Medellín é a segunda
maior cidade da Colómbia. Para alguns, continua a ser sinónimo de cartel de
drogas. Para outros, é a cidade-exemplo, que através de políticas culturais e
sociais, conseguiu baixar o índice de criminalidade e mostrar aos seus habitantes
novos caminhos para o seu desenvolvimento pessoal e também comunitário.
Recentemente, li uma entrevista de Jorge Barco, Director do Departamento de
Educação e Cultura do Museo de Arte Moderno de Medellín. Fiquei muito contente
quando aceitou escrever para o Musing on Culture e partilhar a sua reflexão
sobre o papel que as instituições culturais, e em particular os museus, podem
ter no desenvolvimento de uma nova relação com a criação, o património e a vida
em comunidade. mv
Colectivo Imoar (Foto: Andres Sampedro) |
“La estabilidad que estamos construyendo ahora es afectivopráctico y
no material, un inmenso laboratorio de la imaginación, aprovechando de toda
grieta que se puede encontrar para dar cuerpo a lo que sentimos dentro” Las
Grietas
O convite de Maria
Vlachou para escever no seu blog, assim como do ICOM para participar no
próximo encontro de Museus no Rio de Janeiro, é para mim uma oportunidade para
começar a organizar algumas ideias que têm motivado grande parte da minha
reflexão como gestor, educador e activista nos museus da região de Antioquia
(Colómbia) nos últimos sete anos.
Hoje faz sentido pensar
o papel que as instituições culturais – e em particular os museus – podem ter
como cenários propícios para reconfigurar uma nova relação com a criação, o
património e a vida em comunidade. Os museus – num papel que se aproxima
decididamente ao dos 'centros culturais', no caso especial de Medellín– têm um
papel importante na promoção de programas educativos, culturais, expositivos,
que ultrapassam os muros da instituição para chegar a favelas e populações
distantes. E do seu interior, reinventam continuadamente as formas de se
relacionarem com os seus públicos a partir da educação expandida (Edupunk), os
novos enfoques de gestão cultural e o trabalho em rede.
Do seu lado, o Museo de Arte Moderno de Medellín (MAMM) – reinstalado, desde há quatro anos, numa antiga
oficina de fundição de metais – tem sido consolidado como um lugar estratégico
no país, pela sua programação expositiva, mas sobretudo educativa e
cultural. É um lugar propício para formular as seguintes perguntas:
Quais são as linhas
orientadoras deste trabalho? Quais são os elementos para começar a criar uma
nova institucionalidade e definição para o que historicamente temos chamado
Museu?
A procura de respostas
para estas perguntas leva-me a propor a construção de confiança como um
dos princípios orientadores: um exercício fino, perseverante e delicado de
tecido e relacionamento comunitário que se desenvolve a par com o trabalho
colaborativo e em rede, o qual se pode ver desenhado na
cartografia de uma cena cultural cada vez mais expandida. O projecto LABSURLAB é apenas um exemplo de
como uma iniciativa que surgiu no MAMM se converteu numa rede mundial de
activistas que trabalham em torno das noções de arte, ciência, tecnologia e
comunidades com um enfoque biopolítico.
LABSURLAB (Foto: Checho) |
Através da construção de
mapas dos projectos que se desenvolvem no território, estamos a criar
relações de sentido entre os actores da cultura na cidade, na região, no
continente e no mundo, procurando vincular cada vez mais grupos sociais,
identitários, profissionais, assim como instituições, universidades,
empreendimentos, projectos e comunidades, para a mobilização de ideais. A cartografia
dos projectos culturais é um instrumento fundamental nos processos de
criação cultural contemporânea.
Uma outra linha de acção
é dirigida à exploração de novas definições para o que normalmente
chamamos gestão cultural, procurando conferir-lhe todo o poder criativo que
alberga, a partir de modelos abertos que permitem reinventar as relações de
criação, circulação e apropriação; reconhecendo que – assim como acontece com
as práticas artísticas– nos projectos culturais boa parte do trabalho radica na
mesma gestão. Necessariamente, esta situação faz-nos também repensar os papéis
e as relações – entre quem cria, quem recebe, quem educa, quem exibe e quem
gere –, ao mesmo tempo que ocorre uma transformação dos campos disciplinares.
Há mais um elemento que
vincula o trabalho como activistas culturais às tecnologias, para além dos
aspectos meramente técnicos: as ferramentas que nos proporcionam este momento
albergam novos formatos para a criação colaborativa, a educação, a gestão de
projectos, o activismo, a reorganização do trabalho e a produção dos bens
comuns. Os processos culturais e artísticos ligados à cultura digital são hoje
territórios de limite, fronteira e de intercâmbio, e o museu é um lugar
estratégico a partir do qual se podem activar estes processos.
Uma linha adicional tem
sido orientada para gerar diálogos criativos a partir do museu como instituição
com os movimentos e iniciativas independentes, que podem ir desde residências
artísticas, circuitos de música e bares a espaços não convencionais de educação
não formal, com o objectivo de realizar projectos desde a cooperação e o
mutualismo. O propósito tem sido gerar ambientes de diálogo, de co-criação e de
oportunidades para ambas as esferas (instituições e movimentos).
Equipa Educação e Cultura do MAMM (Foto: Clara Botero) |
A partir desta perspectiva,
a função do museu é global e, ao mesmo tempo, local, proporcionando um lugar de
encontro entre as múltiplas camadas e ofícios da criação contemporânea e
potenciando o desenvolvimento das subjectividades. Um lugar de encontro,
trabalho, produção e investigação, para além de exposição e divulgação, onde
todos os elementos se misturam, se alimentam e desde o qual poderia surgir uma
nova institucionalidade e espaço que proponho que se chame provisoriamente
‘Useo’.
Jorge Bejarano Barco trabalha no sector dos museus da
região de Antioquia (Colómbia) desde 2007. Actualmente, é Director do
Departamento de Educação e Cultura do Museo de Arte Moderno de Medellín. No passado,
trabalhou no Museo de Antioquia, na Rede de Museus e nos Conselhos Municipal e
Departamental de Cultura. Participou na criação de projectos e redes
independentes para a confluência entre arte, ciência, tecnologias e comunidades
(ver aqui e aqui e aqui).
Foi conferencista convidado na Cátedra Medellín-Barcelona, no Encuentro
Internacional los Museos en la Educación organizado pelo Museo Thyssen
Bornemisza em Madrid, no Master en Gestión Cultural y Economía de la Cultura de
la Universidad de Valladolid, na Facultad de Diseño y Arquitectura da
Universidad de Buenos Aires, no Festival de Cultura Digital de Rio de Janeiro,
no Festival Internacional de la Imagen (Manizales) e nas Universidades de
Antioquia e Jorge Tadeo Lozano (Bogotá). Actualmente, os seus interesses
concentram-se na investigação sobre produção cultural, filosofia dos media,
educação expandida, propondo diálogos entre instituições e movimentos, desde o
trabalho colaborativo em rede ou a redefinição de uma série de acções que
juntam a arte e o activismo cultural.
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