Monday 28 October 2013

É favor definir "perigo"

Musée d' Orsay (Imagem retirada de Louvre pour Tous)
O debate da semana passada sobre fotografia nos museus, organizado pela Acesso Cultura e pelo ICOM Portugal, não correspondeu às minhas expectativas. E considero que, em parte, a culpa seja minha. Entendi o meu papel de moderadora como, sobretudo, o de reguladora da conversa. Tendo partilhado publicamente as minhas posições sobre este assunto – neste blog, no blog Mouseion, no jornal Público e também no portal Louvre pour Tous - considerei que este deveria ser o momento para dar a oportunidade aos oradores convidados e aos colegas que assistiam para trocar opiniões, esclarecer ideias, partilhar a sua visão para os museus no século XXI. Porque o contexto actual em que se discute a fotografia nos museus é um contexto para discutir a relação dos museus com as pessoas no século XXI.

A campanha "It's Time we Met" do Metropolitan Museum usou fotos tiradas pelos visitantes no museu.
O debate tomou um rumo diferente, concentrando-se principalmente em questões de direitos de autor e nos interesses e pressões comerciais por trás da Directiva da EU Relativa à Reutilização de Informações do Sector Público. Pouco foi perguntado ou dito sobre os visitantes – fotógrafos e a forma como a actual legislação portuguesa limita (ou não) a sua contribuição na promoção dos museus. Houve algumas perguntas concretas sobre este assunto – como, por exemplo, “O que é que se entende no despacho (ler aqui) por “divulgação” e os visitantes que tiram fotografias e partilham-nas nas redes sociais são criminosos?”; ou “A actual legislação não é incompatível com o facto de dois museus e dois palácios nacionais estarem neste momento no Google Art Project?” -, mas ficaram sem resposta. A falta de resposta directa pode ser ela mesma um indicador de incapacidade ou falta de vontade em abordar estas questões fundamentais, mas, como moderadora, deveria ter insistido para que houvesse uma resposta clara -  afinal, era esse o propósito do debate - ,no entanto, achei que ia envolver-me num diálogo pessoal com os intervenientes e, por isso, não o fiz (mea culpa).

Imagens amplamente disponíveis na Internet. Autores desconhecidos ou... difíceis de encontrar.
Mais para o fim do debate, houve mais uma pergunta muito relevante: a Direcção-Geral do Património Cultural tem realmente condições para controlar o uso das imagens tiradas pelos visitantes e é esse o propósito do despacho? Qual é hoje a sociedade que é suposto os museus servirem? Nesse momento, fomos informados que é muito difícil controlar e que o despacho tem sobretudo uma função dissuasiva.

Cartazes criados pelo Musée Saint-Raymond, Musée des Antiques de Toulouse.
Assim, e mais uma vez, os visitantes, as pessoas, não estiveram no centro da discussão. Os objectos é que sim. Um outro momento interessante no debate foi uma pergunta relativamente à manipulação de imagens de obras de arte – como a imagem usada para a promoção do debate. As opiniões foram diversas: desde o não haver mal nenhum neste uso criativo de uma obra de arte, uma vez que as obras têm uma vida própria; ao identificar um perigo na disponibilização de imagens de qualidade – como está a fazer neste momento o Rijksmuseum e outros museus – e realçar a responsabilidade dos profissionais dos museus em salvaguardar e proteger.



Gosto de museus que nos fazem sentir bem-vindos, livres, inspirados. Aprecio os museus que têm bom sentido de humor e não têm medo de o mostrar. Admiro os museus que não permanecem afastados do que se passa à sua volta, na sociedade. Respeito os museus que procuram criar ligações com o mundo exterior, debater e não impor. Não vejo nenhum perigo nisto, nem alguma falta de respeito; vejo simplesmente relevância e sentido de missão.

Mas, acima de tudo, sinto-me tão contente quando vejo pessoas a divertirem-se nos museus e a partilharem o seu prazer (mais ou menos criativamente). Haverá melhor sinal de missão cumprida?

Publicidade da KLM. O Rijksmuseum foi o primeiro a partilhá-la no Facebook.

2 comments:

Renata Teixeira said...

Que ótimo ver pessoas que pelo menos questionam essas regras. Acabei de voltar do Kelvingrove Museum e fiz vários vídeos com meus amigos. Divertido e me ajudou a me sentir mais em casa.

Acredito que esse debate toca em um assunto mais fundamental: muitos museus são criados para pessoas-que-gostam de museus e não para o público em geral. Existe um medo de se perder o controle sobre os museus.

ótimo post!

Maria Vlachou said...

Obrigada, Renata. Há cada vez mais pessoas a questionar as regras e a querer ver os museus inseridos na sociedade tal como ela é hoje. A questão dos "guardiões" também está a ser contestada e os museus mais atentos e interessados em criar relações com pessoas com vários perfis aprendem a partilhar a responsabilidade e a criar parcerias. Há tantos bons exemplos, seria uma pena não aproveitarmos a inspiração que nos dão.

Kelvingrove... Que bom!