecimento e tecnologia, com o objectivo de criar demanda e de desenvolver um mercado para as artes performativas, desbloqueando o potencial das indústrias criativas de África de Leste.

Programa de formação em Gestão Cultural que acolhe gestores culturais de todo o continente africano  (Foto: Bayimba Cultural Foundation)

Para ter um impacto duradouro no sector, Bayimba tem ainda procurado desenvolver e estabelecer sistemas e estruturas duradouras. A institucionalização do já mencionado programa de formação em música é apenas um exemplo. Para aumentar o acesso ao financiamento para artistas e aumentar o investimento no sector, Bayimba está ainda a criar uma plataforma inovadora de crowdfunding para projectos artísticos na África de Leste e um pequeno esquema de empréstimos para artistas no Uganda. Bayimba está ainda a planear o estabelecimento de uma infraestrutura multi-funcional para as artes no Uganda que seria um ponto de encontro significativo para as artes no Uganda, na África de Leste e no continente e que viria a coroar tudo o que foi feito até agora.

…. e gradualmente mudou a paisagem….

Atrevo-me a dizer que as intervenções de Bayimba nos últimos 5 anos têm resultado num desenvolvimento gradual do sector. Através da combinação excepcional de programas e actividades, Bayimba tem conseguido dar resposta a vários desafios e tem encorajado outros a fazerem o mesmo. Conseguiu-o sendo um exemplo, com uma equipa jovem, activa e ambiciosa que não evitou tomar riscos para iniciar projectos e programas igualmente ambiciosos; trabalhando com parcerias e desenvolvendo uma ampla rede de parceiros; assegurando o envolvimento de todos; e tornando Bayimba numa marca de propriedade local. Um grupo interessante de empreendedores criativos nas artes – mais especificamente em música, dança, cinema e teatro – tem entretanto surgido, trabalhando arduamente para desenvolver e promover as artes. E Bayimba tem orgulho em ter contribuído para esta nova era de empreendedorismo criativo no Uganda. Continuaremos a servir os nossos artistas, as artes e os nossos públicos para garantir o espaço da criatividade. Assim, não servimos apenas o sector das artes e da cultura, mas a comunidade, a sociedade e o mundo…

...para que as artes e a cultura no Uganda possam viver felizes para sempre.


Faisal Kiwewa
é fundador e director de Bayimba Cultural Foundation e presidente da comissão oganizadora da
Uganda Annual Conference on Arts and Culture (UACAC). 

3 comments:

NUno Beja said...

Que bom!
Ao pé disto só consigo exprimir-me dizendo que sou nada.
Nuno

Maria Vlachou said...

Faz pensar, Nuno, não é verdade? No que é um país "em desenvolvimento" e um país "desenvolvido".

Nuno Beja said...

Não faz só pensar. Faz, a mim, sentir de uma forma profunda a minha pequenez e frustração; a cada vez maior lucidez de me sentir a viver numa ficção, num país e num continente onde o que importa é uma aparência oca, vazia, feita de papel de cenário. Felizmente que ainda há no mundo pessoas como este senhor, que nos dão o Mundo!
Obrigado Maria