Todas as imagens retiradas do Facebook da Accion Poetica. |
O Eurobarómetro realizou um estudo sobre Acesso e
Participação Cultural (relatório completo e sumário). O
último estudo tinha sido realizado em 2007, antes da crise atingir a Europa,
por isso, este estudo mais recente pode ajudar-nos a compreender os efeitos da
crise nos hábitos e práticas culturais das pessoas.
Falando em termos
muito-muito gerais, e no que diz respeito a Portugal, os resultados mostram que
a participação dos portugueses está abaixo da média europeia em todas as
actividades consideradas no estudo, tanto em termos de visitação / assistência
como em termos de envolvimento em actividades culturais. As maiores diferenças
registam-se na leitura de livros (UE: 68%; PT: 40%), visitas a monumentos e
sítios históricos (UE: 52%; PT: 27%) e idas ao cinema (UE: 52%; PT: 29%).
A principal barreira ao acesso referida
pelos europeus foi a falta de interesse e a falta de tempo. Para os
portugueses, a falta de interesse foi a principal razão de não participação,
registando uma percentagem mais alta que a da média europeia em todas as
actividades consideradas no estudo. As
actividades que menos interessam aos portugueses em relação aos restantes
europeus são a leitura de livros (PT: 49%; UE: 25%), a visita a museus e
galerias (PT: 51%; UE: 35%) e a visita a monumentos e sítios históricos (PT:
44%; EU: 28%).
A razão porque queria
escrever hoje sobre o estudo do Eurobarómetro não é analisar gráficos e
resultados. É questionar como é que vamos interpretá-los e o que vamos fazer a
partir daqui, sendo profissionais da cultura. Os resultados foram sobretudo
recebidos com pessimismo ou algum fatalismo; com afirmações como “Somos um país
de incultos” ou “Os portugueses não querem saber, não se interessam, acham que
não vale a pena” – com uma certa acusação implícita, pensei, do género “Vale a
pena fazer qualquer coisa que seja para esses ignorantes e ingratos?”.
Confesso que fiquei
cheia de perguntas, algumas permanentes, frequentemente discutidas neste blog,
independentemente da existência de estudos formais. Tentando agrupá-las, penso
que se resumem em duas grandes questões:
1ª Questão: Quão larga terá sido a
definição de “participação cultural” no estudo? Terão sido apenas considerados
a visitação / assistência e o envolvimento com o que podemos chamar
“instituições culturais formais”?
Depois de ter acesso ao relatório completo e ao
questionário, fiquei contente em ver que a definição não tinha sido estreita
(considerou a participação através da Internet e actividades como a dança ou a
fotografia ou os trabalhos manuais). No entanto, não tenho a certeza se, da
forma como foi feita a pergunta, ajudou os inquiridos a considerar as suas
actividades numa perspectiva mais ampla (quantas pessoas, por exemplo, terão
pensado que o facto de terem dançado num casamento ou num club constitui
uma forma de participação cultural?). Os estudos “Public Participation in the
Arts” do National Endowment for the Arts, realizados de quatro em quatro anos
nos EUA, disponibilizam-nos este género de detalhes relativamente a “o que
exactamente; onde exactamente; como exactamente” – todos os relatórios estão
disponíveis online, mas vejam,
por exemplo, o último relatório completo de 2008 (alguns
destaques aqui),
ou os
destaques do estudo de 2012,
sendo
que o relatório completo será disponibilizado em 2014.
No que diz concretamente
respeito à participação na Internet, deveríamos destacar o facto dos
portugueses usarem este meio numa percentagem acima da média europeia para
jogar jogos no computador (+11%), para colocar os seus próprios conteúdos
culturais online (+3%), para ouvir música e rádio / fazer o download de
música / ler e consultar blogs culturais (+1%).
2ª Questão: Estarão as pessoas pouco
interessadas na cultura em geral ou no género de cultura que as “instituições
culturais formais” lhes oferecem? Estaremos a programar tomando em consideração
as pessoas - os seus interesses, preocupações, conhecimentos prévios,
perguntas, necessidades, barreiras práticas e psicológicas que as possam manter
afastadas? Iremos alguma vez questionar a forma como fazemos as coisas e a
sinceridade da nossas afirmação “Somos para as pessoas”?
Alguns factos pessoais: por vezes, consulto a agenda de
exposições em museus e, a julgar pelos títulos, nada soa suficientemente
emocionante ou interessante para visitar; um grande número de concertos e
intérpretes, de todos os géneros musicais, é promovido como “o melhor do
mundo”, mas isto simplesmente não chega para tomar a decisão de comprar um
bilhete, uma vez que o mundo está tão cheio de “os melhores” artistas; no que
diz respeito a artistas menos conhecidos, a grande maioria das instituições que
os apresentam comportam-se como se devêssemos todos conhecê-los já, não
acrescentando absolutamente nada ao título e/ou nome.
Portanto, isto pode ser um problema meu como consumidora.
Mas pode também ser um problema das instituições culturais que desejam
comunicar comigo (pelo menos, dizem que o desejam): o problema de escolher
títulos interessantes e inspiradores; o problema de escolher temas (quero
dizer, histórias) que possam atrair um público mais diversificado, menos
especializado; o problema de tentar atrair mais pessoas usando a informação
básica compreendida apenas por poucos; mas também a necessidade (diria, a
obrigação) de perceber o que é que as pessoas optam por fazer nos seus tempos
livres e porquê. Porque, quando eu, como pessoa / consumidora, não vou aos
vossos concertos / exposições / peças de teatro / festivais, não é
“simplesmente” porque sou inculta, desinteressada, ignorante ou ingrata (e,
francamente, não gosto de vos ouvir dizer isso sobre mim…). Pode ser porque
outros tenham sido mais sinceros no seu desejo em comunicar comigo e tenham
feito um trabalho melhor em chamar a minha atenção e ganhar o meu interesse e
tempo precioso.
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Em 1996, os mexicanos
não liam, em média, mais que um livro por ano. O escritor Armando Alanis
Pulido, preocupado com o declínio da literatura e da poesia, e ainda com o
preconceito de que a poesia era opaca, difícil de ler e de entender, virou-se para
as paredes das cidades, numa tentativa de tornar a poesia parte do dia-a-dia
das pessoas. Iniciou um movimento chamado Accion Poetica. Desde aquela altura,
a iniciativa espalhou-se em mais 20 países da América Latina e até atravessou o
Oceano Atlântico. No outro dia, o jornal Le Monde apresentava este título: As paredes da América Latina falam de amor. A assinatura uma, única: Accion
Poetica.
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